Uma ajuda

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Havia chovido mais cedo e fazia muito frio. Acabei adormecendo e depois de 1h do melhor sono acordei desesperada com os gritos da minha mãe. Por incrível que pareça ela estava mais ansiosa do que eu mesma.

Ela pensou que eu havia perdido a hora. Como eu amava dormir. Nossa! Para a minha tristeza, cessar aquele sono era crucial, mas precisava levantar! Se bem que nem sono mais tinha, pois aquele grito ainda ecoava no meu juízo.

Naquele dia precisava acordar mais cedo do que qualquer outro dia na minha vida. Primeiro dia de aula e ainda mais numa faculdade é sempre uma descoberta ou não, dependendo da posição em que nos encontramos.

E no meu caso cada dia era um desafio. Cada lugar novo era como travar uma guerra até me adaptar. Afinal, pra quem enxerga, um lugar desconhecido já causa agonia pelo medo de errar o caminho, de não encontrar. Imagine aí pra quem não tem essa possibilidade! A tecnologia por sua vez me surpreende! GPS hoje em dia salva muita gente desse possível aperreio. Era muito atormentador pensar na hipótese de me perder. Não gosto nem de pensar, pra falar a verdade. Sorte pra mim, pois minha mãe sabia muito bem quando usar este artifício mega maravilhoso.

Nas primeiras semanas minha mãe me ajudaria no processo de conhecimento do local de estudo quanto ao caminho que traçarei até lá de segunda a sexta-feira. O que pra ela não está sendo uma opção tão aceita assim, mas precisa me libertar um pouco e me dá a chance de tentar sozinha, apesar que isso a deixa muito aflita mesmo. Ela sabe que eu preciso vencer meus medos. E isso era o que mais a atormentava. Ela sempre me disse que eu não desistia fácil do que queria e isso me dava coragem.

Não tinha tempo mais para pensar, precisava correr e me arrumar. Tudo ali era novo pra mim. Havíamos mudado a poucos dias. Tempo suficiente dos meus pais resolverem minha matrícula na faculdade.

Estudar Direito sempre foi meu sonho. Apesar da grande dificuldade que enfrento em não enxergar, nunca foi um empecilho. Pelo contrário, esse era mais um motivo de muitos outros que não me deixavam desistir.

A região era muito agradável. Eu podia sentir a energia daquele lugar, das pessoas não muito receptivas. Morávamos em um condomínio. O que eu não curtia muito, pois sempre achei estar rodeada de pessoas fúteis e sem tempo algum para conversar, mas não me entenda mau pelo amor de Deus! Era somente a sensação que eu sentia. Isso não quer dizer que todas as pessoas que moram nestes lugares fossem fúteis.
E apesar de um condomínio trazer a comodidade e segurança que se espera, sempre senti o vazio daquele lugar ser igual aos outros lugares aonde já morei.

Mas, enfim, não podia reclamar demais. Era isso ou nada!
Meus pais sempre foram super protetores. Deve ser por conta da minha deficiência visual. Eles me amam tanto!

Ah, e por falar da minha limitação, nem me apresentei. Kkkkkkk. Se já perceberam, eu gosto muito de conversar! Então, vamos lá...
Me chamo Cléo Luz Sanrral, a famosa família Sanrral. As pessoas se atém muito a essa questão de sobrenome. Mas, gente, nunca me importei com isso de verdade. O que importa são as pessoas em si e o que de bom elas transmitem e compartilham. A vida, por exemplo! Viver, é isso! E não se prender a padrões sociais.

Tenho 17 anos e passei no vestibular para Direito. Estamos no ano de 2000. No começo eu me segurei para não surtar. Me bateu aquele desespero, pensei até em desistir. Mas, como almejei muito esse momento, ele tomou conta de mim e o desejo é poder continuar.

Finalmente estou pronta, e minha mãe me chama para irmos. Ansiedade é pouco para descrever o misto de sentimentos que estão rondando minha mente. Tantas dúvidas se passavam na minha cabeça. Por exemplo, como seria recebida pela turma?

Meus pais procuraram saber e informaram que na turma só havia eu com essa peculiaridade. O que não me deixou menos tensa! Mas, me disseram que no bloco ao lado da Ala do Curso de Direito havia um outro aluno deficiente visual que iria cursar Engenharia Química. Um alívio percorreu meu semblante. O que no mesmo instante se desfazia com os remotos pensamentos. Eu só imaginava que seria um fardo. Meio que uma obrigação para as pessoas ao meu redor me ajudarem. O que eu temia muito. Não quero jamais ser vista dessa forma. Eu posso ser mais do que as pessoas me veem. Só preciso de confiança para isso.

Fui apresentada à turma e ouvi um caloroso "bem-vinda", o que logo motivou um sorriso largo. Para o primeiro dia até que não estava tão ruim assim, vai!
Bom, minha mãe viria me buscar no final da manhã. O melhor turno para todos, pois era caminho para o trabalho dela e na volta em sua hora de almoço me buscaria na faculdade e tudo certo pra irmos para casa. Era só seguir esse roteiro.

