Algo Como a Voraz e Desconhecida Partida

5 2 0
                                    

Você já viu algum espírito? Ou alguma vez pensou estar louco por achar que pode vê-los? Infelizmente algumas coisas acontecem, ou deixam de acontecer, sem que percebemos...

Era um dia de março, pouco depois de meu aniversário. Eu havia chegado em casa depois de trabalhar e estava aterrorizado, pois acabara de sair ileso de um forte acidente envolvendo o trem em que eu estava. Mais tarde, fiquei sozinho em meu quarto ouvindo o álbum "Dirty" do Sonic Youth, enquanto bebia um copo de café. Estava tudo escuro e chovia forte. O barulho do vento se encontrando com as janelas de metal era inquietante. O disco acabou e passei a ouvir "Black Market Music", do Placebo. Com os olhos abertos, pude ver a porta do quarto se abrindo, tudo bem, é só o vento, mas não era, pois as janelas estavam todas fechadas. Levantei e vi um vulto passando através de mim. Olhei de volta e lá estava ele, caminhando lentamente em direção a janela, se entregando a chuva. Pude sentir todos os pelos de meu corpo se erguendo em protesto. Medo e confusão tomaram conta de mim. Sentei-me em minha cama. A música "Black Eyed" estava tocando e, de repente, parou.

...I was never grateful that's why i spend my days alone...

Corri até o interruptor e acendi a luz. Olhei para a janela e foi como se alguém estivesse pulando-a. O vulto sumiu, sem explicação alguma. Ofegante, caminhei até a sala e liguei a TV para me distrair.

Havia passado algumas horas e os programas eram todos irritantes. Desliguei a TV e voltei para o quarto para refletir sobre o estranho fato que ocorrera mais cedo. Não consegui encontrar explicação para aquela visão pavorosa do vulto atravessando minha entranhas, muito menos para a música ter parado. Ponderei a possibilidade do disco estar riscado ou a energia ter acabado, mesmo que por uma fração de segundos – que foi o tempo que levei para acender a luz – e não consegui explicação que me confortasse. Enfim, adormeci.

No outro dia, de manhã, fui trabalhar como faço todos os dias. Em algum momento do expediente, li na internet alguma coisa sobre vultos e aparições, e coisas semelhantes. Não encontrei nada de importante, porém, uma imagem peculiar me chamou a atenção. Havia uma pequena foto no lado esquerdo da matéria, um rosto olhando diretamente para mim. Fechei os olhos e os abri novamente. Neste momento, percebi que o rosto na foto não estava mais olhando para mim, e sim para seu lado. Fiquei estupefato, admirando a tela.

As horas seguintes foram de nervosismo e inquietação. Ponderei se havia enlouquecido ou se era apenas minha imaginação trabalhando com uma frequência maior que a de costume. Optei por acreditar na segunda alternativa, assim fui para casa e dormi tranquilamente.

Os dias que se seguiram foram normais e tranquilos a ponto de eu me esquecer dos bizarros acontecimentos anteriores. Então, em uma sexta-feira, quando estava quase chegando em casa, tive a sensação de que alguem me seguia. Passei pelo portão do prédio e o tranquei. As subir as escadas, pude ouvir passos atrás de mim. Abri a porta para entrar e, ao fechar, senti algo atravessando o caminho, algo que não pude ver. Meu pelos se eriçaram, depois um vento extremamente forte passou por mim de forma voraz. Bati a porta com o susto. Peguei um copo d'água e a bebi com as mãos tão tremulas que mal conseguia segurar o copo.

