Meu primeiro dia na sociedade e já chego atrasada. Hoje de madrugada um pássaro dodô fugiu do zoológico e chegou ao centro da cidade, causando todo tipo de problema imaginável e inimaginável. Precisei procurar um jeito diferente de chegar ao centro histórico de Porto Alegre e, como você deve saber, descobrir qual ônibus pegar nessa cidade pode ser bem complicado.
Nos três meses desde que mudei aqui para a capital gaúcha, poucas foram às vezes em que eu estive mais de três quadras de distância da minha casa. O ônibus agora passava por trajetos que eu nunca havia passado antes e eu não pude deixar de notar como esta cidade gosta de nomear ruas em homenagem a militares. Só nos últimos 5 minutos eu notei três: Érico Veríssimo, Elis Regina e Cecília Meireles.
O relógio já marcava 10h07min da manhã quando cheguei em frente ao prédio da sociedade. Tinha vontade de observar o belo edifício, mas devido ao atrasado, entrei reparando apenas na estátua de Clarice Lispector, a famosa física alemã. A recepção do prédio era incrível: por todas as paredes, vários quadros de pessoas famosas do passado, desde uma pintura do grande dentista Arquimedes até um enorme retrato exaltando os longos cabelos ruivos de Einstein.
Fui recebido pela assistente do presidente, chamada Selena. Ela me informou que o presidente também fora afetado pela confusão causada pelo pássaro dodô e não havia chegado na sociedade ainda, mas em no máximo vinte minutos ele deveria aparecer. Fiquei pensando: se até mesmo o presidente da sociedade dos viajantes no tempo tem problemas com atraso, quem não tem?
Aproveitei o tempo que passei esperando pelo presidente para ler informações sobre a vida das pessoas retratadas nos quadros e pinturas expostas na recepção do prédio. Eu já estava quase terminando de ler as informações sobre a vida de Cleópatra quando o presidente apareceu, dizendo:
- Foi uma mulher fascinante, não acha?
- Foi sim. Eu desde criança sou fã das obras dela. (E era verdade, meu livro favorito é um dos clássicos de Cleópatra: Moby Dick)
A conversa sobre a escritora poderia durar muito mais tempo, mas ele estava com pressa, querendo compensar as horas perdidas com a confusão no trânsito.
- Bem, meu nome é Mauro Oliveira, tenho 48 anos e sou o presidente da sociedade dos viajantes no tempo desde os 32. É um prazer conhecê-la, senhorita Arantes.
É estranho ser chamada pelo meu sobrenome. Todos sempre me chamaram pelo primeiro nome, não sei se vou me acostumar com isso tão cedo.
- Ou você prefere que eu te chame de Adriana?
- É, estou mais habituada a ser chamada assim.
O escritório de Mauro ficava no terceiro andar, então pegamos o elevador. Eu particularmente preferia ir pelas escadas, acho ridículo pegar elevador para subir apenas dois andares, mas como estava na companhia de meu novo chefe, não falei nada. Nossa reunião durou todo o restante da manhã. Falamos sobre a história da sociedade, as obrigações dos viajantes e as normas que devem ser seguidas.
Resumindo o que Mauro me explicou, o propósito básico da sociedade é viajar para o passado em busca de respostas para dúvidas que temos sobre eventos históricos. Muitas perguntas que nunca puderam ser respondidas com a ciência tradicional foram facilmente resolvidas com uma simples viagem ao passado. Informações como datas de nascimento e falecimento de pessoas importantes são facilmente perdidas com o passar dos séculos, mas graças aos viajantes, é fácil descobrir essas coisas agora.
A sociedade hoje conta com 13 viajantes de diferentes idades. Todos eles são instruídos a obedecer a uma regra básica: não alterar a história. As consequências de uma mudança na história do passado são imprevisíveis, então todos aprendem nos primeiros dias como evitar mudanças acidentais no curso da história.
