terça-feira, 31 de julho de 2018
17:58Queridas memórias,
Hoje eu acordei mas queria não ter acordado. Não é que eu esteja pensando na morte, nada disso. O maior problema é acordar todos os dias com a garganta engasgada, os olhos vermelhos e cansados, sentindo sempre uma força te puxando para baixo. Eu levanto com certa relutância, me olho no espelho e observo as duas marcas cinzas abaixo dos meus olhos e os cabelos quebradiços e sem vida.
As coisas começaram aos meus 15 anos quando eu perdi meu pai. Nós éramos muito próximos, mas a vida me tirou dele. Foi então que eu comecei a questionar tudo e a perder a minha fé.
Por que papai? Por que você me deixou?
Parei de comer e emagreci 12kg. Estava magra, as unhas mal feitas e meus olhos pareciam dois buracos negros completamente sem vida.
As pessoas na escola não gostavam de mim, me achavam estranha por causa das minhas roupas velhas e rasgadas e meu cabelo pintado sempre amarrado em um rabo de cavalo. Este dia eu usava uma camiseta preta velha que já haviam alguns furos e uma calça jeans surrada. Meu cabelo estava sujo mas eu não me importava.
“Esquisita”
“Feia”
“Por que você não se mata?”
Morte.
Eu nunca vou me esquecer do dia em que a primeira pessoa disse que eu deveria me matar. Lembro de ter chego em casa correndo, tirado minha roupa e me jogado na cama para chorar. As lágrimas escorreram queimando meu rosto e fazendo minha cabeça doer. Minha mãe bateu na porta, entrou, tentou me consolar mas nada adiantava. Nada iria parar meus soluços – ‘Ela disse para eu morrer, mamãe Por que as pessoas não gostam de mim? O que tem de errado comigo?’. Quem, quem, quem ela perguntava.
Minha mãe tentou me salvar diversas vezes, mas é impossível salvar uma alma que não quer ser salva. Uma alma que já estava morta por dentro.
Eu só via escuridão, as noites eram frias e meu corpo estava fraco. A vontade de ficar na cama era cada vez maior. Mesmo as poucas vezes em que eu saía eu sentia que havia uma nuvem negra em cima da minha cabeça e uma voz ecoando em meus ouvidos dizendo para eu desistir, que não vale a pena, as pessoas não gosta de você mesmo ela dizia.
“Ela é esquisita, não acha?”
“Olha o cabelo dela”
“Por que ela não fala com as pessoas? Deve ser metida”
Os xingamentos não me incomodavam mais, eu sempre soube que era diferente e que, por algum motivo, eu estava a destinada a não ter amigos.
Passaram-se anos, meses dias.. Até o dia em que uma garota virou para mim e disse: “Você está desistindo. Não está tentando o suficiente.”
A verdade é que é muito fácil para alguém falar para a pessoa que está com depressão de que ela não está tentando o suficiente, de que todo mundo fica triste e é normal, isso passa. E é por causa disso que muitas das pessoas com depressão se escondem, se isolam e até se suicidam. Mas ninguém se importa com isso.
Com 22 anos eu decidi morar sozinha, sentei na minha cama, acendi meu cigarro e tomei um gole do meu café preto pois é aquilo que dizem, todos nós somos viciados e algo que mande nossa dor embora. Abri meu notebook eu escrevi no meu diário:
“Eu me curei da depressão. Não por causa dos remédios ou da psicóloga. Ou porque uma garota disse que eu não estava tentando o suficiente. Hoje eu sei que a opinião de outras pessoas não vai definir quem eu sou. Eu mesma sou responsável pela minha própria identidade e eu não preciso de aprovação de ninguém para ser assim. Eu me curei da depressão porque eu aprendi a dar valor a vida. Só vivemos uma vez e eu tive a escolha de viver infeliz até a morte ou curtir as poucas coisas que eu tenho. A depressão não foi embora. Ela nunca vai, sempre fica ali quieta esperando a brecha para sair. Ás vezes eu deixo com que ela saia, me permitindo deitar em minha cama e permanecer assim durante longas horas. A melhor parte de se curar da depressão não é dizer que ela foi embora e sim dizer que agora é você quem decide se quer ela acordada ou dormindo.”
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UM RELATO SOBRE A DEPRESSÃO
Teen FictionO relato mais transparente e angustiante sobre a depressão.