A Bruxa na Toca do Lobo

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I

A terra ardia ao redor da fogueira. O vento que corria em meio às montanhas levantava brasa. Esta, por sua vez, batia na lebre que assava. A noite de lua cheia permanecia fria, calma e silenciosa; o rio que passava ao lado, também. O ar carregava um odor extremamente desagradável, quase insuportável.

Um pouco afastada, sentada em uma pedra, estava uma menina. Ela desenhava no chão com um graveto. Usava uma túnica desbotada e sua atenção parecia totalmente deslocada da realidade. Ela nem parecia notar os homens sentados nos troncos ao redor do fogo.

— Essa guria me dá calafrios. — Disse um deles, um rapazote que ainda nem sequer fazia a barba. Ele abraçava o próprio corpo, buscando aquecer-se – a túnica e a cota de malha que cobria até a cabeça pareciam não dar conta.

— O que foi, Johann? Tem medo de menininha? — Disse o gordo que tinha a boca totalmente lambuzada de caldo de carne. — Acho que é porque você ainda não teve nenhuma! — Ele riu alto.

— Eu tô dizendo, Hans: há algo de errado com essa menina. — Respondeu Johann. — Merda, sou o único que acha isso? Ela usa uma roupinha rasgada nesse frio de doer; apanhou igual um cachorro de rua e não deu um pio; não tentou fugir e nem sequer gritou por ajuda; e o pior de tudo: ela não parece sentir esse odor infernal! — Johann falava rápido. Sua voz era irritante. — Além disso, de quem foi mesmo a ideia de dormir na floresta? Deveríamos ter pernoitado em uma pousada. Teríamos calor, cerveja e comida de verdade. Sem mencionar o fato de que pessoas andam sumindo por essas montanhas.

Um terceiro, um homem alto que usava um sobretudo preto cujo brasão de armas era um lobo em pé nas patas traseiras, pôs-se a falar, sem encarar os outros diretamente.

— Você viu alguma pousada no caminho? Viu, Johann? Eu também não. — Sua voz era serena. Sabia que não precisava vociferar para mostrar autoridade. — A única coisa que eu vi foi uma menina que não fala e que não mostrou nenhum tipo de resistência. Logo vi a oportunidade de ganhar um dinheiro fácil. Tem vários velhos nobres que pagariam um bom preço por ela. Sobre as pessoas que sumiram, fomos nós mesmos que matamos. Ou você esqueceu?

— Perdão, Sven. É que eu nem estou raciocinando direito. — Disse Johann, com cara de choro. — O frio... O silêncio... A escuridão... Esse cheiro... Ah, esse cheiro! Parece até que alguém quebrou uma centena de ovos podres! Ou que as portas do próprio inferno foram abertas! Eu não aguento isso! Eu não... — De repente, sua expressão mudou. Johann esticou-se como um galo a cantar. Sua boca escancarou-se de uma maneira quase inacreditável. Seus olhos viraram até tornarem-se totalmente brancos. De sua garganta, saia um gemido bizarro e constante – era como se um mudo tentasse cantar.

— Meu Deus, Johann! Que diabos está acontecendo com você?! — Os olhos dos outros dois esbugalharam-se.

Cessando os gritos, Johann caiu para a frente, revelando suas costas. O homem estava completamente dilacerado. Até mesmo seus órgãos internos estavam destruídos.

Hans caiu de bunda no chão, gritando com toda a força que podia. Mas Sven manteve a calma como pôde. Ele correu até a sua espada e a retirou da bainha. A arma tinha um metal formidável, que brilhava forte à luz da lua.

— É algum tipo de animal. — Disse o líder, com firmeza. — Provavelmente é um lobo ou até mesmo um urso. Ele é rápido, mas, se trabalharmos juntos, podemos vencê-lo! Apresse-se e pegue sua arma. Vamos ficar costa a costa, mantendo os olhos bem abertos. Se fizermos isso, teremos uma chance. Vamos! Tenha coragem, homem! Levante-se e... — Mas Hans não quis saber de nada disso. Entrou em pânico e pôs-se a correr, gritando e chorando copiosamente.

Idade das TrevasOnde histórias criam vida. Descubra agora