Coroas em queda

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   Os jovens herdeiros dos reinos de Karmália e Kádrys sempre estavam pelos corredores do castelo da família de Júlia, crianças com a idade deles não tinham tantas preocupações quanto os adultos, mesmo que seus reinos fossem conhecidos como os mais pacíficos durante séculos de guerras e batalhas por novos reinos.
   O príncipe sempre demonstrou um carinho estranho por sua prima, mas todos ignoravam e justificavam como sendo algo ligado aos dois terem sido criados juntos e provavelmente consideravam-se irmãos, mesmo que por vezes, o jovem tenha mostrado que não era apenas um amor só de irmãos. Assim mesmo Júlia nunca deixou de alimentar o sentimento do seu primo, quando brincavam de rei e rainha ou marido e mulher.
   Anos depois, ao completarem seus treze anos de idade, a maturidade já desaguava sobre a cabeça da herdeira de Karmália, o que fazia com que seus pais já estivessem com cuidados avançados para que ela fosse uma substituta a altura deles. Mas com Kelvin era diferente, já que ele não ligava para nada além de sua prima, o que levou seus pais a rígidas repreensões pelo fato. Quando eles perceberam que o grande afeto do príncipe pela prima era mais do que imaginavam, tiveram que decretar que ficassem o mais distante que pudessem entre si, mas Júlia não era o maior exemplo de boa e recatada moça, principalmente sem a presença dos pais, ela fazia questão de fugir da guarda e ir ao encontro do primo, que faria qualquer coisa por ela.
   Perto de completarem quinze anos, enquanto brincavam já no fim do entardecer e a beira do enorme muro de Kádrys, perceberam uma movimentação estranha nos intervalos dos troncos das árvores que formavam a densa floresta, foi quando notaram que se tratava da silhueta de um soldado do leste, aqueles que haviam saqueado um reino no norte e depois sumiram na floresta. Então eles correram para o castelo no intenção de informar o que haviam visto na escuridão da mata, mas já era tarde demais e o ataque começara antes que pudessem falar com os pais de Kelvin.
   Os bárbaros conseguiram ultrapassar os muros do reino e não tiveram pena nem das crianças que atrapalhavam seu caminho, que era chegar até o salão da coroa. O desespero de todos os que lutavam para continuar vivos era agoniante, corpos mutilados tomavam as ruas e a grama se tornava escarlate, Júlia e Kelvin se esconderam na escuridão de uma pequena fresta entre duas casas até que aqueles assassinos passassem. O príncipe pegou Júlia pela mão e correu para a entrada de um bueiro logo ao percebeu que não teria perigo sair dali, era uma das passagens secretas que levavam até o salão da coroa, onde os pais de Kelvin e os melhores cavaleiros poderiam estar. O choro e o desespero eram os maiores obstáculos, tudo o que viram fora daquelas paredes fora assustador demais para duas crianças que não eram acostumadas a qualquer tipo de crueldade, nem com animais, eles viram pessoas sendo estraçalhadas a sua frente.
   Quando estavam chegando no salão, ouviram sons de metal em conflito e gritos altos, então perceberam que também não haviam chegado a tempo. Eles acalmaram os passos e a respiração, para que não fossem percebidos atrás das cortinas, Kelvin viu seu pai jogado ao chão todo ensanguentado e olhando para sua esposa que sentara em seu trono, por ordem do rei bárbaro que se sentara no lugar do rei.
    - O poder, não cai bem aos - ele olhava risonho para a rainha que segurava o choro. O tirano olhou para o rei e apontou sua enorme e ensanguentada espada - tolos.
    - O que veio fazer neste reino? nunca tivemos nenhum tipo de conflito com seu povo - perguntou a rainha Regina, tentando se mostrar firme.
    Ele soltou uma gargalhada alta e cheia de saliva, um riso tão alto que Regina se assustou - Minha cara, primeiro, viemos para ver o tom do sangue de vocês e provar para saber o sabor de cada um - ele olhava fixo para o rei Marcos - eu também já tenho um trono, não preciso de outro.
    - Mas seus soldados invadiram nosso reino, a preço de nada?
    - Mas - ele enfatizou - somos entre três irmãos, e um deles não tem reino ainda. Se for de seu querer, tomar este para si, assim será, pois já o conquistamos, só basta ele querer - ele gargalhou novamente.
