O abraço dela é meu escape. Quem diria que a menina que estava de saco cheio das minhas perguntas, estava nesse momento deitada no meu colo, e minhas mãos entrelaçadas ao redor de suas orelhas, só espero que ele não desista de mim, estou mentindo para o nosso bem, para o bem dela.
...
- Gabriela, cadê minha escova?
- Minha escova
- Cala a boca
Quando eu olho aquele cabelo preto, aquele sorriso aberto, aquele olho puxado, tenho certeza que as estrelas estavam alinhadas quando a encontrei, porque se destino existe, ela era o meu.
...
- Samanta, preciso sair
- Não Gab, me espera! eu vou junto.
- Não, fique aí
- Gabriela, você não pode me deixar sozinha
- É só por umas horas, eu volto, não se preocupe, eu sempre vou voltar
- Só não demore, eu tenho medo, você que me dá coragem
Ela me abraçou tão forte, parecia que estava juntando todas as partes quebradas dentro do meu corpo, eu sorri, peguei a mochila e não olhei para trás, vê-la fechando a porta acabaria comigo. A cada lagrima que caia, sentia como se aquela rosa colorida, que cultivamos e colhemos a dois meses atrás, estivesse caindo pétala por pétala. Ela vai ficar bem, eu preciso poupa-la, ela não merece passar por isso.
O caminho a pé foi longo, minhas pernas e minha mente estavam pesadas, o que eu estava deixando para trás, a minha sorte, minha felicidade, minha menina, minha doce menina, minha Samanta.
...
Aquele local gelado, me fazia refletir, e ter mais certeza que tinha feito a coisa certa para todos, o tratamento ali não era dos melhores, eu só queria que acabasse logo.
...
Esses defensores públicos realmente são bons, estou livre. Minha esperança de ver minha família foram dilaceradas com o vazio daquela rua, e isso doí.
- Ei, Coragem
Quando alguém marca, pode se passar dias, meses e anos, mas a voz, aquela voz rouca, a mesma que ela me acordava para ir para o trabalho, ela era, e eu com medo, vergonha, culpa, virei aos poucos e vi aquele cabelo preto, que já não era mais grande, ela cortou como sempre sonhava e tinha medo, quando ela me olhou e se aproximou, sorriu e o olhinho fechou, aquilo acabou comigo, e eu senti aquele abraço, aquele cheiro, aquela mão no meu cabelo, eu me senti tão segura.
- A gente precisa conversar
- Você pode me dar só mais um abraço, antes que essa tragédia continue?
- Seu cabelo está fedendo Gabriela, vamos para casa
- Com você eu vou para qualquer lugar
No taxi, o caminho foi em silencio, ela olhava a janela, e eu a olhava. A casa não era mais minha, tinha as características dela, posts das bandas preferidas que ela me obrigava a escutar, ela tirou minhas coisas da estante, tinha fotos dela com um belo rapaz, meu olho encheu de lagrima, e meu coração doeu, era uma dor que ninguém conseguia medir, mas o que eu estava pensando, eu deveria estar feliz, por ela ter encontrado alguém especial, aliás, mais de um ano, por um momento, sorri.
-Temos que conversar
- Você acabou comigo, todos os dias eu te esperava nessa janela, até um dia em que aceitei que você tinha ido, e não voltaria mais.
- Eu sinto muito, mas naquele dia em que fomos a delegacia denunciar seu pai, eles me reconheceram, e eu sabia que vinham atrás de mim.
- Eu sofri bastante até completar dezoito, com fome e para pagar o aluguel, agora eu peguei seu emprego na lanchonete da dona Beth, até então, eu roubava como você, digamos que bem melhor, ao menos não fui pega.
- Samanta, isso não é engraçado. Eu não fui pega, eu me entreguei, não queria te ver chorando quando a polícia me levasse.
- Menos Gab, bem menos. Só vai tomar um banho, sua fedida.
No banheiro eu só pensava em perguntar a ela sobre o novo namorado, mas o medo da resposta era maior que a curiosidade. O banho tirou de mim um peso enorme, um banho maravilhoso, que a muito tempo não tinha. Quando saio e vou de encontro o quarto, vejo a pior cena, a cena que acabou comigo, ela estava fazendo cafuné nele, naquele cara, o da foto, o do sorriso igual ao dela, meu Deus, o olho dele também fechava quando sorria.
Eu fui correndo para a sala, sem que me eles me vissem, peguei minha mochila, e sai, sem rumo, afinal, ela era meu rumo, e eu literalmente não tinha mais rumo.
- GABRIELA, GABRIELA
Não posso olhar para trás, mas ouço seus passos leves e depois velozes.
- Onde você pensa que vai?
- Eu quero que você seja feliz, mas não me obrigue a te ver com outro alguém, é muito doloroso para mim.
- Samanta, por que você está rindo?
- Você não me deu oportunidade de apresentar meu irmão mais novo. Quando você foi embora, eu o chamei para morar comigo, estava me sentindo sozinha e com medo, minha mãe estava insuportável, então ele veio terminar os estudos em Nevoares. Você é boba Gabriela, muito boba, eu não te esperei tanto tempo para deixar você ir embora outra vez.
- Samanta
- Gabriela
Quando nossos corpos se tocaram, já não existia apenas uma rosa colorida, a gente tinha um jardim inteiro, obrigada Samanta.

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Rosas
Short StorySamanta é uma adolescente comum, até que um acontecimento muda seu destino.