08 | BEM VINDO AO INFERNO

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08
     BEM VINDO AO INFERNO 
ADAM

DIA DE FESTA
PRECISANDO DE UMA BEBIDA
CONHECENDO O MUNDO DELA
5 MESES ANTES
COMEÇO DO OUTONO EM BOSTON

As ruas de Boston passam como flashes esquecidos em minha mente, através da janela escura do carro alugado. Meus dedos tamborilam ansiosos sobre a minha perna dobrada. Evito as lembranças da minha época como morador daquela cidade, quando era mais uma daquelas pessoas sorridentes, lotando algum bar, com uma cerveja na mão e rodeado de amigos.

Olhando para trás, sentia-me um idiota. Ou talvez fosse idiota agora.

Minha primeira parada ao ir embora de Bayfield foi Boston. Ali entrei para a minha e conheci os caras por quem daria a minha vida. E aquelas lembranças pareciam terem sido em outra vida. Uma vida vivida por outro cara.

Meus dedos param, afundam-se contra a minha pele, amassando o tecido engomado que envolvia minha coxa. Aperto as pálpebras irritado comigo mesmo. Irritado com aquela voz que gritava: Isso é culpa sua, Adam. Está feliz agora?

Aquela voz tinha dono. O mesmo dono que tinha me dito: Você é minha família. Eu te devo muito, mas eu nunca mais quero te ver na vida. Agora é cada um por si.

Aperto as pálpebras.

— Maldição — o resmungo ao meu lado afasta os fantasmas.

Encaro sem vontade a figura da mulher reclinada para frente ao meu lado. No banco da frente o gorducho chamado Pepe dirigia em silêncio, vez ou outra lançando um olhar curioso pelo retrovisor para o banco de trás. Enquanto a garota ao meu lado  tentava fechar as suas sandálias pretas. Uma tarefa que parecia quase impossível. Seus lábios não paravam de resmungar, desde que tinha saído apressado, a obrigando a me seguir com as sandálias abertas e vários objetos na mão.

Eu precisava de ar. Porra. Como eu precisava de ar, depois de entrar naquele mundo. O mundo da Sunshine. Aquela garota continuava sendo uma caixinha de surpresas. Uma tatuagem escondida em seu corpo. Ela era tão pequena e infantil por fora e cheia de surpresas por dentro. Nenhuma mulher tinha tanta surpresa como ela. Era capaz de ler qualquer pessoa, mas ela não. Não conseguia lê-la. Quando achava que já sabia tudo. Percebia que não sabia nada.

Na ponta dos meus dedos ainda formigava a vontade de tocar a sua pele fresca. Aquelas costas magras e nuas diante dos meus olhos – naquela noite – tinha sido a lembrança de como meus os relacionamentos tinham sido superficiais e sem qualquer contato nos últimos anos. E por um momento a sensação de solidão me atingiu.

E lá estava ela sendo infantil mais uma vez. Me fazendo querer estar sozinho. Me fazendo questionar a minha solidão.

— Desisto — Tate joga sua cabeça para trás, com as bochechas vermelhas e as sandálias ainda abertas.

Afundo minha cabeça no encosto de couro do banco. Volto a tamborilar os dedos repousados na minha perna, uma falha tentativa de manter os meus nervos no lugar com aquela criança tagarela ao meu lado, que não conseguia se vestir sozinha e ainda parecia uma mulher por fora. Sem mencionar a irritante estação de rádio que tocava músicas chicletes, uma escolha do motorista e da minha acompanhante, após alguns segundos de discussão e pôr fim a concordância por aquilo que parecia tortura para os meus ouvidos.

— Adam — os lábios perigosamente vermelhos murmuram ao meu lado, em um tom sereno.

— Hum — grunho sem vontade.

— Eu odeio o que estou prestes a fazer — a mulher de cabelos castanhos declara — Pode apostar que isso está doendo mais em mim do que em você — o discurso continua — Mas, fecha para mim? — o pedido é cheio de suplica oculta com seus olhos redondos brilhando em minha direção.

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