CAPÍTULO I - CIGARROS

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Ele estava encostado em uma árvore. Suas pernas formando um quatro. Olhava para um pato no lago. Fumava um cigarro.

Na verdade ele nem tinha o hábito de fumar, só estava atrás de novos vícios. Tinha que admitir que o gosto que o cigarro deixava na boca era horrível, mas como esse era o gosto que a sua vida tinha, isso não fazia tanta diferença assim.

Ouviu alguém caminhando ao longe. É importante ressaltar que só era possível notar qualquer aproximação porque aquele parque em que ele se encontrava era completamente vazio. Ninguém nunca ia lá. Nem ao menos ele sabia o que estava fazendo ali. Era só um parque sujo, escuro, com várias árvores velhas e um laguinho insignificante com alguns patos.

Não olhou para o lado, até sentir a aproximação da pessoa. Soprou a fumaça do cigarro para o alto e virou a cabeça.

Era uma garota. Tinha cabelos castanhos e lisos, olhos castanhos claros com um misto de verde e uma boca muito bem desenhada. Foi só nisso em que ele reparou, antes de virar a cabeça para o lado novamente. Curiosamente a garota não passou direto por ele, ficou ali parada ao seu lado. Ele apenas começou a ignorar a presença dela, como fazia com todo mundo que se aproximava dele.

— Olá – ele ouviu uma doce voz cantarolar. Mais uma vez soprou a fumaça do cigarro para cima, antes de olhar para o lado e confirmando assim, para o seu espanto, que era a menina que tinha falado. Ficou mais espantado ainda quando olhou para os lados e percebeu que não tinha mais ninguém ao redor, o que já era de se esperar já que o parque estava sempre vazio.

O caso é que a garota definitivamente estava falando com ele, a não ser que fosse louca. Na verdade, se ela estivesse mesmo falando com ele, ela seria tão louca quanto se estivesse falando sozinha.

Olhou para ela mais uma vez, dessa vez não só para o rosto. Notou que ela tinha uns seios grandes. Gostou disso. Voltou seu olhar novamente para o seu rosto, e decidiu que a achava bonitinha, nada de mais é claro. A última vez que uma garota, fosse bonita ou não, veio falar com ele aparentemente sem motivo, ou interesse algum, ele estava em uma festa. Com o decorrer da conversa ele descobriu que, no final das contas, a garota estava interessada mesmo era em saber se ele tinha vindo de carro para conseguir uma carona para a casa já que ela estava bem bêbada. No entanto, essa outra garota a sua frente parecia, ao menos para ele, bem sóbria, mas era melhor prevenir.

— Não vim de carro – falou.

— Nem eu. Eu prefiro os trens – ela respondeu simplesmente.

Ele a olhou novamente sem entender muito bem o que estava acontecendo. Sentiu que devia dizer algo, mas não sabia o que. Então só ficou com a boca aberta, e depois desistiu. Deu mais uma tragada no cigarro e voltou a olhar pro lado, esperando que o silêncio e a falta de contato visual a fizesse ir embora.

— Você fuma de uma maneira engraçada – voltou a dizer a garota.

— Sou meio novo nessa história de fumar – ele disse tentando não parecer irritado, sem sucesso.

— O que você está fazendo aqui? – perguntou-lhe ela.

Ele começou a achar que ela falava e perguntava muitas coisas aleatórias e sem sentido. Ele não gostava daquilo.

— Vim aqui porque esse parque está sempre vazio e queria ficar sozinho – uma indireta bem direta para ela.

— Quer que eu vá embora?

Ele ponderou sobre aquilo. Apesar de ser irritado, não costumava ser grosso com as pessoas que tinha acabado de conhecer. Olhou bem para a garota, decidindo se iria ser sincero e grosso, ou falso e gentil. A garota olhava para ele, ela tinha olhos tão grandes, doces e claros que pareciam estar olhando dentro de sua alma. Aquilo o deixava muito desconfortável.

— Não – disse ele por fim. – Não quero – era mentira.

Ficaram em silêncio.

— E o que você está fazendo aqui? – ele perguntou se sentindo obrigado a continuar a conversa, já que tinha dito que queria que ela ficasse.

— Eu sempre venho aqui.

— Está brincando? – voltou a perguntar surpreso. – Esse lugar é patético – cuspiu as palavras.

— Então, por que está aqui?

— Já disse. Queria ficar sozinho. E além do mais, a vida é patética. Estar aqui, ou estar em qualquer outro lugar... Não faz diferença.

Ficaram um bom tempo em silêncio novamente. Ele não diria um silêncio desconfortável, pois gostava muito de silêncios. Mas sempre que ele a olhava, ela estava olhando fixamente para ele com aqueles malditos olhos. Ele terminou o cigarro e jogou o que sobrou no chão, pisando em cima para apagar as sobras, passou a mão no cabelo, olhou para um lado e depois para o outro, por fim olhou para ela.

— Eu já vou – disse, se desencostando da árvore e começando a caminhar pelas folhas secas em direção a saída.

— Eu também – falou ela, indo atrás dele.

Começaram a caminhar lado a lado, não que ele quisesse aquilo, ela estava apenas o seguindo. Saíram do parque sem dizer uma palavra. Caminharam um tempo pela avenida, numa calçada ao lado do parque.

— Pra onde você está indo? – ele perguntou apenas para saber se ela o seguiria até em casa.

— Vou pegar o trem. Gosto de trens – sorriu.

— Eu sei. Você já me disse isso – disse ele amargo.

— E você?

— Vou pegar o trem também. Não tenho carro.

— Eu sei. Você já me disse isso – ele ficou irritado ao vê-la repetir sua frase.

Continuaram em silêncio, caminhando em direção à estação mais próxima. Ele pegou mais um cigarro no maço que estava no bolço do jeans, pegou também o isqueiro. Enquanto ele tentava acender ela disse:

— Odeio o cheiro de cigarro.

— Eu também – ele disse tragando.

Depressão e EuforiaOnde histórias criam vida. Descubra agora