Capítulo um.

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A pressão da gravidade forçava seu corpo contra o cinto de segurança. Sua respiração se fazia difícil. Arabelle que percebera que seu carro estava de ponta cabeça, com os olhos fechados tateou à sua volta a procura da trava de seu cinto, ao ser acionada fez com que Arabelle caísse e batesse a cabeça com força contra o teto do carro. Com um zumbido irritante em seu ouvido e atordoada, se arrastou para fora do carro pela janela do passageiro. Do lado de fora sentiu a terra húmida sob seu corpo, à sua volta apenas árvores e escuridão se faziam presentes, com exceção dos faróis de seu carro que revelavam os rastros do acidente. A cena era clara, o carro havia se descontrolado na estrada, seguido para a floresta e capotado até bater em uma árvore.
Arabelle sentindo uma dor quase insuportável em sua cabeça, lembrou-se que seu marido Rafael era quem conduzia o carro. Sentindo seu peito congelar em desespero, colocou-se de pé.

- RAFAEL, MEU AMOR! - Gritou correndo em direção ao carro. - POR FAVOR, ESTEJA BEM.

Ao se aproximar do lado do motorista, notou que a porta estava aberta e o banco vazio. Uma trilha de sangue seguia da porta para o fundo da floresta. As lágrimas escorreram quase que instantaneamente pelo seu rosto assustado.

-RAFAEL, RAFAEL! - Seus passos se transformaram e uma corrida. E lá estava ele...

Encostado em uma árvore grande. Seus olhos azuis estavam vazios e sem vida. Sua camiseta branca com estampa florida da viagem que fizeram para Salvador, agora estava vermelho sangue e com um buraco enorme em seu peito, onde lhe faltava o coração.
Arabelle desferiu um grito de espanto, que não produziu som algum. Tentou correr para procurar ajuda. Porém, seu pés pesavam toneladas. Um grito extremamente agudo aumentando de forma violenta pareceu sufoca-la seguido de um estrondo ensurdecedor.

Despertador tocou... Outro pesadelo. Estão ficando mais frequentes desde que Arabelle decidiu largar os remédios.
   Como num dia normal, sentou-se em sua cama. Seu olhar passeou pelo quarto e posou sobre o lado vago da cama de casal. Era mais um dia e o quarto denunciava que seu companheiro não retornaria. Tudo o que ela mais queria era vê-lo entrar pela porta do quarto com sua camisa do super homem, em sua performance que ele havia apelidado de "salvando o café da manhã". Onde ele entrava com Nutella, pão integral e suco de laranja. - "Sua janela estava aberta” - Ele sempre dizia engrossando a voz como nos filmes clichês de super-heróis. - ”Pensei em passar para alimentar sua barriga de jornalista". Arabelle levantou-se, seguiu em direção ao banheiro, lavou o rosto. Pegou sua cartela de antidepressivo e tirou dois comprimidos. Encarou seu reflexo no espelho imaginando que já não sorria a meses.
- Dane-se essa merda! - Exclamou pegando todos os comprimidos da cartela e jogando na privada.
Arabelle se aprontou e desceu as escadas para o primeiro andar. A casa toda parecia sem vida. Rafael sempre achou que morar em uma casa isolada ajudaria no trabalho de Arabelle como editora do jornal da cidade. Ela sempre dizia que a casa era grande demais para dois. Agora, sente que é pequena demais para suas crises. Seguiu sua rotina, café da manhã e uma passada rápida pelo jornal, apenas para ver seu nome na coluna de esportes. Na garagem, o carro parecia estar usando uma máscara, pois nada de marcas do acidente do ano passado. E assim seguiu  para outro dia de trabalho.

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