Voltei minhas atenções para a TV. Permaneci no ócio até que minha mãe chegou. Estranhei o fato de ela não ter falado comigo. Depois de jantar e me ceder um pouco de companhia, ela foi deitar-se. Continuei vendo os programas por mais um tempo e resolvi desligar TV, ao pegar no controle-remoto, este estava extremamente frio. Apertei o botão de desligar, levantei-me e olhei de soslaio para a tela. Não pude acreditar no vi! Na tela do aparelho estava estampada uma imagem espectral. Como um espirito maligno, negro, porém claro o suficiente para se destacar no breu da tela. Olhava diretamente para mim. Depois de alguns segundos, a imagem foi sumindo, como se o espirito fosse flutuando para trás. Fiquei imóvel, paralisado, amedrontado e confuso. Isso está realmente acontecendo comigo? Não ousei me mexer pois, além de não ter coragem para tal, ocorreu-me que poderia ter algo bem atrás de mim. Enfim, após muitos minutos, criei coragem e virei-me em direção ao quarto, não havia ninguém. Deitei-me e, antes de fechar os olhos, pensei na possibilidade de deixar a luz ligada. Acabei me levantando e acendendo a lampada, assim, consegui ao menos fechar os olhos e, só depois de quase uma hora, caí no sono.

Naquela noite tive o pior de todos meus os sonhos – ou pesadelos –, até então.

Eu estava em um lugar que, a principio, não reconheci. Estava escuro e eu me sentia cansado, como se houvesse passado horas andando a esmo, sem comer ou beber. Não havia ninguém por perto e não se ouvia barulho algum. De repente, comecei a ouvir vozes sussurrando em meus ouvidos: "Corra! Agora! Corra! Foi então que percebi onde estava. Exatamente no centro da cidade. Próximo ao Vale Do Anhangabaú. Passou um ônibus, vazio. Notei que também não havia ninguém no volante. Depois que o veículo passou, no lugar onde eu olhava antes, tinha um velho com um chapéu preto. Ele usava roupas esfarrapadas e seu olhar era penetrante e atroz. Fiquei ali, parado, enquanto ele me fitava, agora com um olhar de escárnio. O que antes era medo, tornou-se um sentimento impossível de descrever porque, agora, ele andava em minha direção. Tentei recuar, porém, o velho foi mais rápido. Segurou minha cabeça com as mãos e abriu um boca que tornou-se duas vezes a de um tamanho normal. De dentro de sua garganta, aumentando ferozmente, ouvia-se um grito agudo, estridente. Meus ouvidos ardiam com a intensidade daquele grito ensurdecedor. Pensamentos ruins me entorpeceram até que, finalmente, acordei, assustado.

Senti meus cobertores começando a molhar de suor. Eu transpirava e ofegava bastante. De imediato, fiz um ligação entre as coisas estranhas que me aconteceram, com este pesadelo horrível. O que há de errado comigo? Levantei-me e peguei um copo com água. Devo ter tomado quatro rapidamente, tamanho meu nervosismo. Voltei para meu quarto e deitei-me, novamente com a luz acessa. Quase três horas depois, me levantei para trabalhar. O dia foi completamente normal e entediante. Porém, após alguns dias, percebi que não havia ninguém querendo falar comigo e todos ignoravam uma fala minha. Comecei a me sentir estranho e mais solitário que antes. O tempo todo estava com um humor péssimo e fui piorando a cada dia. Até que resolvi não trabalhar mais. Ficava o dia inteiro no quarto ouvindo minhas músicas depressivas. Foi então que, em um determinado dia, enquanto ouvia o disco "Angst" do Lacrimosa, mais precisamente a música "Der Letzte Hilfeschrei" (O Último Grito De Socorro), que me ocorreu a possibilidade de um fato mais que absurdo. Levantei-me da cama e fui em direção ao quarto vazio da minha mãe. Havia fotos minhas no criado-mudo – o que era extremamente anormal. Vasculhei a gaveta de minha mãe e encontrei o que procurava. Um papel, branco e dobrado em duas partes. No lado escrito estava claramente a minha certidão de óbito. Embora já suspeitasse, não pude acreditar no que vi. Ó, vida injusta e maldita! Não sobrevivi ao maldito acidente no trem! Eu estou MORTO!

Algo Como a Voraz e Desconhecida PartidaWhere stories live. Discover now