Parte II

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Segurei-me na janela, sentindo um tremor percorrer todo meu corpo, e me recusei a olhar para trás. Apenas continuei a ouvir todos os sons que meus ouvidos conseguiam captar na tentativa de perceber a aproximação de alguém. Mas era difícil ouvir qualquer som quando meu coração parecia estar batendo a mil por hora ao pé do meu ouvido.

O silêncio mais uma vez dominou o quarto, minhas mãos tremiam e o medo que sentia daquele homem estava quase me fazendo pular pela janela. Olhei para fora, mal conseguindo respirar, e realmente pensei em tal possibilidade. Afinal, na pior das hipóteses eu poderia quebrar minhas pernas e ser atacada por pelo menos um dos três cães raivosos que estavam soltos pelo quintal.

Chorei silenciosamente mais uma vez, não dando a mínima importância para as lágrimas que caíam sobre a camisola, e encarei a árvore logo à frente da janela. Ela era minha única chance, mas ainda sim eu correria um sério risco. O galho que avançava na direção da janela ainda estava a uma distância considerável e poderia não aguentar meu peso.

Estava considerando tudo isso quando ouvi a porta do banheiro, que estava entreaberta, se abrir completamente. Num relance olhei para trás e foi como se eu tivesse perdido completamente o controle sobre meu corpo. Por um momento fiquei zonza e achei que fosse desmaiar, mas permaneci petrificada no lugar, tremendo violentamente, sem quase respirar direito, não fazendo qualquer movimento a não ser desviar meus olhos para o chão ao topar com os olhos dele olhando em minha direção.

Racionalmente sei que foram apenas alguns segundos, mas o medo que senti fez com que a contagem de tempo não existisse em minha mente. Parecia que tanto tempo tinha se passado que tive medo de me olhar no espelho e de repente me ver com os cabelos brancos. Aqueles segundos foram os segundos mais eternos que vivi.

E então, quando achei que aquele seria meu fim, vi a movimentação do homem indo em direção à porta. Num relance o vi saindo. Ele ainda estava ali do outro lado da porta, pois ele estava segurando a maçaneta, e eu sabia que não demoraria muito e ele entraria novamente naquele quarto. Eu tinha só alguns segundos.

Virei-me na direção da janela de vidro e tentei abri-la. Ela estava trancada, como era de se esperar. E ter consciência daquilo quase me fez entrar em desespero.

"Pense!", ordenei a mim mesma, passando os olhos pelo quarto.

O que eu poderia fazer?

Olhei para a penteadeira e achei que se eu usasse a cadeira para quebrar o vidro talvez eu conseguisse escapar. Mas eu estava descalço. Corri em volta do quarto procurando o que calçar e encontrei um par de sapatos do outro lado da cama. Eles ficaram bem mais largos que meus pés, mas daria para o gasto. Ao passar perto da porta para ir em direção à penteadeira, fiz o máximo de silêncio possível, trancando até a respiração para que ele não me ouvisse e entrasse.

Meu coração estava a mil, mas eu tinha que me concentrar. Agarrei a cadeira e não pensei em nada. Coloquei todas as minhas forças naquela ação e a joguei contra o vidro. O barulho foi ensurdecedor e quando abri os olhos lembro-me de ter visto apenas duas coisas: A árvore bem à minha frente com as folhas sendo balançadas pelo vento, e o homem parado na porta, surpreso, olhando em minha direção.

No desespero me pendurei na janela e acabei cortando minhas mãos. Mas pouco me importei com aquilo. Só fui perceber que estava sangrando quando estava no chão, onde também senti minhas costelas doendo. Tinha pulado na direção do galho mais próximo e como eu previ, ele não aguentou meu peso. Só não foi pior porque um galho mais embaixo amorteceu minha queda.

Levei mais alguns segundos para me situar, e isso só aconteceu porque ouvi o homem berrando da janela, num idioma que eu não entendia. O que ouvi depois foi o som dos tais cães raivosos. Não sabia onde eles estavam e de onde viriam, mas levantei-me e corri na direção do portão. Ele era alto e por um momento duvidei que fosse conseguir escapar. Mas eu não podia desistir. Iria escalá-lo até à morte.

O pesadelo de AnneOnde histórias criam vida. Descubra agora