O vento sopra forte contra o rosto de Dalila. Seus olhos azuis faiscantes como o céu antes de uma tempestade estão fixos na fogueira a sua frente. De pouco em pouco, as labaredas devoram os galhos que ela havia colhido horas atrás. A garota respira profundamente, fazendo o ar frio entrar nos seus pulmões. Seu corpo todo estremece e os cabelos rasos de sua nuca se arrepiam. A noite a cerca, como se quisesse a devorar por inteiro. E Dalila sabia que realmente havia uma coisa que a queria devorar naquela floresta. O pensamento flutua por sua mente, fazendo ela enterrar seus dedos sujos de sangue na neve. O barulho ao seu redor cessa, indicando que a criatura está chegando perto. Dalila levanta, segurando bem a adaga em sua mão, conforme morde seus lábios roxos pelo frio. Ainda falta quase uma hora para o amanhecer, e ela não sabe se sobreviverá mais uma noite. A garota começa correr floresta adentro, se afastando do calor reconfortante de sua pequena fogueira. Seu corpo magrela e praticamente descoberto já começa a dar sinais de insatisfação, sentindo falta do calor. Mas Dalila não para de correr, mesmo sendo difícil continuar por conta da neve. Ela não consegue enxergar um palmo a sua frente, mas o barulho dos galhos se quebrando a apavoram demais para ela parar. As lembranças dos risos das suas amigas ainda ocupam sua mente. E também de seus gritos. De seu sangue manchando a neve. Mas depois de duas noites, seus corpos já devem estar a três palmos abaixo de uma camada grossa de neve. Dalila só não quer se juntar a elas. O desejo de viver pulsa por todo o seu corpo, acompanhando o ritmo do seu coração descompassado e dos passos suaves da criatura que a segue. A loira nunca foi religiosa, mas depois que ela e suas amigas foram atacadas no acampamento a duas noites atrás, ela anda rezando muito. Rezando para que todo o seu treino não tenha sido em vão. Com agilidade, Dalila segura a adaga com os dentes e salta. Suas mãos pequenas agarram um galho alto. Pegando impulso, ela começa a subir na árvore. O silêncio reina novamente, mas Dalila sabe que não está sozinha. Anteriormente a criatura queria ser ouvida, queria sentir o pavor presente em seu coração enquanto a caçava, mas agora...
— Merda! - A palavra sai estranha por entre seus dentes e a lâmina entre eles. Com olhos azuis cerrados, Dalila flexiona os joelhos e pula para a próxima árvore. A metros dali, ela ouve um galho se quebrando. Ela amaldiçoa esse maldito jogo de gato e rato. O cheiro de rosas chega até seu nariz, indicando que a criatura se aproxima mais. Lágrimas mornas descem pelo rosto pálido e gelado de Dalila.
Você vai morrer!
A garota queria voltar atrás. Deixar toda a maldita herança da sua família para trás. O pedido de seu grande amor para que ela ficasse a assombra enquanto ela foge pela floresta escura. Pulando de galho em galho, sentindo a morte se aproximar rapidamente, Dalila perde perdão, esperando que Lucas, onde quer que esteja, não a culpe pelo o que aconteceu.
Por favor Dalila! Não vá! Você vai morrer!
A morte de Ana e Felipa estão em suas costas. Elas não queriam seguir o mesmo caminho que a amiga, mas deixa lá ir sozinha na sua primeira missão não era uma opção. Uma lufada de ar escapou por entre seus lábios quando pisou de mal jeito em um galho. Automaticamente, Dalila encolhe seu corpo. Em segundos, seu corpo se choca contra a neve. A loira geme de dor conforme o frio a consome por inteiro. Uma risada cruel dança pelo ar, envolvendo Dalila em uma neblina de amargura. Malditos sejam os caçadores. Malditos sejam sua família.
— Uma coelhinha assustada. - Dalila ergue seus olhos para a criatura. Tem a aparência do mais bonito dos homens. Rosto fino, maçãs do rosto salientes, lábios carnudos e bem delineados. Seus cabelos pretos e cumpridos caem sobre seus ombros de maneira suave. Sua figura alta e ameaçadora faz todas as estruturas da garota quebrarem. Os olhos vermelhos do vampiro a queimam de dentro para fora. Seu coração palpita. — Não achou que conseguiria fugir de mim, não é?
— Vá a merda! - Grita Dalila, procurando sua adaga com os olhos, mas já a havia perdido sobre as camadas de neve.
— Não tente resistir querida. - O vampiro usa sua super velocidade para subir em cima de Dalila. Suas mãos pálidas seguram as delas, a pressionando sobre a neve. A loira está presa, desesperada. Os gritos de suas amigas parecem cada vez mais altos em sua cabeça.
