Epístolas submergidas.

130 5 3
                                    

Querida, Maria

Eu encontrei um jeito de te imortalizar para sempre, minha querida.

Alguns meses se passaram e, falar de você, já não dói mais. Não há necessidade de dizer adeus quando você estará comigo para sempre. Eu queria escrever, eu precisava escrever. Eu não tinha ninguém para escrever, e sei também que você jamais me responderá. De qualquer forma, eu jamais saberei superar a sua partida, você não me disse adeus. Como é que eu posso viver sem você ao meu lado, minha pequena? Foram tantos momentos juntos, sejam eles bons ou ruins. Eu esperava por você todos os dias em que você voltava do serviço. Eu fazia questão de tê-la sempre ao meu lado em qualquer momento especial, por mais pequeno que ele fosse. Talvez te escrever me ajude, eu sinto uma saudade que afoga. 

Sabe, minha querida, por muito tempo eu culpei a Deus. Eu me perguntava todas as noites porque que todos os dias Ele tirava pessoas boas de mim. Até hoje eu não sei a resposta, mas posso te dizer que eu sou grata. Não por Ele ter tirado de mim as pessoas que eu mais amava, mas sim por não ter me deixado desamparado. Talvez um dia a gente se encontre, eu ainda não sei. Talvez eu tenha mais alguma coisa para fazer aqui, eu estou um pouco confuso. 

Eu fico a imaginar por que Ele não me levou. Você era tão boa, merecia viver e presenciar ainda tantas coisas. Sua neta dizia que você ainda veria os filhos dela crescer. Ela ainda chora todas as noites, sabia? Diz a todos que contará para os seus filhos a grande mulher que você foi, disso podemos ter certeza. Eu não consigo me conformar ainda, mas hoje eu posso compreender. Quando as coisas tem que acontecer, elas simplesmente acontecem. Quase nunca podemos interferir. Eu não acredito no destino, eu acredito em escolhas. E eu acredito na morte também. Acredito que quando ela chega, é porque estava na hora. Pode parecer meio injusto, mas eu me conformei assim. Dói menos.

Eu queria muito que você estivesse aqui, minha querida. O Sr. Jingles sente muito a sua falta, sabia? Aliás, todos nós sentimos a sua falta. Não poder mais sentir o seu cheiro tortura, minha velha amiga. A morte nunca nos afasta para sempre das pessoas. As vezes, por incrível que pareça, nos aproxima mais do que realmente importa. 

Talvez um dia a gente aprenda que nada é para sempre. Que quando as coisas tem que acontecer, elas apenas acontecem, sem mistério. Talvez, um dia, em qualquer esquinas dessas, no meio de tantas outras, nós poderemos dar valor para o que realmente importa. 

Mas agora, eu só te queria aqui, minha criança.

Epístolas submergidas.Onde histórias criam vida. Descubra agora