Katherine
Era talvez o primeiro de muitos dias como aquele, em que a garota acordava com suas criadas lhe chamando pelo nome, os cabelos normalmente lhe acordavam emaranhados e elas tinham sempre um longo trabalho em transformar os fios desgastados em ondas perfeitamente localizadas que caíam suavemente pelas costas da ruiva. Sempre lhe acordavam com seu banho já pronto, esperando para que a garota apenas desfrutasse dos privilégios de ser Um. Diante de todos os privilégios também tinha seus deveres e obrigações, então afinal não era apenas colocar uma coroa na cabeça e se denominar princesa. A prova disso estava na sua agenda cheia, mantida ao lado da sua caneta de ponta fina que coordenava à Kate uma caligrafia perfeita; Sua lista lhe incluía cerca de dez itens que segundo seus cálculos mentais durariam o suficiente para que finalizasse suas obrigações até as oito horas da noite, horário em que o jantar costumava ser servido.
Diferentemente dos vestidos que lhe eram costurados sob medida, aquele lhe foi feito em tons que a deixavam mais apagada do que o costume, por pedido da própria princesa. Katherine imaginou que aquele seria um dia ruim para usar tons que lhe dessem mais luz e vibração. O vestido tinha um tom alaranjado pastel, caía-lhe até os pés deixando os sapatos de salto baixo brancos invisíveis sob ele, as mangas tinham o caimento de cigana na altura dos ombros e o decote era levemente angular, não o suficiente para exibir algo ali. Muitos babados compunham o corpo do vestido, sendo que davam um toque formal e simples para ela, uma fina camada de tule transparente finalizava em uma fina ondulação do início do corpete até o final da barra, carregando apenas alguns pequenos detalhes como estrelas bordadas à mão. Os cabelos foram apenas escovados e a coroa permanecia em sua cabeça como se nunca devesse sair dela.[•••]
Seu café da manhã consistiu em uma pequena xícara de café puro com dois cubos de açúcar, duas torradas com creme de avelã e uma maçã picada. Sequer havia conseguido trocar palavras com seus pais ou seus irmãos. Maureen estava ausente naquela manhã. Segundo alguns cochichos que havia trocado com Johan informou a mais velha de que Maureen não compareceria por conta dos últimos acontecimentos da semana, que incluíam o real motivo de terem programado uma reunião de última hora entre os líderes de cada província para discutir o que seria feito diante da atual situação, "ela está chateada" foi a única coisa que o irmão conseguiu dizer sem que ninguém ouvisse.
O próximo passo com certeza seria o mais difícil a se fazer. Katherine no fundo sabia da solução para aquele problema mas jamais proporia algo do tipo, muitos dos participantes do pequeno círculo de comando de todo o reino odiavam a ideia de que ela deveria comandar daquela vez e mesmo achando estranho o próprio irmão concordava com ela. A ruiva se levantou seguindo para a sala de reuniões dentro do palácio, uma sala parecida com um coliseu antigo, a diferença é que era em tamanho menor e principalmente: possuía apenas lugares suficientes para todos os membros que compunham o que chamavam de "A Pequena Elite". Diante da garota estava o trono do rei Louis e da Rainha Savannah, ambos já estavam em seus lugares e eram o dispostos o rei à esquerda e a rainha à direita, ao lado de cada um deles havia um local reservado para os dois filhos mais velhos da família real e ao lado deles encontravam-se outras quatro cadeiras de cada lado: uma para cada representante de província, também conhecidos como embaixadores ou os próprios prefeitos quando estavam dentro de suas localidades.
Katherine tomou seu lugar ao lado do pai, enquanto Johan sentava-se ao lado da mãe. Ao lado dela haviam outros quatro lugares totalmente ocupados, ela já conhecia os rostos de cada membro ali presente, também reconheceria de longe de onde haviam vindo. Ao seu lado estava o embaixador vindo de Wyebury, a província responsável por artigos de luxo no reino, diziam ser a província onde até mesmo os de casta oito eram esnobes. A próxima província era Alburth, responsável pela agricultura e pecuária, o estilo eclético dos moradores era presente no próprio embaixador e era com certeza a província mais calma de todo o reino, a simplicidade dos atos dele faziam com que Katherine se sentisse acolhida. Seawich era a próxima na sequência: responsável pela piscicultura e comércio marítimo, além de alguns estudos focados para a flora e fauna marinha e descobertas de novos vírus e remédios que poderiam salvar a nação a qualquer momento. Por último e não menos importante estava Hänilla, produziam todos os tecidos do reino a partir da caça de animais, sendo considerada a segunda província mais rebelde, perdendo apenas para Uhkins e era por esse motivo que ambas estavam em extremidades opostas naquela sala.
Ao lado do irmão e da mãe a princesa via inicialmente o embaixador de Moonstone. Ela não gostava muito do homem por ter um caráter deplorável, o motivo ela não sabe mas consegue sentir a tensão que se forma toda vez que ele chega pesar nos seus ombros, ao seu lado está Livydia, tecnologia e transporte são as principais funções dessa província. Para Katherine e para todo mundo era como se fosse o coração de Autumn Hill, nada funcionava sem ela, sendo a mais respeitada de todas as províncias. Seguia uma linha entre as duas últimas: Mars, sendo definida como produção de formas de energia sustentáveis, separada imediatamente de Seawich pelo grande conflito que ambas têm desde sempre. A última e mais agressiva era Uhkins. Fazia o que chamavam de trabalho pesado: madeira. Eram responsáveis por boa parte das construções do Reino pois toda a madeira vinha deles.
