Saímos do nosso refúgio com cautela. Claro que temos medo que algo ataque, mas não posso deixar de ir atrás deles. Estou com um péssimo pressentimento. Caminhamos em silêncio pelo corredor de falhas luzes amarelas, não demoramos muito para identificar a tal porta não descoberta da qual Ricardo havia falado. Ela está arrebentada e escura. O cheiro de morte estava tão forte quanto em todo o corredor. Entramos no lugar e logo nos demos conta que havia uma outra porta fechada com barras de madeira ali, mas que recentemente foi retirada. Certamente as barras faziam algum tipo de proteção para que a porta não abrisse. Ao aproximarmos e vermos que ela fora aberta, nos olhamos apreensivos.
Afinal, se estava tão bem fechada certamente não era a saída... Talvez houvessem mais daquelas criaturas ali e tudo pioraria ainda mais. Isabelle recua, mas percebo que Gustavo não estava disposto a isso, então abrimos a porta. Certo.
Um novo campo aberto. Não vejo criaturas como aquela por aqui, mas estou certa que não estão longe. O cheiro de morte revira nossos estômagos, fazendo Isabelle vomitar sua última refeição em um dos cantos. Ela sempre foi um pouco fresca demais, mas admito que até demorou demais para que ela vomitasse.
Gustavo ajuda a moça segurando seu cabelo e apenas fico vigiando os arredores. O medo de sermos atacados é constante. Eles definitivamente não são amigáveis.
Assim que a princesinha termina de vomitar seguimos andando pelos cantos. Certamente o sol vai terminar de se pôr em alguns minutos. O que será de nós sem abrigo e no total escuro? Eu não quero ficar aqui para descobrir. Tomo a frente e com passos cuidadosos caminhamos. Este campo é bem maior do que o outro onde estivemos e, nesta parte do hotel existem aparentemente dois apartamentos de dois andares. As duas portas estão abertas. Seguimos para a porta mais próxima.
Um quarto que teria sido luxuoso em algum dia, mas o cheiro pútrido estava tão entranhado que tudo ali parecia grudento e morto. Existia uma marca antiga de sangue enorme respingada na parede. Aproximo-me para olhar por trás da bancada da cozinha e o que eu encontro é assustador.
Existia ali os restos de alguém. Apenas os restos mesmo devida tamanha decomposição. Parecia estar morto a meses. Sua roupa suja parece ter sido comprada em uma das lojas de terno mais cara que conheço, mas o fim dessa pessoa não foi muito luxuoso. Ele tomou, ou se deu um tiro na cabeça, espalhando toda aquela sujeira para a parede logo atrás.
Faço sinal para que Isabelle não se aproximasse. Sei que a menina ia ficar mexida demais com o que estava prestes a ver. Ela abre a boca para reclamar, mas peço silencio. Não podemos arriscar sermos vistos ou ouvidos.
Subimos as escadas em busca de algo ou alguém. No quarto de cima, pude ver que as coisas que o tal sr. de terno fazia não eram simplesmente gastar dinheiro à toa. O quarto está intocado, cheio de tubos de ensaio em cima de uma das mesas, um notebook desligado e um papelzinho amarelo colado em um mural ao lado de infinitas fórmulas.
Em cima da outra mesa tinham muitos papeis com mais fórmulas químicas riscadas, o lixo do quarto não era diferente. Formulas e mais fórmulas riscadas e amassadas davam ao lugar um clima de desespero. Esse cara fez merda.
Gustavo não demora para colocar o notebook na tomada e ligar. Estava certa que teria senha, mas estou errada. O aparelho simplesmente liga. Vamos nós três até o local e uma pasta chamada relatório nos chama atenção. Ao abrirmos o arquivo percebemos um arquivo enorme do Word, mas o que realmente nos interessa devia estar no final.
Lá dizia:
15 de julho, 2018
Estou certo sobre os cálculos de meu soro.
Finalmente cheguei a uma partícula estável que é facilmente clonavel a qualquer indivíduo. Acredito que finalmente o mundo verá a partícula da vida eterna e eu finalizo meu trabalho em busca do Premio Nobel.
Termino de ler com um belo de um PUTAQUEPARIU sem som. Como alguém pode querer tanto mexer com a vida e a morte? Qualquer alteração nisso traria o maior caos a todos.
