Capítulo l

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Os restos da fogueira teimavam em crepitar naquela noite de lua nova, os ciganos já se encontravam recolhidos em suas tendas, envoltos em seus sonhos ou pesadelos. Pela manhã seguiriam viagem devendo chegar em Sevilha em dois dias: "Grandes negócios!" anunciavam os homens animados, as mulheres separavam suas saias coloridas, seus véus e chales para uma bela apresentação na praça: "Sempre ganhamos boas quantias em moedas".

Em sua tenda, Madalena tinha o sono atribulado. Estava isolada por ser "marimé"(impura).

Uma dor profunda rasgava o ventre de Madalena que despertou aos prantos enquanto as contrações aumentavam.

- Que há contigo, mi amor?- também Ramirez despertava assustado e da tenda montada ao lado ouvira o choro da esposa.

- Estou em dores de parto, nosso pequeno quer ver esse mundo.- respondeu ela com um gemido.

Por um breve momento o marido a fitou sem saber o que fazer, então acordou do transe e saiu a gritar por meio das tendas, desnudo:

- Santa Sara que nos proteja, Madalena quer dar a luz.

Os homens foram acordando e se juntando ao redor do que sobrara da fogueira, as mulheres mais velhas foram em socorro a Madalena advertindo ao marido que se calasse para não alertar os tsinivari, espíritos malignos.

Madalena foi amparada pelas mulheres e levada para um descampado um pouco distante do acampamento, os cabelos foram soltos, alguns nós de suas vestes foram desatados para não amarrar o parto, Dolores a incentivava a fazer força:

- Vamos mi querida, seu filho quer ver esse mundo!

As mulheres haviam improvisado uma cabana para o parto com lonas, dar a luz dentro de uma tenda cigana a tornava impura.

O grande pai, Osmir que era o mais velhos entre os gitanos, foi separando a farinha para preparar o pão das "três fadas".

Por algumas horas Madalena permaneceu em dores, os homens fumavam e bebiam ao redor da fogueira que fora reacesa, as crianças corriam e brincavam perto deles enquanto as mulheres faziam suas magias com danças e ervas para o bom nascimento.

Então ouviram um choro ao longe, as mulheres gritaram alegres, os homens cumprimentaram Ramirez, incentivando-o a "reconhecer" o filho.

Ramirez caminhou para a cabana, sorriu para Madalena e sussurrou:

- Estas bela, mi amor.

Dolores o apressou:

- Anda homem, deixa teus galanteios para después.

O bebê estava envolto em uma camisa do homem, deitado no chão, Ramirez aproximou-se dele e colocou uma fita vermelha em seu pescoço.

As mulheres aplaudiram e o aplauso chegou aos demais gitanos que permaneciam reunidos no acampamento, gritos foram ouvidos e até as crianças festejaram sem entender bem o motivo.

- Agora que o reconheceu, torna-te pai. - Dolores o parabenizou.

- Meu filho...- Ramirez estava emocionado.

- Tua filha.- corrigiu-o Madalena.

- Minha pequena, minha menina, carrega tua beleza mi amor.

Madalena recebeu a menina e a aconchegou, sussurrando em seus ouvidos um nome que apenas ela saberia qual é.

A pequena foi batizada duas semanas depois com o nome de Zaira: visitante florida, de pele brilhante e macia.

Todos os preceitos foram seguidos e Zaira cresceu encantando os pais e o povo.

Contava dois anos de vida quando o pai fez aliança para seu casamento com Miro, filho mais velho de um grande amigo.

Miro tinha cinco anos e passou a cuidar de sua noiva, havia aprendido com os pais que deveria zelar pela garotinha.

Os anos passaram e Zaira completara nove anos, acostumada aos cuidados de Miro, agora jovenzito com 12 anos.

E a partir daqui Miro narra sua história:

CONTO CIGANO Onde histórias criam vida. Descubra agora