Primeiro ponto de vista

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Acordei com uma trucidante dor no peito. Meu corpo inteiro tremia e minha garganta estava entalada. Meus olhos captavam nada, exceto uma brancura infinita. Tudo que chegava aos meus ouvidos era um chiado constante. Levantar foi uma tarefa mais difícil que imaginara. Meu coração parecia uma britadeira.

Naquele cenário branco sem fim, avistei um birô e um ser atrás dele. Caminhei até lá. O homem parecia um monge beneditino pálido, mas a túnica era de um púrpura berrante. Ele lia um livro cuja capa era completamente negra, mascava um chiclete azul e ouvia algo nuns fones de ouvido.

— Olá? — eu disse. — Poderia me dizer onde estou e...

— Você morreu — o homem respondeu, desviando o olhar apenas um pouco do livro. — Ataque cardíaco, no meio de um churrasco. Assine aqui.

Ele empurrou uma folha de papel A4, escrita até a metade. Minha boca estava seca.

— Ah, espere... Não pode ser...

— Tão certo quanto o sol nasce no leste. Assine a folha de ponto. Depois siga pela esquerda.

Encarei a folha, com a assinatura de várias outras pessoas. Nenhum conhecido.

— Esquerda? Isso leva ao Inferno ou ao Paraíso? Quem é você? É Deus?

Ele fez uma bola com o chiclete.

— É a Triagem. Agora assine e vá. Não me aborreça. Sou apenas o porteiro.

Suspirei, dei de ombros, rubriquei na folha. Sem saber o que me esperava, segui pela esquerda.

A passagem ou (A morte por dois pontos de vista)Where stories live. Discover now