Gustavo pede para não mexermos nos tubos de ensaio e nas outras coisas, já que tudo pode estar infectado. Saímos do lugar com certa pressa, como se agora tudo fosse piorar.
O quarto ao lado é tão grande quanto esse, mas tem um cheiro esquisito, diferente. Ao entrarmos damos de cara com uma daquelas criaturas comendo alguma coisa no chão, de costas para nós. Gustavo toma a frente e pega um castiçal. Aproxima-se em total silêncio do que parece ter sido uma mulher e enfia com força o objeto em sua cabeça, que realmente o faz desligar.
Quando a criatura cai, nossos olhos se enchem de uma mistura de raiva, desespero e medo. Eu conheço aquela blusa branca, conheço os tênis de marca e a calça jeans.
Isabelle tremia com a mão tampando a boca para não gritar. Em um momento tentei me aproximar, mas Gustavo me impede. Seu olhar dizia que talvez fosse perigoso, mas puxo meu braço de sua mão. Algo me chamou atenção.
O corpo de Bento estava bem ali, aberto, comido, destroçado... Porém o que realmente me fez odiar com todas as forças foram as cordas que pareciam o amarrar em uma pilastra logo atrás. Ele foi preso para ser morto!
Subo as escadas furiosa. Não me importa sequer se os dois vem atrás de mim. Lá em cima existe uma porta antes do quarto. Estava fechada. Tento abrir pela maçaneta, mas parecia ter algo bloqueando a entrada. Tomo alguma distância e bato com meu corpo contra ela, abrindo-a. Dentro do quarto estava Ricardo com os olhos arregalados e claramente enrolado por estarmos ali.
– Você tem noção do que fez, seu babaca?! – Pergunto já enchendo a mão para acertá-lo. Não podia estar mais devastada.
Bento cresceu comigo. Mesmo anti-social como sempre foi era meu maior amigo. Ele me dava conselhos e era o único que aguentava me ouvir falando por horas a fio. Tinha a vida feita já tão jovem mas ao mesmo tempo um futuro brilhante pela frente. Meus olhos se enchem de água. Ele era como um irmão.
Ricardo segura minha mão com um olhar seco, frio...
– Era ele ou eu. – Sussurra em meu ouvido fazendo minha raiva aumentar ainda mais. Agora Isa e Gustavo chegam. Ele está virado no cão enquanto Isabelle o tenta segurar para que ele não matasse Ricardo na porrada.
O babaca finalmente solta minha mão ao ver que Isabelle também estava ali. Resolvo ir fechar a porta para ficarmos em segurança e deixar que Gustavo resolva o problema.
– Ele, diferente de você, era nosso amigo! Ele não merecia esse fim! Você tá ouvindo? – Gustavo grita na cara de Ricardo enquanto o segurava pelo colarinho.
– Ele tentou me deixar lá fora com as criaturas! Eu só me protegi!! Ele fez barulho de proposito, só podia estar louco! – Tentava se defender com argumentos claramente mentirosos.
– Você morreu pra mim, Ricardo. Quando a gente sair daqui eu mesma vou dar um jeito de te colocar onde você merece; atrás das grades. – Ao ouvir Isabelle, ele recua. A posição de enfrentamento se torna de vítima.
– Por favor! Acredita em mim.
– De novo? Igual quando você ficou com a irmã da Melissa e mentiu pra mim que não tinha ficado? Ou seria igual quando você bateu no meu ex-namorado só por ciúmes idiotas? Você é um babaca! – Finalmente a princesinha se irritou! Já estava mais do que na hora.
Gustavo não poderia perder a oportunidade e solta de uma vez Ricardo contra a parede, voltando-se para Isabelle imediatamente e a abraça contra seu peito de uma forma protetora e carinhosa.
Os olhos de Ricardo praticamente pegam fogo e ele vira-se de costas para não ver nada mais daquela cena que considerei linda. Gustavo passa a mão no rosto de Isa para enxugar suas lágrimas de tristeza e decepção enquanto sussurra ao seu ouvido algo que não pude ouvir, mas acredito que tenha sido algo como;
– Estou sempre aqui para você.
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O hotel
HorrorMeu nome é Melissa e foi assim que começamos algo terrível. #8 em Concluídos #734 em TheWalkingDead