O PACTO

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REPOSTADO! 03/10 - 22:13H

Me avisem se ainda estiver com problemas

Alexandre

Eu nunca fui um bom perdedor, inclusive essa era uma piada interna na família, quando eu ainda no jardim de infância me deitava no chão fazendo birras homéricas, batendo minha cabeça porque alguém tinha tirado algum brinquedo de mim.

Ironicamente esses brinquedos tinham sido abandonados por mim mesmo, mas bastava alguém querê-los para que eu armasse um barraco.

O que eu posso dizer? Sempre fui um garoto mimado, meu pai me chamava de reizinho e como eu era danado de lindinho, estava acostumado a ter mais de cem costureiras da primeira fábrica da Piazza me paparicando, como eu não seria assim?

Quando meu irmão nasceu, meus pais acharam que iam enlouquecer comigo. Até xixi na cama eu fiz só para ter o prazer de acordar minha mãe e fazê-la me levar pelas orelhas debaixo do chuveiro. Eu ria à beça.

Com o tempo esse ciúmes passou e eu assumi orgulhosamente o posto de irmão mais velho, ensinando tudo ao pirralho: andar de skate, arrotar o alfabeto (meu pai ficou uma semana sem falar comigo, o velho não tem senso de humor), se vestir diferente do que minha mãe queria (que era como se fôssemos para a primeira comunhão), azarar gatinhas, se aliviar vendo mulher pelada na revista, depois na internet.

Então ele cresceu, e desenvolveu uma filosofia diferente da minha e nós nos afastamos. Enquanto eu era ligado em quantidade de mulher, o Guto era todo qualidade, e como a vida é safada irônica ele levou uma rasteira de uma mulher cretina enquanto eu nunca tive meu coração balançado. Como dizem os americanos: I’m good baby, ou para ser mais claro, tô de boa dessa merda de amor.

Até a Fernanda aparecer. Quando há uns meses atrás o Guto me surpreendeu com a notícia que estava com alguém, sei lá, esperava talvez uma doidinha da área de estilismo e moda, ou alguma vegetariana que protesta sem blusa na rua, alguém com o jeito alternativo do meu irmão.

Imagine minha surpresa quando a conheci: inteligente e interessante, porém imaculada, sem aquela sombra que cobre as pessoas ocupadas e sofisticadas do mundo que eu frequento.

Toda vez que lembro a primeira vez que a vi, dou risada sozinho, ela tentando defender o Guto porque eu o chamei de viadinho quando ele comentou que adorava o cheiro de cappuccino.

Depois a cada encontro, eu fui ficando mais e mais envolvido a ponto de sonhar acordado com a possibilidade de finalmente me acomodar e namorar em casa, igual gente direita. Eu, o velho cínico e conquistador inveterado de trinta e quatro anos.

Tudo isso para quê? Para levar um fora por SMS, como seu eu fosse a porra de um garoto do Ensino Médio. Nem fodendo que eu aceito isso! Não engoli aquele amor todo que os dois dizem sentir, agora é questão de honra ser o vencedor, eu mereço isso, sou dez anos mais velho, então teoricamente tenho que me acomodar primeiro. Não era assim que faziam na Inglaterra no século XIX?

Com esses pensamentos nada fraternais e generosos, me levanto às cinco da manhã como é de costume e sigo para a academia. Puxar ferro me faz bem, minhas melhores ideias vem à cabeça quando estou na minha academia.

Depois tomo banho e ligo para a Bueno, já que vamos juntos para o Rio de Janeiro, podemos ir com o mesmo táxi para o aeroporto onde aluguei um avião para nos levar. Como sempre ela está pronta.

Nunca a pego desprevenida ou despenteada, o que me enfurece, devo confessar. A Mônica é o tipo de mulher que faz os homens como eu, sentirem-se irrelevantes, a mulher nunca precisa de você para nada.