Dava para se dizer que era um grupo bem eclético, sendo três mulheres e cinco homens, eles formavam a "Pequena Elite" e decidiam o futuro do reino e de suas províncias baseando-se nas situações financeiras e próprias de cada local. Katherine apenas conseguia ver várias pessoas interessadas apenas no próprio umbigo e isso a intrigava. A primeira voz a se pronunciar foi a do rei, tão clara que ecoou por todo o local.─── Senhoras e senhores sejam bem-vindos a primeira reunião oficial para discutirmos assuntos voltados as províncias, mas principalmente uma solução que resulte em uma nova Seleção. Eu temia que algo do tipo fosse acontecer quando... bem, não importa. Quem gostaria de ser o primeiro a dizer algo? ─── A voz de Louis era marcada por um fundo de aflição que Katherine tinha certeza ser quase impossível de ser entendida, exceto se você fosse uma garota de dezoito anos que conviveu com o pai desde a hora em que saiu da barriga da sua mãe.
─── Deixe o garoto assumir. As críticas não podem ser suficientes para abalar a geração. Só querem a sua filha, com todo respeito majestade, por ser a garota dos olhos de todos apenas por ter herdado os genes da família. Mesmo quando disseram que você seria amaldiçoado por não ter o dote dos Romanov você também comandou. ─── O pronunciamento saiu da boca de uma das mulheres ali, se tratava da embaixadora de Hänilla. Uma mulher baixa e esguia, tinha cabelos esbranquiçados como a neve e utilizava de calças simples de cor preta, uma bota na cor branca e uma blusa de frio da mesma cor, os olhos eram cinzentos e revelavam a falta de afeto pela filha do seu rei.
─── Devo lembrá-la porém que Louis era o único na linha de sucessão, já que as outras filhas possuíam idades muitos inferiores a dele e ambas as duas garotas já haviam sido prometidas a príncipes de outros reinos, foi graças aos casamentos delas que nosso reino está se tornando tão bem conhecido. E elas também não eram ruivas. Se colocarem essa garota no trono isso poderá mostrar o empoderamento da jovem diante de ser uma mulher e ter que assumir sua responsabilidade logo tão nova. ─── As palavras vinham de uma mulher de mais idade, algumas mechas brancas se faziam presentes em meio a um emaranhado de fios negros como a noite e ela estava sentada no local indicado por uma plaquinha escrito "Livydia", os óculos lhe desciam sobre o nariz fino quase o tempo todo mas Katherine se sentiu confiante por ter alguém do seu lado.
─── Isso é inaceitável senhorita Loren. A garota tem apenas dezoito anos, sequer sabe como falar em público, quem dirá ter oito rapazes para conquistar seu coração. A última vez que tentaram colocar uma garota como prêmio de uma seleção ela demorou quase um ano apenas para escolher três dos oito e outro meio ano para escolher o noivo. ─── Todos ali voltaram sua atenção para o homem que tomava a frente daquela vez, se tratava do embaixador de Uhkins, os cabelos de cor castanho e as roupas de couro revelavam que ele era um dos poucos membros de casta alta dentro da província de Uhkins, seu nome talvez fosse Jason, ela não sabia e por isso preferia não perguntar. Apenas provaria que não possuía a capacidade que achava possuir.
─── Devo lembrar aos senhores de que estão tratando com sua princesa, me perdoe Jason, mas acredita que um rapaz de apenas um ano a mais poderá resolver essa questão? Eu não nasci com os dotes da minha linhagem e sei o que isso significa desde o momento em que reconheci todos os meus outros parentes nos álbuns de família. Minha irmã foi preparada a vida toda por esse momento. Todos sabíamos que seria inevitável. ─── Doía para Johan em dizer isso, mas era o melhor que ele podia fazer, afinal seu coração já batia por outra jovem moça. ─── Sem mais delongas, vamos para uma votação. Quem acha que Katherine deve se elevar à condição de princesa regente na linha de sucessão ao trono e protagonista da seleção?
Logo após suas palavras o rapaz levantou a mão até a altura da cabeça, olhando para todos ao redor de si, os próximos a levantarem as mãos foram os pais e por fim, as respectivas províncias de Wyebury, Hänilla, Alburth, Lyvidia, Moonstone e Seawich, deixando apenas Uhkins e Mars sobrando. Por fim o príncipe bateu as duas mãos em um sinal de desgaste e sorriu para todos ali presentes. Katherine sentia orgulho do jovem por ser tão maduro mesmo em seus dezenove anos, além de se sentir extremamente contente por finalmente ter seu papel sendo desenvolvido. Era verdade que ela havia sido criada para ser a princesa que assumiria o trono e por mais estranho que parecesse, a população de Autumn Hill aceitava aquela ideia como senso comum, o que a intrigava era servir de objeto apenas por possuir a cor ruiva na cabeça. Seu irmão havia sido descartado por isso e era por esse mesmo motivo que sempre descartariam outros membros da família real. ─── A reunião está encerrada. ─── Falou a jovem, antes de se levantar e dar as costas fazendo uma breve referencia antes disso. Ela precisava pensar.
VOCÊ ESTÁ LENDO
The Red Heiress
Short StoryDevastada pela própria coroa, não há soluções se não tornar o pesadelo ou o sonho da herdeira de Autumn Hill real. Katherine, uma jovem da realeza, nasceu apenas dez minutos antes da sua irmã e por isso foi levada à loucura com a grande responsabil...