Gritos. Risadas. Conversas. Palavras cantadas. Sons indo e vindo em um vento passageiro que avisava sobre o período de friagem que chegaria logo mais. A felicidade que não se aguenta e extrapola por todos os meios que consegue, através dos brilhos dos olhos pequenos e animados, das risadas altas e infantis que despertam os pássaros cansados que dormiam em seus ninhos com uma quietude incomum, dos sorrisos bonitos e que harmonizavam com os rostos pequenos e ainda tão inocentes para entender toda a confusão em que o mundo vivia, das conversas animadas e tão cheias de vida que encantam os poucos professores que ainda ali resistiam, das brincadeiras divertidas que deixam no tempo alguma memória da qual eles ainda poderiam lembrar depois que todo seu destino fosse traçado por adultos sem nenhuma inocência e com tamanho egoísmo.
Aquilo tudo era tão bonito e tão cheio de emoção que era quase um atento à criança que reside ainda nos pobres e atormentados corações adultos que se veem entrando em uma luta nada justa para proteger o futuro daqueles que nem sequer nasceram mas que já tem tanto a perder. É difícil acreditar que uma simples palavra pode acabar com tantos sonhos e vidas, acabar com o resto de esperança daqueles que tanto sofreram e viram ali uma única oportunidade de mudar sua história, de realizar os sonhos que foram roubados de suas famílias em um passado nem tão distante assim. As lágrimas escorrem dos bonitos e tão vividamente alegres olhos da professora nem tão mais maluquinha assim, manchando a pele feita de porcelana e trilhando um caminho de dor e angústia que chega até o coração apertado, doído e tão desolado de alguém que presencia o fim de uma história tão longa. O sorriso bonito e gentil que sempre a acompanhava foi substituído pelos lábios mordidos e pintados por gotículas de um sangue vermelho causado pelo aperto dos dentes em uma forma de tentar controlar o choro contido no fundo de sua garganta, esta que ardia pelo esforço de não desabar ali mesmo vendo aqueles olhos, aqueles barulhos, aquela inocência tão alegre e sem saber do que acontece fora de um ambiente tão puro como aquele.
Ela respira alguns vezes, levando o ar carregado para dentro de seus pulmões e logo depois soltando o ar quente de volta ao mundo, pisca as pálpebras pesadas e cansadas algumas vezes sentindo a visão embaçar levemente devido às lágrimas restantes, ajeita o bonito vestido que adornava o corpo e logo põe um sorriso forçado no rosto antes de dar o primeiro passo até sua primeira sala. Seus passos são firmes e apresentam um certo peso que era tão incomum à professora, sempre ela tão leve e tendo seus passos quase como uma dança mágica assim como nos filmes infantis, caminhando pelo corredor agora vazio não consegue escutar outra coisa senão seu coração atormentado que bate acelerado no peito, assim também está sua respiração, rápida e sem ritmo nenhum, a sensação apertada no peito a quase deixa sem o pouco o ar que lhe resta.
Assim que avista a porta pintada em um bonito tom amarelo, seus passos vacilam um tanto porém ela continua seguindo em frente e sem parar por nada, dando um leve encostar de dedos na porta e entrando com um receio imenso mas que ela luta para esconder daquelas jovens crianças. Caminha firmemente até sua mesa que, assim como todos os outros dias, está enfeitada com alguns papéis brilhantes e coloridos junto à uma maçã vermelho carmim, que algum de seus pequenos alunos comprou somente para receber um elogio acompanhado de um beijinho na bochecha.
Deixa a bolsa pequena sobre a mesa e se vira para, finalmente, encarar aqueles olhinhos que a observam com tanta curiosidade, conta até dez e se volta para eles, o sorriso, mesmo que falso, não deixa de encantar as crianças e as fazem retribuir com um sorriso enorme, alguns deles quadrados e engraçadinhos, outros com a falta de um ou dois dentes de leite, e ainda alguns com uma pequena mancha de tinta colorida, este último sendo seu aluno mais bagunceiro e que possuía a maior das graças devido à sua aura esperta e que sempre o metia em confusão.
Antes que a professora abrisse a boca e falasse alguma coisa, o garotinho de dentes azulados caminhou até ela com as mãos atrás do corpo demonstrando que escondia algo, os olhos apagados e levemente molhados da maluquinha se direciona ao menino de forma curiosa, tentando em vão descobrir o que ele tanto esconde em suas mãos. Ele para em frente à mesma, apenas com alguns poucos centímetros de distância, e ergue a cabeça para que possa encarar com suas brilhantes orbes castanhas o rosto frágil da professora.
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Sorriso Pintado
Short StoryUm papel amassado, um olhar brilhante e um sorriso pintado. São eles os salvadores dessa pequena história. Inspirada na obra "Professora Maluquinha", escrita por Ziraldo, esse texto foi escrito mediante a um concurso escolar e sem qualquer intenção...