Foi um verão quente e úmido, quando os Rosenbergs foram eletrocutados, e eu não sabia o que estava fazendo na escola preparatória de Dover Prep. Eu sou uma estúpida em relação a execuções. A ideia de ser eletrocutada me deixava aflita, e era tudo o que se tinha para ler nos jornais — manchetes que chocavam, me encarando em cada esquina e em cada entrada das estações de metrô, bolorentas e invadidas pelo cheiro de amendoim. Não tinha nada haver comigo, mas eu não podia evitar de me perguntar como seria ser queimado vivo por toda a extensão de seus nervos.
Acredito que seja a pior coisa nesse mundo.
A Dover Prep já era ruim o suficiente. Pelas nove da manhã o falso frescor campestre, que de alguma forma, se infiltrava pela noite, se evaporava como o fim de um bom sonho. O cinza miragem no fundo dos seus cânios de granito, as ruas quentes cobertas pelo sol, o topo dos carros chiando e brilhando, e o pó seco e cinza empurrado em direção aos meus olhos e garganta.
Dover Prep é aquele colégio interno em, Coast City, nos Estados Unidos. Já devem ter ouvido falar dele, ou pelo menos visto nos anúncios. Eles fazem propaganda em mais de mil revistas, mostrando sempre um sujeito bacana, a cavalo, saltando uma cerca. Parece até que na Dover Prep, passávamos o tempo todo jogando pólo. Pois nunca vai um cavalo por lá, nem mesmo para amostra. E, em baixo do desenho do sujeito a cavalo, vem sempre escrito "Desde 1888 transformando jovens em adultos esplêndidos e atilados." Pura conversa fiada. Não transformam ninguém mais do que qualquer outra colégio. E não havia ninguém lá que fosse esplêndido e atilado. Talvez dois sujeitos, se tanto. E esses com certeza, já chegaram lá assim.
Esse preparatório — o Dover Prep — era somente para mulheres, e elas eram maioria garotas da minha idade com pais ricos que queriam ter certeza de que suas filhas viveriam num lugar onde homens não poderiam se aproximar e desonrá-las; e todas elas iria estudar em elegantes escolas como de Katy Gibbs, onde elas têm que vestir boinas e meias e luvas para assistir as aulas, ou já se graduaram de escolas do tipo Katy Gibbs e se tornaram secretárias de executivos e de pequenos executivos e circulavam por Nova York, esperando o casamento com um executivo ou outro.
Essas garotas me pareciam terrivelmente tediosas. Eu as vi no terraço, bocejando e pintando suas unhas e tentando manter seus bronzeados das Bermudas, todas parecendo um tanto tediosas. Eu cheguei a conversar com uma delas, e ela estava entediada com seu iate e entediada com seus vôos de avião e entediada com seu esqui pela Suíça durante o Natal e entediada com os homens no Brasil.
Acredito que um dos meus problemas era Doreen.
Eu nunca havia conhecido uma garota como Doreen antes. Doreen veio de uma sociedade acadêmica de garotas do sul e brilhantes cabelos prateados rodeando a sua cabeça como algodão doce, e seus olhos azuis pareciam bolas de ágata transparentes, duros e polidos, próximos de serem indestrutíveis, e na boca tinha um eterno sorriso sarcástico. Não digo que era algo sádico, era divertido e misteriosamente sarcástico, como se todos ao redor dela fossem grandes idiotas e que ela podia fazer algumas boas piadas sobre eles se ela quisesse.
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O sal da vida
RandomEleanor Maundrell é uma jovem doce e apaixonante, com um senso de humor adolescente autêntico. Após se mudar de cidade e após um acidente que os rumores desvirtaram como uma tentativa de suicídio, começa a ser notada por todos os alunos em sua escol...