Foi inevitável olhar. Na literatura e na vida real, palpável, coisas bonitas e meramente perfeitas são dolorosamente difíceis de não seguir com o olhar. Assim que o som agudo e levemente irritante dos sinos acima da porta buscaram meus ouvidos atrás do balcão, assim como as outras vezes no mesmo dia eu levantei os olhos e busquei por quem quer que tivesse entrado na livraria.
A verdade é que eu era antiquado, com 36 anos de idade e ainda cuidando da livraria antiga dos meus pais, dando um toque moderno aqui e ali com algumas novas poltronas azuis, mas nada demais. Por isso o lugar era tão diferente de toda a cidade, era antigo demais para rapazes como ele.
Razoavelmente baixo, cabelos repartidos aparentemente de maneira despojada, a franja caindo por um dos lados da testa, mas não a cobrindo por completo, os fios castanhos num tom médio se fazendo presentes por baixo de um gorro vermelho vivo. Os casacos em tons frios, do cinza escuro ao preto do moletom de baixo, calças jeans comuns justas e botas quentinhas. Jovem, bem jovem. E aquilo me decepcionou de imediato, eu não costumava me dar bem com garotos tão novos, também nunca tinha conseguido manter relacionamento com alguém abaixo dos 30. Por isso imediatamente desgrudei os olhos dele. Não olhar, não observar; não desejar.
Continuei arrumando os livros de baixo do balcão central da livraria, eram devoluções, ou livros que foram danificados por compradores e que eu mandaria mais tarde para um concerto na próxima rua, não jogava-os fora. E por isso muitos livros faziam aniversário por ali.
O rapaz pareceu se encolher um pouco, possivelmente pela mudança drástica de temperatura do exterior com a temperatura medida da livraria, quentinho e aconchegante. Assim que escutei seus passos me senti observado, não levantei o rosto da edição de Alice no país das maravilhas danificado nas pontas e na última página, apenas levantei os olhos em curiosidade, exatamente quando ele passava por mim, com os lábios gordinhos entreabertos, respiração audível – talvez por algum resfriado recente – e mãos pálidas ajeitando o casaco superficial. Deu a volta pelo balcão e entrou em alguma das sessões. Por mais que tivesse seguido-o com o olhar, desejei não tê-lo feito.
É como, inconscientemente costumo dizer "não olhar, não observar; não desejar." A regra valia principalmente para garotos com menos de 25, o que me parecia o caso. Mas para azar do destino, ou sorte, eu deveria arrumar alguns livros largados pelas poltronas azuis do segundo andar naquelas sessões de baixo, logo perto dele.
Parte de mim se amaldiçoou por querer saber o que um garoto tão jovem queria, o que lia. Pelo que se interessava.
Subi as mãos pelo avental – também azul – e amarrei-o um pouco mais forte nas costas, ajeitei o nome no pequeno crachá de metal. Jungkook. Mas a grande maioria me chamava de senhor. Não saberia dizer se pelo respeito ou pela idade, mas me achava consideravelmente bem para a idade. Corria todos os sábados, fazia exercícios recorrentes por causa do histórico familiar de problemas nas artérias, cuidava da alimentação pelo mesmo motivo. E era consideravelmente atrativo, cortava o cabelo da mesma maneira sempre, os fios castanhos num quase tom negro. Minha pele contrastava com a do garoto, era levemente bronzeada. Eu tinha um certo orgulho das faces confusas e admiradas quando falava sobre minha idade, mesmo que rugas já começassem a nascer perto dos olhos e próximo aos lábios.
Juntei os cinco livros que deveria guardar nas sessões de baixo: Ficção, terror e romances amadurecidos. E aquilo não parecia do gênero do garoto.
Passei os braços por baixo dos livros e procurei a primeira repartição, D-E-F. Arrumei os primeiros dois livros, que não conhecia muito bem na sessão D e F. Eram romances do século 21, autores novos que eu desconhecia, e pelas sinopses: não gostaria de conhecer. Mas talvez eu só fosse preconceituoso, e gostasse demais de julgar um livro pelo que aparenta, e não pelo que verdadeiramente é.
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Livros Sobre Ele | Jikook
Lãng mạn- O significado de preconceito é julgar antes de conhecer - Jimin já estava com o livro aberto na primeira página, provavelmente checando a editora, o tradutor... - Como julgar um livro pela capa, você costuma fazer bastante isso, talvez por hobby...