Meu nome é Valerie, esta é a minha história.
Quando entrei para USP com meus dezessete anos, nunca na vida tinha estado tão feliz, afinal eu tinha entrando para melhor faculdade de São Paulo no meu primeiro vestibular. Logo de início conheci minha melhor amiga, Karen. Lembro-me que sentamos no primeiro dia de aula uma ao lado da outra, e foi amor à primeira vista, nos demos bem logo de cara, até hoje nós sempre brincamos que se fossemos do sexo oposto seriamos alma gêmeas. Também na faculdade conheci o Bernardo, e começamos a namorar no último, eu cursava comércio exterior e ele engenharia. Nós dois estudávamos em campus diferentes, e éramos diferentes em tudo, mas o destino quis de certa forma nos unir.
Meus pais foram morar em São Paulo quando eu tinha apenas cinco anos de idade, minha família toda era do Sul do país, Bernardo, como ele mesmo diz, era paulistano da garoa, nascido e crescido em São Paulo.
Bernardo era a alegria das meninas da faculdade, sempre cercado por elas em todos os lugares, era um bad-boy. Seus cabelos lisos e pretos um pouco caídos nos ombros e olhos da cor mel, com um corpo escultural de um metro e oitenta chamavam a atenção de todas as garotas. Eu já não era tão popular assim, e acho que foi por isso que ele se apaixonou por mim. Minha melhor amiga era a popular, os rapazes sempre corriam ao redor, disputando sua atenção. Nós éramos diferentes fisicamente, mas muito parecidas interiormente, nunca tivemos uma briga sequer desde que nos conhecemos.Karen era baixa eu alta, ela era loira eu morena, mas tínhamos os olhos da mesma cor, verdes. Éramos companheiras em tudo, vivíamos de dieta e exercícios físicos para manter a forma, não era fácil, mas a gente sempre se apoiava uma na outra quando uma desistia ou dava um deslize. Lembro-me de que eu passei uma semana comendo só salada para poder entrar no vestido que eu queria usar no baile de formatura, porém na semana antes do baile, nós tínhamos acabado de sair do campus e estávamos passando em frente a uma confeitaria onde eu adorava o bolo de chocolate, parei na porta e dei um passo para entrar, Karen passou seu braço pelos meus ombros e me disse para pensar no lindo vestido justo que eu teria que entrar. Foi como jogar um balde de água fria sobre meu desejo pelo bolo. Virei e atravessei a rua na esperança que a distância me fizesse desistir, Karen ria sem parar. Mas, só para constar, eu entrei no vestido.
Ben, eu o chamava assim na maioria das vezes, namoramos por dois anos depois que nos formamos e casamos diante de todos os nossos amigos e familiares. Ben, sempre foi muito focado em sua carreira, mas tínhamos uma boa relação.
Estávamos casados há seis anos, ele nunca quis ter filhos, isso sempre exigia muita paciência da minha parte, eu queria ser mãe, mas ele sempre me dizia que não era o momento, que deveríamos esperar mais alguns anos, e eu sempre acabava cedendo. Há uns meses tudo mudou, nossa vida conjugal virou um inferno, discutimos diariamente e muitas vezes por motivos banais, o homem por quem me apaixonei desapareceu completamente e eu nem sabia como tudo tinha acontecido.— Não grite comigo Ben, não há necessidade de você estar assim tão nervoso, eu só perguntei por que você chegou tão tarde, só isso, não precisa ser agressivo.
- Você sempre está querendo me dizer o que fazer e como fazer, deixa-me em paz Valerie, cuide da sua vida, eu chego a hora que eu quiser, não sei por que, de um tempo para cá, você se tornou esta mulher pegajosa, não estou te aguentando mais.Disse ele esbravejando raiva.
Isso era mais um de seus momentos de fúria, era assim nos últimos meses, sempre que eu perguntava alguma coisa ou fazia algo que o irrita. Eu não conseguia entender o porquê desta mudança, mas comecei a desconfiar que ele pudesse estar me traindo, só podia ser, não existia outra explicação para o tipo de comportamento que ele estava tendo.
— Estou indo.
— OK.
Ben, ou melhor, "Ben bastardo", era assim que eu o chamava mentalmente agora, estava indo para mais um dos seus compromissos, atualmente todas as noites ele tinha um. No começo eu aceitava e até compreendia que fazia parte do trabalho dele, mas hoje, isso me incomodava, principalmente por pensar que ele pudesse estar me traindo, não tínhamos relações sexuais há mais de três meses, e antes que cessasse, ele apenas subia em cima de mim como se eu fosse uma boneca inflável, sem fazer questão do meu prazer, terminava rolava para o lado resmungando algo e dormia logo em seguida. Eu sofria com isso, sofria muito, até fiquei feliz quando ele parou de me procurar, era melhor do que passar pelo constrangimento de tê-lo enfiado entre as minhas pernas para logo em seguida ser tratada como nada.
