Sonhos Invasores

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O céu estava completamente nublado, não havia nenhum vestígio do lindo azul que costumava permanecer ali, tanto, que quase não era possível de se enxergar nada. Gritos desesperadores ecoavam por toda a parte juntamente de várias sombras que descontroladamente passavam por ela; tão desesperadas que quase fizeram-na sentir-se invisível.
Reconhecia somente duas pessoas de toda aquela horrenda situação: o garoto e garota de cabelos negros, com as asas mais brilhantes que qualquer um já havia visto. Contudo, encontrava-se desorientada, sem saber o que fazer, só sabia que não podia, de maneira alguma, ser fraca. Precisava acabar com aquilo, era agora ou nunca...

Kiara acordou assustada e ofegante, o mesmo sonho que vinha perseguindo-a há anos acabara de fazer sua aparição novamente. Tirando diversos fios de seu cabelo momentaneamente emaranhado de seu rosto, sentou-se rapidamente em sua cama como uma falha tentativa de acalmar-se e preparar-se para mais um monótono dia.
Logo levantou e fez seu caminho ao banheiro, não pôde deixar de reparar no silêncio que permanecia naquela casa todas as manhãs. Não era como se não gostasse, somente parecia algo que não havia sido feito para ela.
Voltando ao quarto, tratou de tirar aqueles pensamentos da cabeça, era muito cedo para raciocinar.

Tinha de admitir, gostava demais de seu quarto, era como seu próprio pequeno mundo. Haviam desenhos espalhados por toda a parede, todos relacionados ao mesmo sonho. - de um lado, encontrava-se o esboço de uma garota aparentemente muito bonita, com longos cabelos negros e intensos olhos verdes; já, no outro, encontrava-se um garoto de olhos castanhos com cabelos da mesma cor, apesar de existirem algumas mechas mais aproximadas do castanho escuro - Eram sempre os dois, invadindo os seus sonhos dia após dia.
Existia algo que a intrigava também. O fato de que ambos sempre apareciam em sua mente - e consequentemente em seus desenhos - possuindo asas. Mas não qualquer tipo de asas; eram enormes e exuberantes, o que levava Kiara a questionar seriamente sua saúde mental.

Saindo de mais um devaneio, olhou para o pequeno relógio que permanecia encima de sua cabeceira e logo percebeu que estava atrasada, fazendo com que se apressasse e reclamasse sobre a vida consigo mesma, pensando em como deixava pessoas - se é que podiam ser denominadas assim - imaginárias interferirem tanto em sua vida.

Descendo às escadas já com todo seu material pronto, seguiu para a cozinha e foi de encontro à mãe que preparava um café da manhã um tanto quanto exagerado se considerado o apetite regular de Kiara pelas manhãs.

­­ – Bom dia, mãe

– Bom dia, querida - disse afastando-se do fogão e abraçando a filha que logo sentou-se à mesa – Dormiu bem?

Era uma pergunta consideravelmente irônica ao ver da menina, pois tinha a mais absoluta certeza que a mãe sabia exatamente a resposta para a pergunta que sempre insistia em fazer, mas, de qualquer forma, não podia culpa-la; entendia que a esperança de se ver o bem-estar de um filho era, definitivamente, a última que morria. 

– Você sabe, do mesmo jeito de sempre.

Era perceptível  a amargura em sua voz, mas o que podia fazer? Não iria enganar a mãe e fingir que tudo estava bem.

– Eu sinto muito, meu amor - Joanna disse com pena da filha, apesar ter consciência de que pena era a última coisa da qual a menina precisava agora. Mas já havia tentado de tudo, desde os psicólogos mais simples até os tratamentos mais exorbitantes, sempre obtendo o mesmo resultado: nada. Estava de mãos atadas, tudo o que podia fazer era demonstrar sua compaixão e apoio.

E sem mais nenhuma palavra, ambas comeram silenciosamente e logo seguiram para fora de casa, entrando no carro e seguindo seu trajeto rumo à escola de Kiara.

Na casa, eram somente Kiara e sua mãe. O pai - Marcos - havia falecido em um acidente de avião quando ela tinha apenas três de idade e, desde então, a mãe adquiriu a missão de fazer o possível e o impossível para oferecer-lhe somente do bom e do melhor.                                                                                 Às vezes, no silêncio da noite, Joanna parava e pensava o quanto sentia falta do marido, o modo como ele a fazia sorrir e como sempre sentia-se segura ao seu lado; não é fácil quando a pessoa em quem você mais confia, que você mais ama, vai embora sem uma explicação aparente.
Tinham planos de viajar o mundo todo, mas logo a filha nasceu e todo o tempo do casal fora ocupado, mas não ficaram tristes ou desanimados com isso, muito pelo contrário, o nascimento daquela menina era o símbolo do amor mais puro do amor que já houve entre eles; e foi por causa desse amor, que a mãe teve de ser forte após a morte do marido. Jurou deixar Marcos - onde quer que ele estivesse - orgulhoso.

Chegando à escola, Joanna parou o carro e olhou para a filha

– Tenha um bom dia, querida.

Kiara, que adquiriu um súbito mal pressentimento sobre aquele dia, respondeu com um sorriso forçado:

– Obrigada, mãe, até mais tarde.

E assim, após descer do carro, seguiu até a entrada, cumprimentando os seguranças que se mantinham ao lado dos portões.                                                                                                                       Era um grande estabelecimento, vale-se ressaltar, a menina realmente achava que poderia acabar perdida lá dentro se não prestasse devida atenção, porém, por mais estranho que pareça, era um lugar reconfortante para os que estavam lá a tempos, como se estivessem na companhia de uma segunda família. Uma pena esse não ser o caso de Kiara.

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⏰ Última atualização: Oct 13, 2018 ⏰

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