Como de praxe, o primeiro dia é mais para apresentações. Eu confesso que senti muita insegurança e falar sobre mim causava calafrios. Mas, não daria outros motivos que pudessem me diferenciar. Me apresentei igual todos ali presentes. E pra minha surpresa nem tremi. O que foi um super alívio!.

A aula enfim terminou e chegou a hora que muitos esperavam. Ir pra casa! Como era o primeiro dia mesmo, largamos mais cedo. O que pra mim não foi tão vantajoso, porque teria que aguardar minha mãe. Mas, não era problema algum! Me dirigi até a recepção principal da faculdade e fiquei aguardando lá.

Porém, me bateu uma vontade repentina de ir ao banheiro. E assim fui! Não conhecia ainda todos os cantos daquele estabelecimento, o que mais me intrigava a princípio. Mas, arrisquei seguindo a sinalização e consegui chegar ao banheiro.

Na volta à recepção principal ouvi o sinal tocar. Havia terminado a última aula definitivamente!

Não me dei conta do tumulto que enfrentaria de tanta gente circulando num mesmo espaço e ainda mais super apressados. Me mantive seguindo a sinalização, mas tendo que parar um pouco pra não ser derrubada. Mas, não foi o suficiente! Esbarraram em mim e não consegui me equilibrar. Fui ao chão! Fiquei tentando levantar aos poucos. A pessoa nem parou para me ajudar, saiu esbaforida, e eu desesperada.

Até que alguém toca em mim e pergunta se está tudo bem. Mas, não era qualquer toque. E que voz era àquela!?
Logo disse sim! E ele me ajudou a levantar. Agradeci! E ele continuava preocupado. Não parava de fazer perguntas.
_ Você está bem mesmo?
_ É novata aqui, certo?
_Como isso foi acontecer? 
E eu o tranquilizei respondendo que agora estava tudo bem, mas precisava voltar à recepção principal, pois minha mãe já estava quase chegando pelo adiantar das horas. No entanto, antes perguntei o nome dele.

Você me ajudou e eu te agradeço muito. Mas, me responda, como se chama? E ele logo disse.
_ Me chamo Zaú Cristian Souza e, já aproveitando, tenho 18 anos e curso Engenharia Química que fica ao lado do bloco do curso de Direito. Ah, e também sou deficiente visual igual você!

Nossaaa, sério? E como você foi tão solícito comigo? Caramba! Você não se sente perdido aqui igual a mim?

Antes de te responder me diga seu nome, por favor! É meio que estranho estar falando com alguém e não saber ao menos como se chama, já tirando o fato de que nos conhecemos a partir daqui. Esse é o nosso primeiro contato.

Aah, claro! Desculpa! É que ainda tô pasma com a falta de educação de algumas pessoas aqui. Me derrubaram e nem pra parar e perguntar se está tudo bem! É uma situação muito chata. Mas, enfim, me chamo Cléo Luz Sanrral, tenho 17 anos e estudarei Direito. Hoje por sinal foi meu primeiro dia aqui. O que não esperava era esse resultado. Cair! Kkkkkk. Mas, tudo bem!

Bom, Luz! Posso te chamar assim?
_ Ah, claro!
Então, respondendo às suas perguntas anteriores a sua apresentação, no início foi difícil pra mim também, mas não se apavore! Vai dar tudo certo! Seja bem-vinda! 
Apesar de termos nos conhecido a partir dessa situação apavorante pra você, eu sinto que tens uma energia muito boa e sinto também que já nasce aqui uma bela amizade. Ah, sem contar que você tem um cheiro muito bom! Desculpa falar assim, mas o seu perfume ficou na minha camisa quando te ajudei a levantar.

Mas, deixa te ajudar a chegar na recepção. Você ficou calada por um instante e percebo que deva ter ficado com vergonha. Desculpa se causei essa impressão!

Ouvir aquela voz já me fascinava. Era como música clássica aos meus ouvidos e ouvir  o comentário de que meu perfume havia ficado em sua camisa me deixou com muita vergonha. Nossa! Imaginei o quanto tinha me agarrado nele para conseguir ficar em pé a ponto do cheiro do meu perfume ficar nele. Que vergonha eu senti! Kkkkkkk

Minha mãe finalmente dar o ar da graça. Apresentei o Zaú à ela muito rapidamente, pois o nível de constrangimento já tinha se esgotado. E fomos embora! Mas, àquele toque, àquela voz e toda àquela preocupação causaram algo diferente em mim que não tô sabendo lidar no momento. Preferi não pensar, o que era inevitável! Será que o encontrarei de novo? Senti uma angústia!

E aí? O que acha que acontecerá? Já se sentiu como a Cléo alguma vez? Está ansioso para o próximo capítulo? É só me acompanhar!!!

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⏰ Última atualização: May 12, 2019 ⏰

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