Nestes seis anos que trabalhamos juntos nunca a vi sequer pegar uma gripe. O que é muito bom em um funcionário, mas me pergunto porque não sei nada de sua vida pessoal. Tudo o que eu sei cabe em uma cabeça de alfinete: que ela é de Goiânia, que a mãe morreu e que não tem contato com o pai, ah e é claro, eu sei que ela arrasta um bonde pelo meu irmão mais novo.

Não que ela tenha me contado, isso jamais sairia da boca dela, mas não se atinge a posição profissional que eu tenho sendo um mau observador. É até meio patético, ver aquela mulher linda, sensual, piscar os olhos e sorrir como uma idiota cada vez que ele diz alguma coisa. Não sei como meus pais e o próprio Guto nunca sacaram.

O táxi chega ao prédio da Bueno e como não poderia ser diferente, ela está em pé na portaria, elegante com um conjunto de calça e blazer branco, carregando sua valise de grife, em cima de saltos altíssimos.

Ela entra no carro e no lugar de bom dia, ela me diz:

-Você está três minutos atrasado.

-O trânsito está ruim e eu tive que ligar para meu irmão antes, avisar que ficarei fora. – Como sempre acontece quando ela ouve falar no Santo Augusto, ela fica rígida e uma leve dor passa por seus olhos. Se eu estou puto com esse namoro, imagina ela.

-Ah é? E onde ele estava? – tive que rir da falta de domínio da megera quando o assunto é seu amor “secreto”. Resolvo cutucar a ferida com sal:

-Em casa, pela voz tinha acabado de se lambuzar em alguma festa da boceta.

Ela me surpreendeu fazendo algo que nem em mil anos eu poderia imaginar: chorou. Eu como o bom filho da puta que sou, apenas olhei para o motorista do táxi pelo retrovisor e fingi que não acontecia nada.

Logo ela dominou os sentimentos, enxugou a aguaceira que caía dos olhos bonitos e retocou a maquiagem, tudo isso sem trocar uma palavra comigo, assim quando chegamos ao hangar onde a aeronave estava a nossa espera, ela já era dona de si mesma, com a cabeça alta e o semblante altivo.

Entramos no avião, sentamos lado a lado e afivelamos o cinto. Ela resolve quebrar o silêncio sepulcral que se instalou desde seu destempero:

-Não vai me perguntar por que eu chorei?

-Um coelho entraria na jaula do leão perguntar por que ele está de mau humor?

-Você é um otário mesmo.

-Um otário que te paga um salário de cinco dígitos, me respeite!

-Que aliás é pouco diante do que eu faço pela sua empresa.

-A porta da rua é serventia da casa, Bueno.

-Talvez eu me sirva então.

Percebi que era hora de parar com o desafio verbal, a Mônica era indispensável para mim, meu braço direito. Assim tentei ser solidário:

-Você estava chorando por dor de cotovelo, porque o Augusto se ajeitou com uma mulher e ela não é você.

Vejo que ela me olha com espanto, enquanto o avião está taxiando na pista.

-Achou que eu não sabia?

-Achei que ninguém sabia.

-Eu não sou todo mundo e não contarei a ninguém.

-Você gosta dela também, não é? Da pirralha caipira?

-Não... – Mas eu sei que ela percebe a mentira.

-Quer separá-los?

Olho impressionado para ela, tentando entender se o que ela disse e o que eu escutei são a mesma coisa. Ela repete:

-Você e eu, vamos separá-los?

Meu lado competitivo, destruidor e dominador falou mais alto que meu bom senso e amor pelo meu irmão:

-Estou ouvindo.

Ela sorri satisfeita, e confesso que isso me assusta, não sei porque, mas fiquei com a sensação que fui enganado. Igual a João e Maria quando atraídos pela bruxa para dentro da casa feita de doces.

 Que tal?

Essa Vingança Que me Faz DelirarOnde histórias criam vida. Descubra agora