Inside 1 - Vanessa

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Essa é uma história sobre as melhores amigas que você vai conhecer na vida. Uma história que vai ser contada com todos os mais ínfimos detalhes, e eu vou ter o maior prazer em dissecar tudo. Sou a Nessa, e essa história é minha, e das minhas garotas.

(...)

6h da manhã

O alarme do meu celular toca incessantemente e eu me contorço toda para desligá-lo. Com os olhos grudados pela noite de sono, eu tenho bastante dificuldade de enxergar sem os meus óculos, mas mesmo assim consigo ver o nome no alarme e não consigo segurar um grunhido de insatisfação. O alarme diz "hora de acordar e correr", não sei onde eu estava com a cabeça de que deveria acordar esse horário, não preciso correr agora, já faço isso várias vezes durante a semana em busca de qualquer trabalho que seja.

Há alguns meses atrás eu ainda estava em relativa segurança no ambiente acadêmico, mas agora estou na selva da vida adulta e o que eu posso dizer é que estou apanhando bastante. Moro em um apartamento minúsculo, que divido com o Victor, - meu melhor amigo gay - e apesar de ser um lixo, vivemos com o aluguel atrasado - por culpa minha, eu admito -, é difícil manter as contas em dia quando tudo o que tenho é um diploma e respostas inteligentes nas pontas dos dedos e não na língua.

Sou péssima lidando com pessoas em situações superiores a minha, sempre fui, e esse é um dos motivos para ter largado a faculdade de direito, só em pensar que eu precisaria ficar de pé na frente de um juiz o meu coração começa a palpitar. Nos últimos anos a minha ansiedade social vem piorando, não consigo me comunicar muito bem com pessoas que eu não conheço, mas não tenho grana para ir a um médico, e me recuso a pedir dinheiro aos meus pais, não quero ouvir de novo que eu poderia ser bem sucedida se tentasse e parasse de agir como uma adolescente rebelde. Eles nunca me entenderam, nunca viram quem eu sou de verdade, sempre fui para eles a extensão do meu irmão perfeito, como se não aceitassem que eu poderia ser apenas eu. Uma garota cheia de defeitos. Mas não adianta reclamar, eu fiz minha cama e preciso deitar nela, e é exatamente por isso que vou ignorar o despertador e continuar dormindo.

Assim que recosto a cabeça no travesseiro a minha porta é escancarada.

– Nessa! Acorda! Para de ter alma de vaca gorda que só quer passar o tempo ruminando. Hora de levantar! – o Vic fala batendo palmas e eu gemo de frustração.

– Não quero! Não vou! – Resmungo escondendo a cabeça sob o travesseiro.

– Meu amor, o que é que eu te digo sempre? Nós podemos não ter grana mas ao menos somos bonitas e limpinhas. Não posso continuar dizendo isso se você não manter esse corpinho. Lembra como foi difícil perder todos aqueles quilinhos a mais? – pergunta.

– Cala a boca!

– Ah, a bonita vai fingir que não lembra de nada? Pois eu tenho todo um álbum da sua fase baranga e não tenho medo de usar!

– Vic! Me deixa em paz! – grunho. Sento na cama e jogo o travesseiro nele.

Não gosto de ser lembrada sobre minha luta com meu peso, é um assunto que já me rendeu muitos apelidos horríveis nos tempos de escola, e críticas suficientes da minha mãe pra ser preciso ter acompanhamento psicólogo por anos.

Nunca fui magra, ainda não sou, mas até o momento meu corpo está se mantendo em uma linha tênue entre ser "gostosa" e ser uma vaca peituda. Sim, tenho seios e bunda bem maiores do que gostaria, e isso é um saco. Aos 16 anos minha mãe falou que eu parecia uma atriz pornô só porque estava vestindo uma regata e um shortinho, – inclusive se ofereceu para me levar a um cirurgião plástico para fazer redução. – Lembro de correr para o meu quarto e vestir a primeira camiseta grande e folgada que encontrei, completando com uma calça de moletom. Desde então eu escondo minhas curvas sempre que posso.

One hourOnde histórias criam vida. Descubra agora