"Até hoje ninguém nunca morreu de amor", Natália ouviu essa frase todos os dias de pessoas diferentes desde novembro.
Já eram cinco meses completos sem ela.
Os primeiros três dias foram intensos, amargos e viscerais.
Ela sentiu cada uma das moléculas do seu corpo inteiro berrar em agonia. As carnes pedindo para serem arrancadas dos ossos pelas suas próprias mãos. Os seus olhos se afogando em água salgada sem poder pedir socorro. O peito mais profundo que última camada da Terra. Os ouvidos zumbiam cada vez mais alto, incapaz de ouvir qualquer coisa que não fosse o silêncio que a ausência da voz dela causava.
Ela gritou até a voz secar. Natália não tinha certeza se o sol ainda existia para nascer no dia seguinte.
Mas ele nasceu e ela, no entanto, não abriu os olhos para vê-lo. As partículas de ar que entravam pelo seu nariz e boca eram seu alimento dia e noite. As memórias torrenciais navegavam direto do coração pela corrente sanguínea até o porto de sua cabeça e lá atracavam e faziam morada. Ela não tinha mais líquidos capazes de se transformarem em lágrimas que desceriam pelos seus cílios e beberia como vinho.
As semanas seguintes não foram melhores. Natália engoliu todo o universo que conseguiu colocar dentro de si. Caiu por todos os pedaços de concreto pelas ruas, perdeu pele nos muros da rua e amores nos lábios de outra mulher. Não viu quando sumiram todas as cores de todas as coisas que existiam. Não tinha música e não existia luz. Não havia sequer uma pedra no meio do caminho.
Não havia religião que conseguiria salvá-la daquela miséria. Natália ficou três dias e três noites com os joelhos pregados ao chão, pedindo por um milagre a quem quer que estivesse ouvindo-a.
Gritou no vácuo infinito. Nada aliviava a grande mão que sentia prensar e espremer as últimas gotas de sangue que ainda estavam no seu fraco coração que batia precariamente contra o seu peito.
Quando conseguia dormir, ela ainda acordava durante a madrugada para olhar o telefone. Na esperança de receber uma mensagem, uma ligação, um comentário, qualquer sinal durante as gotas de tempo em que se permitia ter esperança. O sinal nunca veio. Ele nunca vinha e nunca viria.
Até hoje ninguém nunca morreu de amor. Mas amanhã pode ser que seja o dia.
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liebestod
RomansaNo seu calendário, Natália já contava quatro meses desde que ela lhe deixara. (do alemão, "liebe", amor e "tod" morte, liebestod significa a consumação do amor de duas pessoas por meio da morte; título da última música da ópera que conta a história...