    - E o... - Marcos tentou falar, mas foi interrompido pelo sangue que travava em sua garganta - o que fará com os que continuam vivos, isso se deixaram.
    - Marcos? - Regina chorava - nosso filho?
    - Se seu filho for igual a vocês, deve estar jogado em qual lugar por aí, morto - ele riu e todos os soldados que permaneceram no salão riram também.
    Kelvin se impulsionou para ir ao encontro do rei bárbaro, mas Júlia o segurou - não vá, eles vão te matar também, não quero que morra - Júlia estava com os olhos cheios de lágrimas.
    - Não irei, vou cuidar de você - Kelvin sorriu para ela, na intenção de a acalmar.
    - Olhe, rei Marcos de Kádrys, conheça meu irmão, Grotus.
    Marcos se virou com o pesar das dores que sentia, os soldados bárbaros abriram caminho, arrastando para os lados os corpos dos cavaleiros mortos por eles, o chão escarlate era o tapete vermelho para a entrada do futuro rei de Kádrys.
    - Sim, meu irmão, este reino será meu - ele caminhava entre os bárbaros com empoderamento, com suas vestes feitas com pele de lobo cinzento, elas estavam banhadas de sangue.
    - Você terá um - o rei bárbaro olhou com nojo para Marcos - mero obstáculo na sua frente.
    - Isso não será problema - ele puxou sua espada da cintura e mirou Marcos. Regina não conteve o choro e seu marido olhou com amor para ela.
    - Eu te amo, minha cara.
    - Não há limites para chegar ao poder - Grotus gritou enquanto sua espada decapitava Marcos e depois seguiu ao encontro de seu irmão.
    Regina se jogou ao chão em prantos e desespero, Kelvin segurou o grito e abraçou Júlia que também continha o choro.
    - Lá fora, como estão os sobreviventes?
    - Poupamos muitos - ele rio olhando para o corpo de Marcos estirado ao chão - restaram algumas poucas dezenas.
    - E onde está Kraus?
    - Zark, meu irmão, ele deve estar aproveitando as novas belezas desta terra - os dois gargalharam.
    Sem notar, Júlia encostou em um candelabro que perdeu o equilíbrio e caiu ao chão, denunciando seu esconderijo. E antes que pudessem correr novamente pelo corredor, os soldados os agarraram e os levaram até os pés dos reis bárbaros.
   - Meu filho, você está vivo - Regina ainda jogada ao chão se emocionou ao ver seu filho.
    - Nós nos escondemos e depois viemos até aqui.
    - Seu pai...
    - Eu sei, vi o que fizeram - Kelvin fitou com os olhos cheios de ódio para Grotus.
    - Aprenda desde agora, menino, nada é eterno, principalmente reis fracos - Grotus gritou salivando.
    - A imortalidade não está em você.
    - O que disse, bezerrinho?
    - Você não é imortal, então a morte caminha em sua direção.
    - Isso é uma ameaça, fedelho?
    Todos os bárbaros riram e Grotus deu um forte tapa com a costa da mão no rosto de Kelvin - é assim que você fala com seu rei?
    - Você nunca será meu rei - Kelvin gritou e cuspiu nos pés de Grotus.
    - Rebeldes são meus favoritos - ele gargalhou - levem todos para seus quartos e os deixem presos até segunda ordem - foi quando ele notou Júlia escondida atrás do soldado que levou eles até seu encontro - deixe-me ver ela.
    - Júlia, não - o príncipe gritou e recebeu outro tapa de Grotus.
    - Linda, uma bela? - ele olhou para Regina.
    - Princesa herdeira de Karmália - respondeu aflita pelo o que ele poderia fazer com Júlia.
    - Uma princesa, herdeira das terras que também foram tomadas por nós nesta noite - todos voltaram a rir.
    - Não, meus pais, o que fizeram com eles? - Júlia gritou chorando.
    - Menina, infelizmente eles não tiveram a mesma sorte que vocês terão.
    - Nãoooo - ela se desesperou e Kelvin a abraçou fortemente.
    - Façam o que mandei, levem eles para onde mandei e certifique-se que só saiam quando eu ordenar.
    Regina foi até ao encontro dos dois e os ajudou a levantar, eles saíram do salão sendo escoltados pelos soldados. Antes que saíssem, encontraram com um jovem, que aparentava ter a mesma idade que eles, um menino com vestimentas semelhantes a dos irmãos bárbaros, mas ele estava limpo, tanto de qualquer tipo de sujeira quanto de sangue, e ele parecia não estar bem, foi quando ouviram pelas costas o rei Grotus gritar.
    - Anko, meu querido filho.

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⏰ Last updated: Oct 24, 2020 ⏰

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O Herdeiro das SombrasWhere stories live. Discover now