Um homem de traseiro nos lábios pra mim é um homem sábio. Tinha um mundo logo ali. Mais adiante nossa casa. Não é raro perceber que às vezes pulamos a janela errada e que não faz mal dizer: errei. Não é um crime não saber nadar, se jogue na água. Permita-se molhar e bagunçar os cabelos. Que tal aquela bermuda mais curta? Que tal minhas pernas? Coloque aquela música e se der guarde as botas, eles ficam péssimas jogadas aí. Depois, tranque a porta. Beije-me a testa e as costas. Durma, foi só outro dia. Amanhã, pela manhã, fique a vontade. Passe um café e, se quiser, peça-me ajuda para fazer sua barba. Para minha alegria, saia cantando que encontrou o amor. E se quiser faremos tudo outra vez em um mesmo segredo. Fica, daqui você o morro.
Talvez a demora viesse da poesia. Sempre escrevi, mas como um bom poeta, a prática era muito difícil. Sempre amei roupas de homem. Sapatos de homem. Olhos e olhares de homem. Homens eram homens. Fui ensinado a ser parça. Carrasco. Bravo. Enérgico e pilantra. Foi no vai e vem dos quadris em quadras que vi os mais belos homens também. E vejo. Homens não amavam homens. Homens grandes, nem seus filhos fitavam, embora fritassem tudo que combinasse com o que bebiam.
São tantas coisas, caras, manos, acordos e rolos. Rolas que amavam mais seus sapatos caros ou seu tênis Nike. Manos que se expunham em rimas. Boys que gostavam mais de seus suplementos e bixas que preferiam suas sapatilhas. Todos falando de amor, entende? Todos esses se desesperavam
por estarem sozinhos na badalada sexta. Mas, se arrumavam e se arruinavam ao sábado e eu sempre sendo melhor aos domingos. Parecia até cocaína ou outra sina qualquer.
Ninguém me ensinou a solidão. Ninguém me ensinou o abandono. Ninguém me ensinou a safadeza. Ninguém me ensinou a piranhagem. A barba aprendi por conta própria e junto dos pêlos escorria o vermelho na varanda. Aos poucos fui me dando conta de que todo homem tinha pau grande. Todo homem comia muito. Todo homem não pedia perdão. E todos queriam mais. Coisa de homem que nunca me contaram. Aprendi com a vizinha em cima de sua pia e, isso, já era coisa minha, já é?
Acho que homens como eu não sabem de que lado estão. Se estão na borda ou se transborda. Se está na linha ou na mira. Se cabe farda ou periferia. Coisa de quem? Quem saberia? Homem que é homem não tem indecisão. É coisa feita, expresso a vaco que não cabe no saco. Aquele que cospe e que pega no copo direito.
***II***
Agora eu estou sob suas cobertas e entre seus lençóis. Há um barraco entre nossas ruas. Pode até parecer insegurança, mas é só suor em plena viela torta. Seu corpo estirado ao meu lado, já acordado, aponta que, dessa vez, algo mudou. Tudo foi muito diferente. Eu quase o bebi, completamente. Meus olhos deflagram um ciclo percorrido, ainda não esvaziado, embora o saco já estivesse quase satisfeito. Não tive azia ou medo. Meu estômago não tem nada a declarar e, mais abaixo, tudo permanece no mesmo lugar. Butler estava errada, a língua também é parte intima de nós. Uma dessas coisas que não se discute. Se possível, nem se menciona. Homens, quase que por acaso, mal nos olhamos. Eu forçava um papo e ele ia abrindo o zíper. Antes de tudo, ele dormia e, era meu pé, quem o despertava.
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TRAFICANTE SAFADO (Completo GLBTQ+)
Short Story[conto presente para os leitores] "Talvez a demora viesse da poesia. Sempre escrevi, mas como um bom poeta, a prática era muito difícil. Sempre amei roupas de homem. Sapatos de homem. Olhos e olhares de homem. Homens eram homens. Fui ensinado a ser...