First Love

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A lua alta e brilhante encantava a escuridão noturna. Como sempre, aquela determinada hora, April se encontrava no mesmo lugar. Todos os dias, a jovem se sentava ao telhado da mansão Hellsing e cantava, perdida em lembranças, uma antiga e triste canção. Seu rosto pálido e imóvel refletia a tristeza de maneira sutil. As palavras que pronunciava não seriam compreendidas por ninguém daquele tempo e país, mas o homem à espreita entendia perfeitamente. April sentiu a vontade de se entregar para a tristeza vindo e pausou a cantoria para ter forças de lutar contra aquela vontade irracional. Alucard observava a cena sem que a jovem o percebesse. Há algumas noites, o homem notou aquele estranho comportamento da draculina e passou a observá-la. Ele surgiu em meio as sombras de onde espiava, sentando-se, em seguida, ao lado desta, o que apenas proporcionou ainda mais inquietude da parte da jovem.

– Por que, todas as noites, canta a mesma canção triste? – Alucard perguntou naturalmente, esquecendo-se do sarcasmo e da maldade.

– Tenho meus motivos... – contornou a jovem.

– Não é muito explicativo.

– Anda me espionando? – a draculina sorriu de canto, maliciosa.

– Faz algum tempo que notei esse seu estranho hábito. – Alucard olhou para a jovem, visualizando uma tristeza incomum vindo de seu olhar. – O que a trás tanta infelicidade para manter esse ritual?

– Algo que eu perdi há muitos séculos... e que talvez eu nunca mais o consiga de novo. – a jovem fechou os olhos com pesar e tentou manter a postura inabalável de um vampiro. – O que houve, Alucard? Está estranho com essa tonalidade natural, sem o sarcasmo e a malícia costumeira.

– Estou curioso... Principalmente com a estranha sensação de que conheço muito bem a canção romenica que canta.

April surpreendeu-se e voltou a entristecer-se, deslocando seu olhar do rosto do homem. Os olhos dourados lutavam para vencer as lágrimas e manter a expressão de indiferença. Ela estava um pouco cansada da situação. Suspirando, a jovem aceitou revelar, em partes, um pouco da verdade.

– Era uma música que eu sempre cantava quando ainda era humana. Digamos que ela me faz não esquecer minhas origens e impede que eu me esqueça do passado. Ela me trás, principalmente, a lembrança de uma dolorosa despedida.

– Seu marido? Namorado? Amante?

– Meu mestre... – ela quase sussurrou.

Alucard sentiu a cabeça levemente latejar e isso o intrigou. Talvez fosse curiosidade?

– Trabalhou para um lorde, então...

– Sim. Um homem místico que me salvou. Eu me voluntariei para servi-lo como forma de pagamento e gratidão. Fora difícil convencê-lo. – o homem sentiu novamente a cabeça latejar e desta vez mais forte e intensa. Era como se conhecesse aquela história. Ele pressionou as têmporas com uma das mãos e continuou atento com a estória. – Eu me apaixonei por este homem, mas era impossível investir naquele amor. Nós éramos diferentes em muitos aspectos e nunca teria coragem de dizer-lhe a verdade.

– Arrepende-se?

– Hoje, sim... mas não seria certo ter feito o contrário.

– Então, você está de luto por que o homem de quem gostava nunca lhe notou e morreu sem saber? – Alucard se segurou para não rir. – Devia ser um homem inesquecível para eu presenciar seu momento de fraqueza.

– Ele ainda continua sendo. – surpreendido, o vampiro calou-se. – Ele pode ter morrido, naquele dia, mas ainda continua vivo.

A dor de cabeça do homem aumentara, trazendo desconforto e irritação para o mesmo. April se voltou para ele e viu o incômodo que este sofria, preocupando-se à sua maneira fria.

– Está tudo bem?

– Não é nada... – garantiu. – Então, se ele é um vampiro, por que não foi atrás dele?

– Mas eu fui... – April o encarou seriamente. – E permaneço ao lado ele. – Alucard a encarou intrigado com tal afirmação e isso não pareceu surpreendê-la. Ela simplesmente desviou o olhar, entristecida. – Você, realmente, não se lembra de mim...

– Você é minha draculina?

– Você já era vampiro quando me salvou. – esclareceu a jovem. – Você não me transformou em primeiro momento e mesmo sabendo o que era, eu queria mostrar minha gratidão. Foi então que, quando Van Hellsing estava a sua procura, eu contei-lhe o que sentia e que você precisava fugir. – a jovem tocou os lábios inconscientemente. – Nosso beijo teve gosto de tabaco... – houve um silêncio intenso entre eles e após um tempo, a jovem se levantou. – Eu me sacrifiquei para não vê-lo morrer e você me deu esta vida. Juro que foi doloroso enxergar com meus próprios olhos sua amnésia. Ver que, realmente, havia esquecido tudo sobre mim e desde então venho aqui, na mesma hora em que despertei como draculina, e canto esta canção. Às vezes, eu ainda choro. Eu não quero me esquecer de nada... Nem um momento sequer... – April deu um sorriso forçado e criou coragem para terminar o que começara. – Eu não me importo com o que fará. Mesmo que zombe de mim de agora em diante... Eu fingirei que nunca lhe contei nada... Às vezes, eu fico aqui pensando no que se passa na sua cabeça... – suspirou a jovem, cansada. – Você sempre será meu único e primeiro amor. Aquele que me ensinou esse sentimento. Ah... isso soou muito idiota.

A jovem foi se afastando, no intuito de ir para o mais longe possível, porém fora surpreendida pelo abraço do homem e as presas do mesmo a perfurando no pescoço. A jovem gemeu entre dor e prazer, enquanto o vampiro drenava seu sangue.

– Alucard...

– Isso é interessante. – ele sorriu maldosamente. – Achei que fosse brincadeira da sua parte, mas seu sangue confirma sua confissão.

– Eu não estava mentindo...

– É... minha cabeça está doendo como prova. – Alucard tomou os lábios da jovem com urgência, percebendo que tanto seu próprio corpo quanto da jovem necessitavam, há séculos, desse contado. Um beijo intenso com sabor de sangue. – E no fim, é o gosto do seu sangue que sempre esteve em minha mente.

– O que? – April desnorteou-se por um momento e o olhou confusa.

– Seu sangue é doce... e carregado de sentimentos. Não importa o quão bom seja, ele só me trás essa sensação de culpa que sinto agora. Com certeza, não é um simples amnésia que teria o poder de tirar o sabor inesquecível do seu sangue da minha cabeça.

– Você está sendo o idiota, agora... – ela sorriu vitoriosa.

– Não tanto quanto você... – a jovem o abraçou brevemente e rapidamente se afastou.

– Talvez a humanidade ainda não deixou este corpo. Perdoe-me pelo contato e por meu comportamento.

– Se estivesse ruim, eu até falaria algo a respeito. – a jovem sorriu inocentemente.

– Certo, certo. Hora de colocarmos um fim nisso.

– Não sou muito bom em deixar algo inacabável de lado.

– Sei muito bem.

O tempo pareceu correr novamente. Após séculos perdida e presa em lembranças, April pode ver que agora estava livre de seus tormentos e que poderia, enfim, seguir sem ressentimentos o caminho que escolhera. Com uma nova canção para sua vida. 

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