A ÚLTIMA LIMONADA DO ANO

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O termômetro marcava 71˚F, o que equivale a mais ou menos 21 graus Celsius.

21 graus no dia 31 de dezembro. À noite.

Assim que vi aquele 71 enorme e em neon do outro lado da rua, me toquei da sorte que eu tinha por poder sair naquela época do ano tranquilamente usando uma calça – ou até uma bermuda – e uma camiseta.

Conferi no meu celular como estava o tempo naquela mesma hora em Boston. Uma nuvem virtual na tela indicava que estava nublado e, logo abaixo, a informação do clima mostrava que além de nublado e com vento, a temperatura se encontrava abaixo de zero.

Eu iria trocar meus dias de sol e praia por neve e vinte camadas de casacos. Que ótimo.

Eu era bem indiferente àquela cidade até dois meses atrás, mas quando recebi a notícia de que Boston Boys iria passar a ser gravada lá, a indiferença se transformou em um ódio que só foi crescendo a cada dia que se passava. Engraçado que ninguém da equipe se consultou comigo antes de bater o martelo naquela decisão. Como se eu não tivesse nenhuma importância naquele programa de TV. Até parece.

Desde que descobrira aquela novidade, me forcei a caminhar por pelo menos vinte minutos por um canto da cidade todos os dias, para me lembrar de todos os seus detalhes. Claro, Los Angeles estava a anos-luz de ser perfeita. Era suja, perigosa, o trânsito era insuportável e tudo era muito caro, mas ainda era minha casa. Foi onde eu nasci e vivi durante 16 anos e de repente teria que dizer adeus, muito em breve.

Que ideia idiota. Mudar toda a equipe, todos os cenários e atores para o outro lado do país? Começar tudo do zero? Não podia dar certo.

Henry e Ryan não estavam tão revoltados com aquela situação, e eu não entendia o porquê. Na verdade, entendia um pouco. Os pais de Ryan trabalhavam de home office, ela em uma agência de publicidade e ele com programação, então ambos estavam livres para ir morar em Boston junto com o filho. Excelente, confetes e fogos de artifício para a família feliz. Já Henry não iria se mudar com pais, mas sua tia vivia lá, então ele também tinha seu teto garantido. Iria sobrar para mim ir morar naquela cidade fria e sem-graça, junto de três estranhas. Quer dizer, junto com a produtora do meu programa e mais duas estranhas. Ok, Suzie foi gentil em oferecer sua casa para mim, mas ainda assim aquilo era esquisito.

O clima no Grand Park era de festa. Os 12 acres da enorme área aberta que ficava entre a prefeitura da cidade e o Los Angeles Music Center estavam lotados de luzes coloridas, fogos de artifício, bandeiras dos Estados Unidos e pessoas de todas as idades. À minha volta ouvia gritos animados, pessoas cantando desde o hino nacional até YMCA, e, claro, a música eletrônica alta vindo lá da frente, do palco principal logo em frente à prefeitura. A alta torre do edifício servia de tela em branco para as projeções de luz coloridas que iam mudando de acordo com a batida da música. No centro dela, estava escrito o ano prestes a acabar verticalmente, que acendia e mudava de cor.

Eu adorava o Ano-Novo. Adorava aquela atmosfera festeira, ficar acordado até o amanhecer com os meus amigos, tentar entrar nas festas com bebida disfarçada em uma garrafa de refrigerante e com identidades falsas. Adorava Los Angeles. Era meu lar. Mas muito em breve não seria mais.

Senti meu celular vibrando no bolso da calça. Uma mensagem de Henry apareceu na tela, que dizia: "Cadê você?! Já queremos ir lá para a frente!".

Revirei os olhos. Se fosse qualquer outro ano eu já teria corrido para lá na velocidade da luz, para gritar junto com o apresentador de TV na prefeitura a contagem regressiva, me sujar todo de confete e beijar alguma garota bonita no meio da muvuca. Mas aquela festa só estava me lembrando que faltava pouco para eu dizer adeus a tudo aquilo.

A Última Limonada do AnoOnde histórias criam vida. Descubra agora