As risadas e conversas paralelas deram lugar a um silêncio intenso. Depois de mais uma das ideias de Mina, voltadas para o entretenimento, estavam todos exaustos e deitados em qualquer lugar da sala.
Inicialmente Jirou havia recusado mais uma noite que segundo seus amigos seria de diversão, mas foi convencida pela perseverança de Ashido e pelo pacífico pedido de Momo a fazer parte dela. E agora, por ter poupado energias apenas observando os demais, era a única a estar acordada.
Pensou em retornar ao seu quarto, ouvir uma música até conseguir pegar no sono, mas não queria. A imagem que estava em seu campo de visão era atrativa de um jeito que ela perdeu-se em sua mente. A luz do luar era a única coisa que a deixava observar os rostos dos que dormiam ali.
Sua mente mergulhou em pensamentos profundos. E isso já era um costume seu, algo inevitável que sempre acontecia em horários como aquele, caso estivesse acordada. Ou simplesmente nos momentos silenciosos.
Mas agora era diferente.
"Quer um pouco?"
A moça de cabelos curtos piscou algumas vezes quando girou o corpo na direção da voz.
Era Kaminari.
Jirou conseguiu enxergar um sorriso singelo que esboçava os lábios pequenos do rapaz. E em uma de suas mãos, segurava uma xícara enquanto sutilmente o cheiro de chocolate quente tocava o nariz dela.
"Não, obrigada." Respondeu por fim, depois de sua análise breve.
Sequer tinha notado a ausência do rapaz. E se ele havia saído em algum momento ela não lembrava de ter visto.
"É uma pena, coloquei um pouco de canela." O rapaz fez um bico que ela jurou ter sido a coisa mais dramática e ao mesmo tempo fofa que já viu.
"Sei disso, posso sentir o cheiro."
Kaminari tomou um gole do seu chocolate e em seguida mostrou um sorriso largo, seguido de um dedo polegar na direção dela como sinal de que estava bom. A moça não reagiu, apenas assistiu a cena e tentou não sorrir.
Silenciosamente o loiro sentou-se ao lado de Kyoka naquele sofá e a quietude daquela sala infiltrou um pouco de conforto no interior dela.
"No que você está pensando?" Ele indagou enquanto lançava um olhar curioso para ela.
E foi inevitável não reconhecer que ele definitivamente não sabia ficar em silêncio.
"Bobagens." Havia desânimo em seu tom de voz, mas não foi o suficiente para deixar ele menos interessado. Aliás, ela bem sabia que não existia nada que não deixasse o rapaz empolgado.
Era a eletricidade em pessoa, literalmente.
"Me deixe saber se é mesmo bobagem." Tentou.
Jirou olhou de soslaio as bochechas suavemente coradas dele. Não sabia se era pelo fato dele ter a pele alva e o líquido quente que bebia ter proporcionado aquele rubor. Ou se talvez fosse outra coisa.
Ignorou suas suposições, e decidiu exteriorizar seus devaneios.
"Já pensou em algum momento de sua vida que estava sendo coadjuvante dela? Mesmo sendo a sua história?" Ela desviou o olhar depois de falar.
Parecia ainda mais bobagem dita em voz alta, e sentia medo agora. Tentou ignorar a abrupta mudança no ritmo das batidas de seu coração, mas não foi capaz. E era por isso que detestava compartilhar seus pensamentos, sentia que estava sendo incoerente com a realidade, e que nem ela mesma entendia como sua mente funcionava. Exigir que outra pessoa fizesse isso era pedir demais.
"Vai achar estranho se eu disser que sim?" A pergunta roubou um suspiro e um olhar surpreso dela.
Ele estava mesmo falando sério? Ela não sabia, e por isso precisou ver com seus próprios olhos a imagem de seriedade mas o mesmo tempo cativante que cobria o rosto do loiro.
"Só pode ser brincadeira." Era normal que pensasse que sim, aliás, fazia parte da personalidade dele.
"Sinto muito dizer que não." Eles estavam sussurrando, e ela podia sentir ainda mais proximidade naquela conversa do que ela já possuía. "Sempre observo as outras pessoas. Suas evoluções, e eu torço por cada uma delas, e isso é natural, sem maldade, eu amo os meus amigos, mas..."
"Você não se sente o protagonista da sua história."
"Isso."
Eles sorriram ao mesmo tempo. O gesto foi brando, sem exagero e tão natural que quando perceberam já estavam sorrindo. Observando com calma a expressão no rosto um do outro. Buscando entender como era possível compartilhar pensamentos parecidos já que eram tão diferentes.
Ela conseguia ouvir as batidas do coração dele, e em como estavam aceleradas. Por muitas vezes aquela habilidade parecia desvantajosa, mas naquele momento era doce perceber como ele era amável em sua sinceridade. Talvez nem lembrava que ela podia fazer isso, e reconhecer essa ingenuidade do rapaz trouxe um calor gostoso para o seu peito.
Kaminari levou uma de suas mãos até o rosto dela, que suspirou surpresa.
"Eu sei que você está ouvindo" Denki disse ainda sorrindo, e ela teria ficado constrangida se não estivesse encantada por aquela expressão carinhosa.
"Não posso evitar."
"Eu sei." Ele se aproximou "Na verdade quero que saiba como me sinto."
"C-como assim?" Ela corou.
"Você me deixou saber como se sente. E agora eu deixei você saber como me sinto."
Jirou se desconsentrou, não estava mais entendo nada que saia da boca do rapaz e era tudo culpa daquele sorriso radiante.
"Não sei se entendi." Estava tímida, e aquilo era irritante.
"O que acontece quando dois personagens coadjuvantes interagem?"
"In-interagem? C-como?"
Ele sorriu ainda mais. Seus olhos expremidos depositaram uma sensação tão boa no coração dela, que aqueceu tudo por dentro.
Devagarinho, ele aproximava seu rosto, sem perder os olhos atrativos da moça de vista. E aquelas batidas pareciam mais fortes, misturando-se com as do coração dela. O cheiro delicioso de canela com chocolate invadia seus pulmões, deixando o momento mais doce e acolhedor, assim como aqueles lábios que cobriram os seus.
Ainda não sabia responder aquela pergunta e para ser honesta nem lembrava que ela um dia foi feita. A calmaria daquele beijo com cheiro de chocolate e canela era a única coisa que conseguia prestar atenção, e se permanecessem fora dos papéis principais de suas histórias ela não sabia se aquilo continuava sendo desagradável.
Pelo menos não enquanto a boca de Kaminari estivesse cobrindo a sua com carícias.
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Chocolate e canela
FanfictionEles sorriram ao mesmo tempo. O gesto foi brando, sem exagero e tão natural que quando perceberam já estavam sorrindo. Observando com calma a expressão no rosto um do outro. Buscando entender como era possível compartilhar pensamentos parecidos já q...