— Eu te odeio! - Dalila praticamente gospe. O sorriso do vampiro vacila. Uma de suas mãos vai para o rosto da garota, acariciando sua bochecha.
— Eu sinto o sangue pulsar por todo o seu corpo... - A mão do moreno desliza até o pescoço da garota. Dalila está paralisada de medo e desilusão. Sua vida passa diante de seus olhos, e ela jura escutar as juras de devoção eterna de seu amor. O vampiro parece fascinado pela garota, pelo pavor em seu par de olhos tempestuosos e assutados. — Você é tão bela, minha Dalila. - O vampiro se inclina, deixando seus lábios beijarem o pescoço da jovem. Dalila fecha os olhos bem a tempo de sentir as presas adentrando em sua pele. Seus lábios se abrem para soltar um urro de dor. Ela sente a carne do seu pescoço sendo rasgada pelos dentes longos e afiados do vampiro. Ele suga seu sangue com afinco, suga sua vida. A esperança escorre pelo ralo, os gritos e sussurros em sua cabeça param. Dalila arfa quando o vampiro se afasta com seus lábios melados de sangue. O moreno sorri e morde o próprio pulso.
— Só alguma gostas e você será como eu, e nós ficaremos juntos para sempre. - Ele murmura. Dalila suspira, sentindo o coração em seu peito apertar.
— Eu te amo. - A jovem sussurra contra o silêncio da floresta. — Mas você já morreu. Adeus Lucas. - Em uma velocidade quase desumana, Dalila agarra o cabo de sua adaga na neve e a crava contra o peito de seu amor. Lucas a olha chocado, com seus olhos vermelhos brilhando com a traição. O sangue negro escorre do seu peito, manchando sua camisa branca. Ele se ergue do corpo de Dalila, cambaleando para trás e caindo de costas na neve.
— Dalila, o que você fez? - O vampiro tem a voz fraca, quase chorosa, quando se dirige a garota. Dalila se levanta e o encara.
— O verdadeiro Lucas morreu quando veio me buscar na floresta. Você... Você é apenas um monstro. - As palavras de Dalila são duras e cortantes, carregadas de mágoa e rancor. Mesmo mancando, a loira se vira para ir embora, acelerando o passo.
— Dalila, não me deixe aqui sozinho! Eu te amo! - A jovem ri, sentindo seu corpo todo estremecer com a dor.
— Monstros não podem amar. O sol nascerá em alguns minutos e você... Você vai morrer sozinho. - Dalila diz entre dentes e começa a correr. As lágrimas brotam de seus olhos. Lucas continua chamando seu nome, enquanto ela se afasta. A dor causada pelas feridas em seu corpo não se comparam a dor das feridas em sua alma. A dor é alucinante, o vazio que em seu peito não pode ser medido. Suas melhores amigas estão mortas, Dalila agora está sozinha. Seu coração chora para que ela volte até o vampiro, mas ela sabe que ele não é mais o mesmo. Ele é o monstro que matou suas amigas e seus colegas. É o monstro que tentou mata lá. É disso que ela tenta se convencer quando chega até o limite da floresta, onde a equipe de recepção da sua sede a espera. Os sorrisos no rosto dos caçadores desaparecem ao ver que a jovem caçadora está sozinha. O sol iluminou o rosto de Dalila e essa foi a certeza que ela teve antes de cair sobre a neve. O sangue da ferida aberta em seu pescoço se espalha pela superfície branca abaixo de seu corpo. Os caçadores correm em sua direção para a socorrer. Mal eles sabem que a jovem já está morta, assim como Lucas, o ex aprendiz de caçador que se tornou um vampiro. Porém, Dalila não pereceu sobre o sol e se desfez em cinzas. Apenas sua alma morreu. Agora, só tem uma única coisa que mantém seu coração batendo: vingança.
°1388 palavras°
Olá gente, esse está sendo meu primeiro conto aqui no Wattpad e eu estou muito feliz em escrevê-lo. Essa foi a primeira parte, nomeada de "Pela Vingança" e é contada pelo ponto de vista de Dalila Van Helsing, uma jovem caçadora que perdeu suas melhores amigas e seu namorado em uma noite só. Mais futuramente pretendo criar um livro para contar a história dela, mas tenho outros projetos no momento. O conto ainda vai contar com a parte dois, contado pelo ponto de vista de Lucas, o vampiro recém transformado. A segunda parte será lançada em breve e se chamará "Pelo Amor", fiquem ligados e até mais caçadores e caçadoras!
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inverno de sangue - Conto
Short StoryUm conto de Tayssa Gemi Inverno de sangue - Amor e Vingança A primeira caçada é um marco na vida de todo caçador aprendiz. É quando ele se torna um caçador completo, é quando ele pode trazer honra a sua família. Isso não seria diferente para Dalila...