Sangue novo, velhos hábitos

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28 de março de 2018, Seul.

    O sol escondera-se por trás do sicômoro abatido pelo inverno. Um dos garotos daquele grupo de seis decidiu que era hora de ir para a casa. Ninguém concordou. Pouco se fodiam com os novatos que chegariam para um novo semestre e fariam parte daquele time esquisito de roommates. Depois da saída dos chineses que se formaram no início da estação, o bando nunca mais foi o mesmo. Junmyeon ainda era apegado o suficiente para ligar bêbado no telefone de Kris e dizer o quanto sentia falta, entretanto, o restante concordava em ignorar.

    Todos eram burros o suficiente para não perceber a derrota.

    Apesar disso, Byun Baekhyun aprendera bons modos com sua família e lembrava-se com clareza de quando se juntara à fraternidade, principalmente de como se sentia tímido e deslocado pelo descaso dos meninos (e insultos de Minseok), então almejava agir diferente com os calouros; dar aquele "aconchego" fraternal caseiro. Talvez por isso estivesse tão puto, rodando as chaves do carro no indicador e ameaçando seriamente:

    — Eu tô indo embora, for real, e vocês vão ficar sem carona. — cedeu seu último aviso. Jongin tragou mais uma vez o objeto no qual filtrava a erva e deu de ombros, encarando o horizonte como se o motorista do Mustang 67 fosse invisível — Que educado. — ironizou.

    — Educado é meu pau, que-...

    Baekhyun suspirou derrotado e caminhou sozinho na direção do veículo, ponderando mentalmente como seria receptivo com os novos membros. Era péssimo em socializar com estranhos, muito por conta da ansiedade e a desconfiança que o assolava. Mesmo assim, contrário ao organismo inquieto, entrou no automóvel e retirou o moletom de símbolos químicos que trajava. Ondulou os ombros pra trás, respirou fundo. Sehun acenava feito um idiota com grama espalhada nos cabelos negros.

    E, assim, o conversível sumiu junto dos últimos raios solares.

    Suho quase se sentiu arrependido por não acompanhar o amigo. Quase.

   O trabalho do Oh era basicamente, em situações como essa, passar qualquer coisa que estivesse fumando para o mais velho e formular uma frase espontânea de consolo. Aquele era seu trote. Primeiro porque Oh Sehun tinha seus dezoito aninhos, nos quais a trupe acreditava serem regados a leite de peito, e segundo porque fora o membro mais recente a integrar a enorme casa onde viviam e esse era o protocolo.

    Kai teve como trote a responsabilidade de usar roupa feminina durante três meses. E era responsabilidade mesmo, pois Baekhyun estudava há décadas o movimento feminista e vinha de uma família só de mulheres, e Minseok julgou que a prenda não tinha intenção de ser caricata ou engraçada, mas acompanhar o quanto as mulheres sofriam com alguns adereços no cotidiano. Tornou-se tema do seminário de Kyungsoo, aliás, que estava no terceiro ano de Filosofia e apresentou aquilo no intuito de demonstrar o retrocesso masculino em relação aos padrões de beleza. Digno de um dez, o Do imaginou, mas contentava-se com o sete que recebeu bem na fuça.

    Voltando à função de Sehun:

    — Não fica assim, não, meu bom, porque a vida é um filme do Scorsese, ou seja, a gente já viu tudo e essa porra só fica pior.

    Sábio.



   O carango de 1967 atravessou o centro tumultuado da capital, pegou o sentido da marginal e logo fez seu dono avistar o amontoado de residências universitárias. A deles era a de paredes cinza, acabamento de madeira e latas de cerveja jogadas na calçada. Baekhyun estalou a língua no céu da boca e pontuou que acabaria com a raça de Jongin naquela noite. Antes de sair dali, ajeitou os fios de cabelo no espelho do retrovisor e cuidou para que seus olhos não estivessem muito vermelhos durante a apresentação. Falhou miseravelmente neste último.

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⏰ Última atualização: Jan 04, 2019 ⏰

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