Capítulo 2

69 5 0
                                    

15 de Outubro de 2010 14H30

"Querida pessoa que teve a infelicidade de encontrar esta carta,

Provavelmente não sabe quem eu sou mas eu conto-lhe a minha história.

Tudo começou no quarto ano da escola primária, empurram-me para a pequena horta que havia na escola. Na altura não percebi bem tal ação, mas quando recordo aqueles momentos sinto-me estúpida. Como é que se poderia pensar alguma coisa positiva quando me atiraram para a terra e me deixaram num estado em que nenhuma criança jamais deveria estar? Penso que foi o início de uma nova etapa da minha vida. Acredito que tudo acontece por uma razão, por isso nada do que me aconteceu a partir daquele dia não foi em vão. Talvez é o meu destino. Talvez seja quem for que está a olhar por nós "lá em cima" quer ver-me crescer com tudo e tornar-me forte. Tenho pena que essa figura não tenha pensado que eu não consigo aguentar todas estas adversidades. Porque apesar das minhas crenças, quando o meu corpo não aguenta, nada feito.

Peço desculpa por tê-lo(a) feito ler isto. Isto é, se ainda não se fartou (não julgo, toda a gente acaba por se fartar).

Aproveite a vida, esta é maravilhosa sem mim.

Iris"

Reli esta carta vezes sem conta. Tantas vezes que o chocolate quente que havia comprado antes de entrar no comboio estava completamente frio. Chocolate gelado, portanto. Estavam temperaturas bastante baixas, até mesmo para a minha gelada cidade.

Esta carta seria a única coisa que explicaria o meu desaparecimento, se eu efetivamente fizesse alguma coisa. Gosto de estar preparada, por mais sinistro que pareça.

Saí do comboio e dirigi-me ao banco perto do parque de estacionamento. Este banco tinha-se tornado o meu melhor amigo há meses. Vinha para aqui todos os dias depois de almoçar, dizendo sempre aos meus avós que iria à biblioteca. Bem, eu nem sequer sei se eles ouviam-me sempre a dizer que ia sair. Na verdade eles estão um pouco surdos. Sinais da idade.

Todos os dias me questionava: o que acontece depois da morte? Uns pensam que encarnamos outra vida, outros dizem que vamos para o céu e olhamos por quem ficou em terra, e ainda há quem não acredite em nenhuma dessas coisas. Eu cá prefiro considerar todas as opções e analisá-las. Talvez tolo por minha parte. Sempre me habituei a falar sobre alguém/alguma coisa por experiência própria, permite-me não assumir coisas erradas.

Uma coisa que nunca pode ficar em casa é o meu diário. Uso-o para escrever o que sinto e o que nunca ousarei dizer. É o meu segredo e o meu único amigo.

"Tu pensas demasiado.", uma voz despertou-me (assustou, mais propriamente).

Olhei para a meu lado e vi o rapaz de que a pequena Sammy tanto gostava. Tinham-se passado uns meses desde que o vi mas vá lá, uma cara daquelas não se esquece. Isto vindo de alguém com expectativas altíssimas e gosto particular em rapazes.

"Assumes sempre coisas sobre quem não conheces, tão rapidamente?", franzi as sobrancelhas, queria-o longe de mim o mais rápido possível.

"Não que me queria intrometer mas todos os dias trabalho na padaria ali em frente", apontou "e todos os dias te vejo aqui sentada, simplesmente a olhar para esse teu caderno.", sorriu assim que acabou de falar.

Mas será que ele não percebe que estava sozinha e assim me queria manter?

"Se me viste a olhar para o meu caderno, sempre sozinha, porquê que decidiste vir falar comigo quando eu, claramente, aprecio estar só?", por favor estrelinhas e outras coisas lindas do céu, façam com que ele vá embora.

Mas não.

Simplesmente encolheu os ombros e voltou a falar. "Pareces solitária", sorriu e desta vez reparei numa covinha no lado esquerdo da sua face. Ignorei-o. Pode ser que se vá embora.

"Não era minha intenção parecer rude, só pensei que estarias melhor se tivesses companhia.", resolveu dizer depois de minutos de silêncio.

"Eu estou habituada a estar sozinha. Eu quero estar sozinha.", disse lentamente para ver se as minhas intenções eram mais claras.

"Tu realmente não gostas de falar com ninguém, a tua mãe tinha razão.", mas quem é que ele pensa que é? Melhor, o quê que a minha mãe pensa que sabe sobre mim?

"Nem tu nem a minha mãe sabem o que eu sinto, muito menos o que penso!", eu estava absolutamente indignada, daí a rapidez com que o volume da minha voz subiu.

"Hey, desculpa. Eu só me limitei a constatar o que me foi dito. Não queria de alguma maneira ofender-te.", o rapaz, cujo o nome nem sequer me lembro, tocou-me no braço como sinal de carinho.

Ele estava com pena de mim. Pena. Ridículo.

"Olha e que tal não voltares a chatear-me? Tudo o que eu quero é paz.", levantei-me, fazendo com que ele soltasse o meu braço.

"Hey, espera!", gritou.

"Adeus.", nem olhei para ele, caso contrário ele continuaria a insistir.

15 de Outubro de 2010 16H30

Onde está o raio da carta? Iris, a carta. A carta.

Pânico tomou conta de mim. Tudo à minha volta se tornou indiferente ao meu corpo. Todas as minhas sensações estavam à prova. Calafrios por todo o meu corpo. Todos os meus problemas foram relembrados.

Por favor, não. Outra vez, não.

Calma Iris. Inspira, expira.

Depois deste ciclo vicioso se repetir várias vezes a minha respiração voltou ao normal -que por sinal não era ao melhor ritmo. Sem dar por mim, lágrimas molharam a manga do meu casaco, que eu usara para cobrir os olhos.

Agora, mais calma, pensava no propósito da carta e onde ela estaria.

Hiiii, aqui está o segundo capítulo da Half Way There. Desculpem se é pequeno mas no telemóvel não tenho noção do tamanho. Feedback é sempre bom!

Half Way There | H.S.Onde histórias criam vida. Descubra agora