As primeiras vezes que ele me tratou mal eu não dei muita importância, achei que ele estava cansado do trabalho e estressado pelo cargo novo que havia assumido, ele trabalhava em uma grande construtora e agora era responsável por todos os projetos no país.
Eu não compreendia como uma pessoa poderia mudar assim, tão rápido como tinha acontecido com ele. Tá, ele nunca foi um exemplo de homem romântico, porém nunca foi negligente comigo nem estúpido como vinha sendo nos últimos meses, isso estava me assustando, cada dia ele estava mais agressivo, intolerante e nervoso.Às vezes eu tinha vontade de dar um pé na bunda dele, mas sempre me lembrava de como ele foi um dia, dos anos que passamos namorando na faculdade, de como nos amávamos. Crises todos os casais passavam uma vez ou outra, durante o casamento, bastava que a gente conseguisse superar este momento ruim e tudo ficaria bem novamente, assim eu pensava que seria.
Ele tinha compromisso todas as noites da semana, reuniões, jantares com executivos, academia de ginástica, jogos de futebol, sempre chegava tarde da noite em casa, quando eu já estava dormindo, ou, como na maioria das vezes, fingindo que estava. Ele chegava tomava seu banho deitava e dormia logo em seguida, às vezes sem trocar uma única palavra comigo.
Nas últimas semanas eu me encontrava em total desespero, não conseguia dormir, sempre acordava de madrugada me levantava ia até o banheiro, sentava no piso frio com a porta fechada e chorava por horas até a exaustão me levar novamente para cama. Ou eu tirava meu pijama entrava debaixo do chuveiro com a água bem quente, ficava lá debaixo pensando e tentando entender o que estava acontecendo, o que estava se passando na cabeça dele, até meus dedos ficarem enrugados e eu ser obrigada a me arrastar novamente para cama.Eu havia amado Ben desde que nos conhecemos, na verdade eu sempre me perguntei por que ele me escolheu, eu não era popular, nem a menina mais bonita, nada disso. Ele era o bad-boy tinha meninas que se jogavam aos pés dele em todas as festas. Lembro-me de quando ficamos juntos a primeira vez, nós estávamos num churrasco na casa do Leo, paquera da Karen na época e amigo do Bernardo, muitas meninas estavam ao redor dele, mas assim que cheguei ele grudou em mim, não dando chance para nenhum outro garoto se aproximar, depois daquele dia não nos separamos mais. A verdade era que, eu caí de amor por ele e até pouco tempo atrás, eu ainda o amava, mas depois de todo este inferno que estávamos vivendo agora, eu já não tinha certeza dos meus sentimentos por ele. E quase sempre me perguntava se os sentimentos que existiam em mim eram fortes o suficiente? Ou se eu era forte o suficiente, para suportar mais de tudo aquilo? Será que o que eu sentia era amor ou apenas eu estava segurando a fina linha do comodismo em estar com alguém?
Arrasto-me fora dos meus pensamentos quando ele entra na cozinha.
— Bom dia, Ben?
— Bom dia, Valerie.— Você já está indo?
— Sim, porque tem algum problema eu estar saindo agora? Eu tenho um horário para cumprir.E isso era o tipo de diálogo que tínhamos pela manhã, ele pegava sua pasta com notebook e saia. Há mais ou menos dois anos e meio sofri um acidente de carro,onde quebrei minha perna, passei por duas cirurgias e várias seções de fisioterapia, "Ben bastardo" e eu, chegamos à conclusão que seria melhor eu ficar em casa até minha total recuperação, que levou oito meses,depois disso, Ben seguiu dizendo que eu não deveria voltar a trabalhar, que eu deveria ficar mais um tempo em casa, que ele gostava de chegar e me encontrar e eu cedi aos seus pedidos. Penso que isso contribuiu muito para a situação atual da nossa relação, o fato de eu não ser financeiramente independente, me fazia ser de certa forma, submissa a ele, e isso dava a ele controle sobre mim.
Quando tudo começou a desabar procurei fazer algo por mim, e também para não ficar louca. Formada e pós-graduada em comercio exterior, Karen me ajudou, me colocando como freelancer na empresa onde trabalha, e há dois meses venho trabalhando em casa, com contratos de exportação. Isso me envolveu de certa forma e fez com que eu não pirasse totalmente.