Parte 1

47 6 4
                                    

24 de Dezembro de 1989

Penélope estava sentada, girando sua cadeira do escritório, aguardando uma grande centrífuga, gerar suas amostras para uma nova pesquisa. Estava empenhada em desenvolver um DNA mutável, ao ponto de gerar um humano semi projetado. Não seria sua primeira nem sua última noite de véspera de natal passando na companhia de seu fiel companheiro de testes, o senhor Einstein, um pequeno camundongo de laboratório, que Hélio, seu colega de trabalho escolheu o nome.

Ela olhou para o pequeno bichinho, que comia um pedaço de cenoura, pensando na vida que ele tinha ali, tão preso e usado sem ao menos lhes permitirem escolher a vida que queria ter. Penélope sempre soube o que iria fazer, sempre soube que queria ser uma grande cientista, seguir os passos de grandes nomes e ganhar seu espaço em um meio tão competitivo e machista. E naquele momento, ela se sentia agradecida por ter tido a oportunidade de escolher.

Seu bipe tocou e ela o pegou lendo a mensagem enviada por sua amiga - que era também cientista, mas atuava em pesquisas para a área siderúrgica - lhe convidando para uma ceia em sua casa, próximo ao trabalho delas. Penélope respondeu rapidamente que não estava tão animada para comemorar, mas Rute insistiu e ela acabou por aceitar o convite. Afinal, não queria deixar a amiga chateada, e não seria tão ruim comer algo que não fosse congelado.

Assim que deixou tudo organizado para sair, pegou uma pilha de artigos e seguiu para o estacionamento, que estava vazio e seu Maverick era o único carro estacionado por ali. Ela se pôs a dirigir e atravessar quatro quarteirões até a casa de Rute, que estava iluminada por piscas-piscas, renas, guirlandas e um papai noel dançante. Fazia anos que ela não presenciava uma casa com decorações natalinas, e uma nostálgia a percorreu, lhe trazendo lembranças de quando era uma criança, e via sua falecida familia junta no natal, em volta da mesa de seus avós. Seu coração pareceu se aquecer com a lembrança. Fazia anos que tentava ao máximo evitar qualquer coisa que ligasse a sua familia, era doloroso demais.

Três batidas na porta foram suficientes para Peter atender, ja lhe oferecendo champanhe e uma espécie de torrada com caviar. Luxo era o que não podia faltar na casa deles, mas ainda sim Rute dispensava qualquer uso de mordomo ou garçons, ela mesma cuidava de tudo junto ao marido. Dizia que uma familia tinha de manter as coisas entre familia, dentro das tradições.

- Finalmente você chegou! - Rute a abraçou e lhe ofereceu mais champanhe, a acompanhando até a cozinha, onde a maioria das mulheres se encontrava, montado biscoitos e assando um enorme peru no forno. Rute começou a lhe contar sobre cada um dos familiares e amigos presente, a apresentando ao máximo de pessoas que conseguiu, principalmente aos homens solteiros. - Podia jurar que você daria um chá de sumiço, presa naquele laboratório.

- Com certeza, me sentiria mais confortável com a minha pesquisa. - ela disse sem pensar muito, o que acabou gerando um silêncio constrangedor no grupo a sua frente. - Mas o Champanhe está delicioso - com um sorriso constrangido, ela bebericou a bebida.

- Bom - Rute limpou a garganta e sorriu para as pessoas ao redor - Pelo menos não vai passar mais uma vez sozinha.

- Sim. - foi tudo que elas disseram uma para a outra, dando fim a pequena conversa.

Rute se retirou dando a desculpa de ir olhar o peru, enquanto Penélope ficou dando voltas pela casa, olhando porta retratos, um quadro enorme na parede e um vaso esquisito, mas que parecia muito caro. Um dos filhos pequenos de Rute parou ao seu lado, olhando o vaso, a criança parecia tão curiosa quanto ela, quantas vezes ele já quase não quebrou aquele vaso, brincando de bola dentro de casa? Penélope podia contar nos dedos as reclamações que ouvia de Rute.

- Meu pai disse que é Chinês - ele falou dando um passo para trás - Sabia que dizem que esse vaso realiza o desejo a quem por uma moeda de ouro dentro.

Um conto de amorOnde histórias criam vida. Descubra agora