...Ou não

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Eloise Elizabeth Whitewish

Eloise apertou mais a capa contra si enquanto acelerava o passo. 

Desde pequena, sempre adorara tempestades: A velocidade do vento, a força da água. Uma súbita mudança no céu, no clima e no tempo simplesmente pareciam relembrar ao ser humano o quanto ele era um grande nada no caminho do universo. Suscetível a qualquer coisinha, e qualquer soprinho de uma brisa mais forte poderia lhe arrastar para fora das profundezas leves da vida. 

Entretanto, toda essa chuva e demonstração de fim do mundo ela amava quando estava em casa: Protegida por grossas vigas de madeira, de frente para uma lareira quentinha e com uma bela xícara de chá fumegante em suas mãos. No meio do bosque e com os cabelos pingando e barro por todo lado, era no mínimo estressante. 

—Raios! Maldição! - Levantou a cabeça para os pingos pesados que começavam a cair, não faltava muito para chegar em sua casa, mas preferia não ensopar-se até lá. 

Observou a cesta em seus braços, e de repente ela pareceu pesar pouco mais que uma tonelada. Bufou com raiva.

—Belo dia para ir pegar ervas, não é Eloise? 

De fato era. Isso há umas quatro horas atrás. E teria sido ainda melhor se ela não tivesse se empolgado com algumas mudas novas e...

Iria retrucar a si mesma, afinal era um argumento válido em uma típica discussão solitária quando viu. 

Não, Viu não. Péssima escolha de verbo. Ela O viu, com o artigo bem, mas bem posicionado. 

Largado na frente do velho carvalho, o homem parecia morto e, se não estivesse, a vida se esvaia aos poucos do corpo ali presente: O indivíduo tremia um pouco e parecia inconsciente, os cabelos pretos bagunçados e grudados na testa pelo suor insistente. O sangue escorria e sua pele já tinha um aspecto mais pálido, com diversos cortes que estavam espalhado por suas roupas rasgadas e ela perguntava que tipo de animal o teria atacado para se encontrar nesse estado. 

Ela fechou os olhos e engoliu em seco, sentindo as batidas do coração do rapaz diminuindo aos poucos. Era alucinante, angustiante e, foi observando a morte tão próxima, que ela decidiu que iria o salvar. Custasse o que custasse. Fizesse... bem, aquilo que tivesse que fazer. 

Ignorou o vestido que começara a pesar pelo tanto de água, agarrando o pano sobre a cesta de seus produtos e a pressionando contra o corte mais profundo. Rasgou um pedaço de sua vestimenta e amarrou do ombro ao ferimento, para garantir que ficaria ali até chegarem em casa para ela poder limpar e costurar. Ouviu o raio tremeluzir no céu, e segurou as mãos gélidas do sujeito.

—Certo, você precisa me ajudar, está bem? - ela avaliou a situação - provavelmente você não consegue nem me ouvir mas... enfim, apenas colabore!

Contou até três mentalmente e o puxou. O homem pesava uns bons quilos à mais que ela, distribuídos em aproximadamente um metro e setenta ou oitenta ou noventa. Ela nunca foi boa com números para fazer um bom palpite. Dizem que quando uma pessoa está determinada ela consegue fazer milagres, não dizem? Então ela conseguiria, pensou dando de ombros, levar aquele ser para um lugar aquecido.

A terra úmida dificultava o percalço, pensava enquanto se forçava a apoiar o indivíduo, mas era pouco, ela lembrou a si mesma. Antes comemorar cada passo dado à reclamar daqueles que faltavam e, erguendo, puxando e forçando o homem, conseguiu avistar o pequeno chalé de madeira que chamava de lar.

Sorriu e acelerou com o peso-quase morto sobre seu corpo pequeno. Como se o céu a observasse e a incentivasse, foi bater a porta que a chuva torrencial alcançou níveis que ela não era capaz de ver uma árvore pela janela.

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⏰ Last updated: Jul 16, 2019 ⏰

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Encantado AcasoWhere stories live. Discover now