a peça

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M: menina
M1: a de verdade
M2: sua consciência

luzes ascendem

~ m1 entra no palco e para no centro. virada pra frente, olha pro chão ~

M1: *inquieta. voz de choro*
"sabe... eu não tenho certeza sobre isso..."
*olha pra frente. rosto vermelho e choroso*
"minha mãe disse que eu sou linda hoje...(sorriso forçado) ela diz isso de vez em quando... não parece muito verdade, mas ela diz."

~ m2 entra pelo lado oposto do palco. para ao lado de m1, um passo atrás ~

M2: *calma e serena. tom de pena na voz*
"meu amor, você sabe que não é verdade"

~ m1 olha pro lado e enxuga uma lágrima solitária com as costas da mão ~

M1: *voz suplicante. olhos marejados*
"mas poderia ser!... (hesita sem saber bem o que falar) eu sempre escuto as pessoas falando... sabe, sobre beleza. como cada um de nós é único e belo... (riso irônico) eles são sempre tão lindos..."

~ m2 sorri e põe a mão no ombro de m1, que olha pra baixo ~

M2: *paciente*
"olha só, você sabe o que eu penso sobre isso. já te disse milhões de vezes. (se aproxima de m1 e fala quase em seu ouvido) não adianta ouvir o que eles falam. você sente a verdade na pele. você sente a verdade toda vez que olham pra você com nojo. (desce uma lágrima em m1) sente toda vez que te rejeitam sem nem te conhecer. você sente a merda da verdade sempre que eles preferem qualquer outra a você."

~ m1 chora sem parar ~

M1: "NÃO! (cai de joelhos nos chão. continua chorando) não é possível... e todas as notas boas que eu tirei no colégio?? e todo mundo que eu ajudei na minha vida?? (soluço) ...e todo amor que eu dei pras pessoas...?...isso tudo... vale alguma coisa, não?"

~ m2 senta no chão ao lado de m1 e olha diretamente pra ela ~

M2: *pressiona o rosto de m1 para sua direção*
"nesse mundo, flor, não vão nunca te dar valor por essas coisas. são banais, entende? quem ganha nessa guerra, é quem mata mais."

M1: "quem me mata?"

M2: *assente calmamente*
"quem te mata"

~as duas se olham por um breve momento.

M1: *olha pros braços em seu colo*
"parece muito doloroso, sabe? continuar..."

M2: *suspira*
"é... eu sei. dói mesmo. mas a dor não fica. a dor de viver assim é bem pior. você sabe o quanto dói"

M1: *olha pra frente*
"mas isso pode mudar... eu sei que pode. eu posso encontrar amigos de verdade... escrever um livro de sucesso... sei lá. achar quem me ame de volta..."

~ m2 abraça m1 de leve ~

M2: *risonha*
"não se engane, fofa. me diga algum motivo pra qualquer uma dessas coisas acontecer. (m1 olha pro lado oposto) hum? não tem, não é? foi o que eu pensei. (pausa) vai ser assim pra sempre. não adianta repetir infinitamente que ele te quer, ou que ela te ama, ou que você é boa nisso ou naquilo. (m1 chora novanente) minha voz nunca vai sair dos seus ouvidos, e olha que eu sou só o que o mundo enfiou na sua cabeça. e vamos ser sinceras, a gente sabe que é verdade. você é só a menina estranha que fala consigo mesma, e nada vai mudar isso."

~ pausa ~

M2: *séria*
"não ache que vale alguma coisa viver num mundo assim."

~ m2 hesita um pouco, joga algo no chão na frente de m1 e fica parada ao seu lado ~

~ m1 pega o objeto no chão. uma lâmina, brilha na pouca luz do palco. m1 segura a lâmina numa mão, com a outra esfrega a parte interna do braço ~

M1: *olha pra frente, séria*
"eu sei o que vocês acham. sei que pensam que sou louca. sinceramente, pra mim vocês são os loucos. e eu não conto isso tudo a vocês por acaso. essa não é apenas uma carta de suicídio pra agradecer mamãe pela comida gostosa e papai pelas contas pagas. sintam como se estivesse falando diretamente com cada um de vocês, porque eu estou. vocês que acham que o melhor que eu faço é sumir, é exatamente isso que eu vou fazer. podem dizer que é uma pena. digam que eu era tão jovem e não sabia que tinha outra saída. pena mesmo. pena que não foi isso que vocês disseram antes."

~ m1 fica de costas pro público. pega a lâmina e "corta" o braço. tinta vermelha escura escorre de seu braço enquanto ela deita no colo de m2 ~

luzes apagam

my suicide playOnde histórias criam vida. Descubra agora