Primeira Dimensão

362 35 8
                                    

“Na física e na matemática, a dimensão de um espaço matemático é informalmente definida como o número mínimo de coordenadas necessárias para especificar qualquer ponto dentro dela.” — Wikipédia.


Secretamente, gostava de classificar as pessoas. Sabia que era errado julgar um livro pela capa, porém, havia se tornado um mal-hábito.

Para Yoongi, existiam pessoas cometas e pessoas estrelas.

Os cometas passam, são apreciados por sua beleza e depois esquecidos. E só irão ser lembrados pelas datas em que retornam. Mas as estrelas não, elas permanecem brilhando mesmo depois de sua morte.

Há muita gente cometa. Gente que passa pela nossa vida apenas por instantes. Gente que não se prende ao presente, pensa no futuro e tenta alcançá-lo sempre que possível, e no fim, acaba por ser esquecido. Gente sem amigos, pouco brilho, que vive correndo.
E no fim, Yoongi se auto classificou como cometa.

Enquanto caminhava pela faculdade, tinha ainda mais certeza disso, não servia para atrair o olhar das pessoas. Era como sua face irritada fosse o modo de fugir dos olhares; temeroso. O Min gostava de ir embora para casa e ficar sozinho, assistindo um filme ou desenho qualquer, adorava desenhos, principalmente aquele do coelho que vivia brigando com o pato. Coelhos brigam com patos? Não sabia, mas imaginava que patos eram pacíficos demais, gansos que eram raivosos.

Anotação mental: Nunca se aproximar de um ganso.

Gostava também de olhar para as estrelas e pensar em bobagens, como, por exemplo: “Se fiz uma teoria da conspiração e esqueci dela, então significa que estava certa?”

Era um amante de universos e seus paradoxos.

Quando criança; adorava ler. Parecia que videogames e televisão não tivesse sido o suficiente para o garoto, mas livros eram. E em uma de suas aventuras literárias, encontrou o livro certo. Era um conto infantil chamado “Até que o universo nos encontre”, e mesmo tendo um enredo tanto pesado para uma criança de onze anos, para Yoongi era perfeito. No livro, explicava a origem dos olhos humanos e das almas gêmeas. Num mundo onde cada ser contém sua própria constelação no olhar, qual seria aquela que poderia lhe completar?

Talvez Yoongi fosse um cometa com sonhos demais. Tentando brilhar demais.

Era até confuso essa parte de almas gêmeas. Dizia um velho conto, o seguinte:

Quando você menos perceber, vai ter um alguém. Que vai apreciar cada brilho em seus olhos, amar a constelação que há em você, e no fim, colidir de modo a se tornar um só.

Yoongi era comum. Comum até demais. Talvez, entediantemente comum. Odiava falar sobre seu passado, tinha até ressentimento pelo mesmo. Entretanto, da mesma forma que teve seus medos, os escondeu. Trancado em um armário, enrolado e apertado por correntes que eram suas atuais memórias. Soterrado. Mas preso desse armário havia também sonhos, um deles era encontrar a continuação de sua constelação.

Atualmente, aos seus dezenove anos, havia acabado de completar o primeiro ano de sua faculdade. Não tinha amigos ou algo do tipo, às vezes se questionava se era por quase sempre andar com a mesma carranca. E agora, percebia como a falta os amigos faziam, e por conta desse erro, havia se tornado uma pessoa fechada e que sempre vivia com cara de bravo.

Sua sala decidiu fazer um encontro de natal, aproveitando a transferência de um professor, e honestamente, Yoongi apenas foi à festa pelo bolo de morango. Odiava confraternizações ou despedida. Na verdade, odiava mais despedidas do que qualquer coisa.

Yoongi sabia que a dor de uma despedida, era pior que qualquer outra coisa.

Ouvia os risos dos alunos, copos batendo em comemoração e gritos. Sua cabeça doía e mal havia bebido, talvez por conta da afobação dos outros. Precisa de ar. Levantou do sofá, sem que os outros percebessem — estavam ocupados demais rindo e conversando.
Em passos lentos, a mão firme à parede temendo que pudesse cair. Tentava andar rumo à porta, querendo ver as estrelas, faltava apenas chegar ao final do corredor, passando pela porta do banheiro. Ouviu um som, indicando que algo havia caído, próximo à porta do banheiro. Rapidamente, seus olhos desviaram a atenção para o objeto ao chão.

“Até que o universo nos encontre”

Reconheceria aquele livro em qualquer lugar; de porte pequeno e capa branca. A imagem das flores caindo ao chão, com uma bela cabana ao fundo parecia reviver suas lembranças.

Já havia o lido quando criança, era exatamente o mesmo livro da sua infância. Não hesitou em pegá-lo já que estava sozinho naquele corredor. Abriu na primeira página, encontrando um marca-página com um desenho de tartaruga.

As folhas amareladas, causadas pelo tempo pareciam tornar o enredo mais belo.

O livro contava uma triste história, onde um homem e uma mulher são destinados a ficar juntos, porém, o homem é cego e a mulher, cegamente apaixonada por outro. A mulher que parecia ter milhões de estrelas e sonhos presos em seus olhos, e o homem, nenhum.

Não havia constelação ou qualquer brilho nos olhos do homem.

No fim, o cego acaba por falecer antes de ficarem oficialmente juntos, morrendo junto das belas memórias que carregou brevemente com a moça. Tendo a certeza que batalhou pelo amor e felicidade da garota.

Adorava o livro. Achava ele tão bonito, se fechasse os olhos podia ouvir o som da brisa balançando, e assim fez; fechou os olhos por poucos segundos, revivendo as memórias do pequeno Yoongi lendo o livro, sentado numa enorme árvore com a brisa acariciando seu rosto.

Quando abriu seus olhos, estava lá.
O céu incrivelmente limpo como nunca esteve antes. Todo ao seu redor era um campo belo, igual do livro. Com várias flores, de todas as cores ou cheiros. Yoongi estava sentado, encostado no tronco de uma enorme árvore. Era grossa demais, grande demais. Como se fosse a maior árvore do mundo, ou quem sabe universo.

Cravos brancos que pareciam ser delicadamente desenhados e pintados. O céu num azul límpido, sem nenhuma nuvem ao redor. E preso à árvore, um vans azul.

Deixou que o livro caísse no chão junto do marca-página; horrorizado.

Como havia parado lá?

Conforme a árvore balançava, num ritmo calmo igual o som de um piano, Yoongi pode ver um garoto usando casaco cor azul, azul vans. Seus cabelos rosados gritavam um “olá”.

Você leu todos os capítulos publicados.

⏰ Última atualização: Jan 24, 2019 ⏰

Adicione esta história à sua Biblioteca e seja notificado quando novos capítulos chegarem!

underwater; kth + myg Onde histórias criam vida. Descubra agora