Montanha Nébula, noreste de Tenebris.
— Estou tendo alucinações. — O homem falou para a escuridão que o rodeava. Tinha decidido se encontrar com o Contador na semana anterior. Um feixe de luz caía sobre ele, o deixando confortável. Mesmo que vivesse nas trevas desde que nascera achava graciosa a luz do sol.
— O que tanto o incomoda, Majestade? — A voz singela do Contador emergiu das trevas e parecia que saia de todos os cantos da caverna. Kalil esperava que toda a subida pela montanha valesse a pena. Levara uma semana inteira até encontrar onde o Contador se localizava de verdade.
— Quero uma explicação. Há onze anos tenho visto essas cenas. Passam por meus olhos como se eu mesmo as vivesse. Sempre durante a noite. Uma vez por mês. — Às vezes via um homem ruivo e barbudo entregando um buquê de rosas para a mulher ou via a mesma treinar luta com espadas com um homem de cabelos castanhos.
Às vezes presenciava ela andar por sua aldeia e pelo o que parecia, morava na corte Primo Vere, por causa das flores que se erguiam como ervas daninhas pelos lados do caminho de terra, a verde grama onde grandes árvores projetavam aconchegantes sombras, e pássaros que voavam rapidamente entre os enormes galhos. Por algum motivo, sempre vestia armadura, dourada ou prateada, de cobre ou de ferro, que a cobria até as mãos. Não a entendia, já que tinha um corpo fabuloso. Era uma excelente guerreira e servia o rei Julian Virion, de Primo Vere, como conselheira. Kalil não conseguia escutar nada pelas visões, mas sempre se sentia conectado com a mulher. Sentia suas emoções durante o dia seguinte da noite em que recebera a visão, o que fazia Kalil se confundir com os próprios.
Já a vira se olhando no espelho, e a achara linda. Presentia que isso era errôneo e decidiu que iria acabar de vez com as visões, mesmo que não o encomodassem. Até achava divertido assistir de camarote uma vida alheia, que não tinha nada de parecido com a sua, e a mulher não tinha o conhecimento de que alguém a assistia uma vez por mês. Ela não cometia nada que Raoni, conselheiro de Kalil, considerasse politicamente incorreto. Kalil já cometera tanto para um rei, Raoni sempre fazia algo para desfazer o que Kalil aprontara.
Um velho vestido com largas roupas pretas e com a cabeça encapuzada, saiu das sombras de encontro com o rei. As rugas e a pele ressecada do queixo ainda era visíveis e os dentes pretos cresciam para fora da boca. O Contador tinha um cheiro insurpotável.
— Kalil Rygner, um dias as visões teram seu fim, junto com o último suspiro daquela que primeiro as vê. Não se preocupe, será rápido, muito antes do que se espera.
— Qual o seu nome?
— Sabe onde encontrá-la, por que não a pergunta vossa majestade pessoalmente?
— Do que vai morrer, Contador? — Perguntou o rei, por algum motivo, se sentia meio deslocado com o fato de que ela morrerá logo.
— Guerra, uma das mais velhas doenças.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Laços
General FictionHyacinthum Imperium. Ano de 1352 pelo calendário dos "anchis", povo imortal. O Imperium é dividido por quatro províncias, bem definidas e únicas: Veranum, Primo Vere, Autumno e Hibernu. Todos estão ligados por acaso ou por diversão do deuses. As pr...