Capítulo 1

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Após horas naquela pequena sala recepcionando a todos os clientes do Dr. Carlos, Gabrielle se encontrava exausta e se perguntava se havia feito uma boa escolha de trabalho.
A quatro anos atrás essa tinha sido a salvação de sua vida. Como pagaria as contas sem um emprego? Após começar a faculdade de direito, tudo que a garota mais desejava era a independência de morar só. Achou um apartamento em conta, comprou alguns móveis com o dinheiro do antigo trabalho e se mudou com a intenção de viver uma aventura de adulto. Dois anos após se mudar percebeu que o dinheiro que recebia como vendedora já não era suficiente e que as contas começavam a apertar. Quando encontrou a vaga na clínica dentária do Dr. Carlos ela ligou no mesmo dia para contar a seus pais o quanto tinha ficado feliz.
Mesmo após se formar, Gabrielle não conseguiu emprego em sua área, e acabou ficando na clínica mais do que desejava.
Gabrielle pegou sua bolsa, despediu-se do doutor e foi tomar um suco antes de pegar os dois ônibus que pegava todo dia para voltar para casa.
Gabrielle andava se sentindo mais sufocada hoje do que todos os dias esse ano. O trabalho sugava quase todas as horas do seu dia e quando ela saia já não tinha ânimo para ir a qualquer outro lugar se não o seu querido apartamento.
Sentada no ônibus, com os fones no ouvido e o pensamento longe, a garota prestava atenção a todas as pessoas andando na rua vivendo suas vidas de forma tão alheia ao que estava ao seu redor. Até algo chamar sua atenção, uma garota de cabelos ruivos parada na esquina de um quarteirão qualquer encarando a janela do ônibus onde Gabrielle se encontrava.
"Não, de novo não!"- Pensou angustiada.
Fechou os olhos, respirou fundo e parou de olhar pela janela. Nesse momento uma senhora sentou do lado da moça que tirou os fones e ouviu a senhora tagarelar sobre seu sobrinho que daria um ótimo par com a garota. Gabrielle agradeceu por algo distraí-la.
Chegando em casa ela pensou em ligar para o antigo psiquiatra, encarou o telefone e chegou a conclusão que não precisava de mais remédios.
Desde muito cedo ela sofreu com a visão da garota de cabelos vermelhos, quantos hematomas, cicatrizes e ossos não foram quebrados durante suas brincadeiras interrompidas por visões da garota perto demais.
Gabrielle sentiu a cicatriz na barriga doer. Decidiu tomar um banho e tirar o cansaço do corpo através da água quente.
Após ligar o chuveiro, ela volta a se lembrar da ruiva e em como aquilo desencadeou tantos problemas, primeiro seus pais não acreditaram nela e a mandaram pro psiquiatra, que receitou vários medicamentos pra controlar os "delírios" da garota, o problema se estendeu a escola, onde Gabrielle não teve amigos por acharem que a garota era louca, no ensino médio nenhum garoto queria namorar a problemática. Só no primeiro ano da faculdade a garota teve seu primeiro relacionamento, que acabou não sendo como ela esperava, preferindo por fim se dedicar apenas a faculdade.
Faziam três anos que a garota havia deixado de tomar os remédios e visitar o psiquiatra, Gabrielle se sentia feliz por ter passado anos sem ter alucinações e ficado tanto tempo sem ver a ruiva, vê-la de novo fez com que desmoronasse no chuveiro.
"Será que eu realmente sou louca?" -A garota se perguntou e então se permitiu chorar pela frustração.
Ao sair do banheiro ela foi direto ao telefone ligar para os seus pais, ao terceiro toque sua mãe atendeu.
–Filha? Oi, está tudo bem?
–Oi mãe, está tudo bem sim, só estou com saudades de vocês, será que eu posso ir aí no fim de semana?
–Por favor venha, seu pai vai amar te ver. Também estamos com saudades.
Ao desligar o telefone o coração de Gabrielle já está mais leve. Em dois estará com os pais, isso a fará bem. A garota vai pra cama dormir com a alegria de só mais dois dias de trabalho.

Gabrielle acorda duas horas antes do despertador tocar, suspira e se levanta por saber que não irá conseguir dormir de novo. Ela caminha até o banheiro, lava o rosto e se encara olhando cada detalhe do rosto. Gabrielle sempre foi uma garota linda, com seus cabelos loiros e olhos azuis. Ela sempre soube que chamava a atenção dos rapazes, mas nunca se importou com isso. Olhando para seu reflexo, a garota nota algo se mexer ao fundo da sua imagem.
Seu corpo arrepia e ela fecha os olhos. Começa a pensar na torta de chocolate que sua mãe fazia todo feriado, e em como ela queria comer a torta, lembra do pai com o rosto todo lambuzado de chocolate e sorri com a lembrança. Ao abrir os olhos se vê sozinha no banheiro. Ela decide sair de casa, andar um pouco pelo bairro e talvez tomar um café quente em alguma lanchonete.
Após dizer bom dia ao porteiro, Gabrielle vai até a lanchonete onde é atendida muito bem pelo garoto de cabelos negros que sorri o tempo todo para ela. Seu café é servido com um bilhete escrito o número do rapaz.
Mas a garota sabe que ele deve ter no máximo 17 anos e nem imagine que ela vá fazer 24 anos em menos de um mês.
Ela levanta indo para o ponto de ônibus, sua rotina de trabalho irá começar de novo. Mais um dia cheio de pacientes, pedidos e broncas do Dr. Carlos.

Quando Dr. Carlos diz que o expediente acabou e que Gabrielle pode ir pra casa, a garota toma coragem de pedir.
–Dr. Carlos, eu posso tirar folga amanhã?
O homem pensa, olha para a moça e depois de alguns segundos ele finalmente dá a resposta.
–É, seria ótimo descansar mais um dia. Tem alguém marcado pra amanhã?
–Só a senhora Alice.
–De novo essa velha chata? Marca ela pra segunda. E segunda esteja aqui! –O homem diz com exigência.
Gabrielle quase dá pulos de alegria, mas se controla em apenas concordar e arrumar a sua bolsa.
No caminho pra casa ela só pensa em arrumar a mala e ligar avisando pra sua mãe que amanhã de manhã estará lá.
Ela chega animada juntando as roupas espalhadas pelo quarto e procurando a mala guardada em cima do guarda roupa, após fazer a sua mala, Gabrielle come um resto de lasanha que tinha na geladeira, toma um banho cantarolando de alegria e deita torcendo pra só abrir os olhos e sair do apartamento.

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⏰ Última atualização: Nov 17, 2018 ⏰

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