O sino treme pela primeira vez e a igreja inteira parece querer ceder. Pedestres, cachorros e outras pessoas sensatas começam a correr para o lado oposto, aos berros, desesperadas. Continuo imóvel, não consigo parar de olhar. O sino bate mais uma vez, dessa vez ainda mais alto, e consigo ouvir o som do chão se rachando e abrindo entre meus pés. Equilibro-me e respiro fundo. Quase caio. Um homem de barba que segurava um pão francês passa por mim e quase me derruba quando o sino bate mais uma vez. Entre tantas coisas que poderia reparar, percebo que seu som é diferente. Suas badaladas causam barulhos diferentes do que geralmente fazem. Franzo o cenho. Preciso correr, mas não consigo! E é nesse exato momento que o sino badala mais uma vez, ainda mais alto, e desaba, soltando-se do restante da igreja azul clara. O sino imenso voa alto antes de vir na minha direção e me soterrar no asfalto.
Assustado, acordo. Escuto o sino e franzo o cenho. O que?
Droga. É só meu despertador.
Levanto-me da cama e cambaleio até a cômoda do outro lado do quarto - preciso fazer esse ritual desde que o meu pai tivera a brilhante ideia de colar com supercola meu despertador na cômoda do lado oposto à minha cama pra eu precisar levantar desliga-lo e assim evitar perder a hora.
Reviro os olhos.
Sei que deveria agradecer por estar vivo.
Mas estou cansado demais pra isso.
Termino de vestir o uniforme e desço as escadas até a cozinha. Pego uma maçã, enfio no bolso e saio de casa.
Ando até o ponto de ônibus e me sento para esperar. Está frio, o que pode justificar a ausência de pelo menos outros cinco alunos da mesma escola que eu que não estão ali.
Inspiro e balanço os pés. Um primeiro ônibus passa. Uma mulher loira sobe nele e segue seu rumo. Parece ter brigado com o namorado ontem, porque antes estava olhando fotos de um homem no Facebook e mandava áudios para uma amiga no WhatsApp dizendo que cansou de alguém.
Outro ônibus passa e olho a hora no meu celular. Meu ônibus está atrasado em cinco minutos. Tudo bem. Nesse ônibus de agora, entram três homens, calçando botas e um uniforme azul escuro. Um deles, calado, tem problemas na empresa, suponho. Os outros dois, tagarelas, queriam trabalhar em outro lugar, mas estão felizes por ter aquela oportunidade, suponho também.
Não sei sobre a vida de nenhuma dessas pessoas. Se quer sei o nome deles, mas gosto de imaginar o que se passa na vida de cada um deles e criar histórias com base no que vejo. Nunca julgo, nunca critico. Só crio as histórias e depois as esqueço.
Está vindo mais um ônibus. Não. Não é escolar. Nesse terceiro ônibus ninguém entra. Muito menos eu. Estou preocupado. Vou chegar atrasado e não vou conseguir entrar pra primeira aula. Matemática. E só Deus sabe o quanto eu preciso participar das aulas de matemática.
Se eu for correndo, posso chegar a quinze minutos. Se eu esperar o ônibus, corro o risco de nem mesmo chegar.
Então eu corro.
Corro entre as ruas agitadas do centro e passo por milhares de coisas que acontecem às 6h30 da manhã: um vendedor de pães, um mendigo arrumando seu cobertor e trapos para sair da frente de uma loja que logo iria abrir, outras pessoas correndo, copos de café, croissants, telefonemas justificando o atraso, e um aluno atrasado para a aula.
Estou sem fôlego, mas estou quase chegando. Não posso parar até ver a fachada do prédio da escola. Quase tropeço, mas me recupero. Vou chegar. Vou chegar.
VOCÊ ESTÁ LENDO
12 segundos
Teen FictionTobias é um jovem escritor que busca fama e reconhecimento enquanto trabalha em causas humanitárias e se mantém em sua zona de conforto, até que é avisado que Matthew Parker - personagem inspirado no cantor Shawn Mendes - virá ao Brasil. Agora, Tobi...