— Ele chegoooooooou!
Ainda eram seis e meia da manhã quando o grito alarmante e irritante de Pedrinho ecoou por toda fazenda, acordando a bela e doce Marina. O som do motor do veículo, ao longe emanando fumaça, indicava que o tão esperado rapaz estava chegando.
As galinhas ciscavam no galinheiro, assustadas provavelmente pelo grito insistente do muleque de onze anos. Tão pequeno e tão incoveniente.
– Ele tá chegandooooo !
– Para de gritar. Garoto dos infernos!
Emília puxara a orelha do garoto em tom de desaprovação, fazendo o garoto gritar ainda mais. Desta vez, de dor. Talvez ele tinha esquecido do quanto Dona Emília era severa. O carro enfim chegara em frente ao curral, descansando o motor, que trabalhara mais de cinco horas. De dentro, sai um elegante rapaz, no auge dos seus vinte anos, que exibira uma barba por fazer, acomodado em seu terno cinza.
- Oh Pedrinho, dava pra ouvir você lá da porteira, menino - diz Heitor, tirando suas malas do carro. Ele tira o chapéu ao ver Emília, em seu avental de cozinha rotineiro e simples. - Tia Emília, como vai a senhora?
- Muito bem meu sobrinho querido. Fez boa viagem? - indaga a senhora, estendendo a mão direita ao cavalheiro - Você continua sendo um lorde, Heitor. Pedrinho, faça algo de útil e retire as malas do carro de seu primo.
- Não é necessário Pedrinho. E Marina? Já acordou?
Marina sempre odiava acordar cedo. Ainda mais em pleno sábado de inverno. Uma moça de 23 anos, considerada a mais bela de toda a cidadezinha do interior do Rio de janeiro. Nunca gostara desse posto, onde todos a elogiavam sua beleza. Estava para se levantar de sua cama: coberta por lenços e panos bordados pela mãe, não fosse a simplicidade, diria ser aposentos dignos de uma princesa. Estava se arrumando quando Aninha adentra no quarto, com um copo de leite na mão.
– Já acordou?
- E dá pra não acordar com os gritos de Pedrinho? - diz Marina penteando os cabelos. Loiros. E curtos.
- Heitor acabou de chegar! - Aninha caminha pelo quarto, cabisbaixa, quando levanta a cabeça repentinamente. - Trouxe vários presentes da cidade grande! Nossa, Marina. Como você está deslumbrante!
- Ah. Para com isso. Trouxe o que pra você? - ela pegara um batom cor nude e começa a passar nos lábios.
- Eu ainda não vi. Mas pra você, ele trouxe uma caixa enorme! Cheia de livros!
- Heitor - ela rir, balançando a cabeça. Ela se levanta, ajeitando o laço de seu vestido longo estampado. - Ele nunca esquece a minha paixão por literatura. Vamos?
As duas saem do quarto em direção a sala, onde Heitor, Emília e o marido, Onofre estão conversando.
– E a situação no Rio de janeiro, como está? - indaga Emília, servindo um café ao hóspede.
- Washington Luiz. Com certeza irá assumir a presidência! - lamenta Heitor, tomando um gole de seu chá.
- Mas em Minas gerais, parece que houve barulho - retruca Onofre, um senhor de 70 anos, com sua bengala, da qual servia como apoio para andar.
- Aquela coisa de sempre, meu tio. Eles pressionam, depois aderem. Por exemplo, o prefeito de Minas, Mello Vianna, protestou, criou caso - ele faz um gesto de desdém - Ele foi convidado pra ser vice na chapa de Washington Luiz e aceitou! Coisas de política.
- Quero só ver o que as coisas melhoram para nós - diz Emília, com um ar de esperança e desapontamento.
Marina chega a sala, deixando Heitor estático ao ver a prima. Há mais de dez anos morando na cidade grande, onde fez faculdade de direito, o rapaz nunca deixou de sentir saudades da moça, a quem nutre, em segredo, uma imensa paixão. Desde a infância. Os dois se abraçam ternamente.
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A Sucessora
RomanceNo estado do Rio de Janeiro dos anos 20, a inocente Marina é uma jovem da decadente aristocracia rural fluminense. Criada na fazenda em um ambiente de simplicidade, Marina se apaixona por um galante hóspede de seus pais, o rico viúvo Fernando Stern...