1/3: Jinyoung

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Essa história em três partes tem uma playlist disponível no perfil cajunmyeon no spotify

Clarice foi traduzida para o coreano provavelmente depois dos anos 2000, então essa edição de a hora da estrela é uma espécie de "liberdade poética" minha

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Jinyoung sempre fora o mais romântico e dramático dos três, fazendo metáforas confusas e acordando no meio da madrugada para observar as estrelas. Quem olhasse em seus olhos profundos por tempo suficiente para vislumbrar sua alma sensível, certamente sairia com os próprios banhados em lágrimas de pura consternação.

Uma das maiores preocupações de Jackson era o coraçãozinho de papel de seu amigo, que se rasgava apenas com palavras rudes e gestos ofensivos. Bambam dizia que Jinyoung era tão delicado quanto um dente-de-leão, que a menor das brisas poderia destruí-lo. Infelizmente para ele, Mark Tuan e Im Jaebum juntos formavam um furacão de categoria cinco. Jinyoung inevitavelmente saía machucado da menor das discussões.

Youngjae se retorcia em preocupações sobre aquele relacionamento atípico, opinando que Jinyoung não estava preparado para uma responsabilidade tão grande. Isso sempre ocasionava acaloradas discussões com Mark, Jaebum escondido com suas flores no quarto e um Jinyoung se desmanchando em lágrimas.

Os silêncios prolongados pesavam nas costas de Jinyoung. Seu peito doía de saudades dos tempos em que aqueles silêncios eram confortáveis e onde cada um podia aproveitar a companhia dos parceiros. Agora fechavam-se em seus mundinhos particulares, deixando as barreiras caírem apenas na madrugada, quando corpos se confundiam no escuro do quarto e mãos percorriam caminhos outrora inacessíveis. Bastava, porém, que o sol se levantasse para que a relação voltasse a ser fria, mesmo que o clima do lado de fora beirasse 40°C.

Ele havia perdido a conta de quantas vezes chorara nos ombros de um Youngjae impaciente, sendo consolado pelas mãos confiáveis e a voz macia de Jackson. Apesar da enorme quantidade de lencinhos de papel manchados e dos conselhos pacientes dos amigos, no fim do dia Jinyoung simplesmente não conseguia abandonar os dois homens.

Seu coração, rebelde como sempre fora, batia descompassado à mera visão de um Jaebum de cabelos molhados saindo do banho, toalha na cintura e um sorriso maroto em sua direção. Ele falhava várias batidas quando, no meio do dia, ganhava um abraço inesperado e cheio de carinho de Mark.

“Eles são como… o vento…” respondia aos inúmeros questionamentos de um Youngjae cada vez mais preocupado.

“Jinyoung, isso não faz o menor sentido, você sabe” o amigo retrucava, o rosto rubro de impaciência.

Mas ele não se importava. Dormia em travesseiros cheirando a flores, derramava lágrimas para as estrelas e sonhava acordado com um viajante do tempo que o levaria de volta ao passado, onde poderia consertar os estragos feitos em sua vida. Deixar Jaebum e Mark, no entanto, nunca seria uma opção.

Sua força de vontade não era tão firme ao cobrir os ouvidos para abafar a miscelânea de gritos que cortava a noite com cada vez maior frequência. Escondido no telhado com seu livro preferido e uma caneca fumegante de chá, Jinyoung forçava sorrisos plásticos e brincava de fazer de conta que os gritos e problemas e todas as lágrimas desperdiçadas aconteciam em outro lugar, bem longe de sua adorada casa.

“Tudo bem, está tudo bem” sussurrava o mantra agarrado à sua edição surrada de a hora da estrela. Em Clarice e Macabéa, buscava o conforto que não encontrava no peito trancado de Mark e nas flores mortas de Jaebum.

Devorava livros com a voracidade da criança faminta e solitária, procurando em outras vidas soluções para os embates domésticos frequentes. Por vezes preteria os companheiros em favor da vaidade charmosa de Dorian Gray, o amor fracassado de Werther, o romance malfadado entre Heathcliff e Catherine, entre outros volumes e vidas e histórias que disputavam lugar com as flores de Jaebum.

“O mel que escorre pelas paredes me mantém preso a essa casa, a eles” dizia com frequência, causando perplexidade em Yugyeom e puxando um suspiro esgotado dos pulmões impacientes de Youngjae.

Só o próprio Jinyoung sabia, no entanto, o quão difícil seria quebrar as correntes doces e saltar em direção ao futuro sem ilusões e com sabor de mostarda picante. O gosto enjoativo do mel mofado estava inevitavelmente preso a sua boca desde aquela manhã gelada de 1971, quando conhecera Jaebum, e se intensificou quando ambos adicionaram Mark a seu caldeirão de flores e livros e risadas, três anos depois.

Em uma madrugada de 1979, porém, olhando o céu carregado de nuvens brilhantes, Jinyoung pensou com lágrimas na garganta que aquele era o fim. O mel secou e grudou nas flores amassadas em suas mãos mornas. Jogou os livros preferidos na mochila pintada de estrelas e, com sensações esfuziantes no peito, saltou para o futuro amargo. Desta vez sozinho.

nausea 1979Onde histórias criam vida. Descubra agora