A Repartição para a qual eu trabalhava chama-se Arquivo e Memória de Santa Catarina, ou, para os íntimos: AMESC. Comecei no setor de protocolo, e depois, pedi transferência para a Supervisão Avançada de Documentos. No protocolo era muito agitado, mas você não aprendia nada de novo. Exceto para onde os documentos deveriam ser enviados. Nesse sentido, eu já tinha aprendido tudo o que era possível. Não dava para ir além da repetição. Assim, sentindo que poderia contribuir mais, apresentei-me à supervisora geral, Juliana Azevedo, e lhe entreguei a minha solicitação para compor a equipe do Setor de Documentação Avançada, ou SEDAV.
O SEDAV parecia ser mais desafiador, com responsabilidades dinâmicas. Além do mais, todo mundo que eu conhecia costumava dizer que aquele setor era a elite da elite, em termos de documentação pública.
Na minha santa ingenuidade, eu não percebi que as coisas não se resolviam daquela maneira. Para um funcionário ir de um ponto A para um ponto B, ele precisava de um padrinho político. De preferência, um deputado. Se fosse um chefe graúdo dentro da própria Repartição, já seria de grande ajuda.
A supervisora, naturalmente, agiu conforme a importância da criatura sentada a sua frente. Ou seja, eu era uma "Zé-Ninguém" e fui tratada como uma "Zé-Ninguém". Se eu tinha experiência com a documentação do referido setor, se era competente, educada, instruída, leal, e prestativa... Nada disso importava, já que eu não tinha nada que lhe conviesse. Algo que servisse de moeda de troca, por assim dizer. Afinal, em nossa sociedade brasileira, tudo é movido na base da barganha.
O serviço público não era diferente.
Como a maioria dos chefes das repartições públicas, a supervisora geral estava envolvida com política. Por isso, ela não me disse diretamente um "não". Pessoas metidas com política nunca dizem "não" pra alguém. Elas enrolam... Deixam os subalternos encarregados do trabalho sujo, para não queimar o próprio filme. Assim, ao invés de me dizer "não", ela me disse que se algum de chefes setoriais me quisesse em sua equipe, eu poderia ir. Era uma decisão do chefe setorial.
Esse foi um verdadeiro "não" político.
Mas, sendo eu, uma ingênua em relação à política, tomei o contexto apresentado literalmente. Na época, achava que se alguém quisesse dizer "não", simplesmente diria "não". Fim de papo!
A resposta dela pareceu um "não"?
A mim pareceu um "talvez". Ou seja, que eu deveria me apresentar aos chefes setoriais e ver se algum deles me aceitaria em sua equipe.
Se tivesse acontecido nos dias de hoje, eu teria sacado que a longa explicação da supervisora foi a sua maneira política de me dizer um "não", porque se ela realmente quisesse me ajudar, teria chamado um dos chefes setoriais na hora e dito que eu estava me apresentando para trabalhar. Eles avaliariam o meu currículo, juntos, e fariam uma experiência comigo. Ou me diriam "não", na mesma hora. Simples, assim.
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Lua de Fogo 2 | AMAZON COMPLETO
RomanceDEGUSTAÇÃO Almas gêmeas existem? Essa pergunta encabeça diversas discussões metafísicas. Parece haver o consenso de que, quando duas pessoas estão destinadas a se encontrar, não existe tempo, distância, religião, ou quaisquer diferenças sociais qu...