As memórias daquele dia pareciam tumultuar a minha cabeça por horas, quase como uma maldição. Se bem pudesse, esqueceria tudo. Porém o "esquecer" é ilusório. Nunca que aquelas memórias iriam se dissipar, por mais que eu almejasse isso.Luther foi uma parte muito importante da minha vida, foi com ele que eu descobri o sentido do amor. E foi com ele também que eu descobri a dor.
Era ele quem me confortava nos meus dias ruins, era ele quem se importava de verdade comigo nos dias que eu só queria ficar deitado, chorando.
Ele sempre estava lá.
Porém, ele não está mais aqui.
E eu devo superar isso.
Já são oito horas da noite e meu pai acaba de chegar, sinto o cheiro da comida vindo de longe. Era a hora do jantar.
Levantei da cama e desci as escadas, indo até a sala de jantar, meu pai já estava sentado, esperando por mim e pela minha mãe.
— Boa noite, Daniel. — Meu pai dizia enquanto lia algumas notícias no jornal.
— Boa noite. — Disse e segui para a cozinha, onde a minha mãe estava para que eu a ajudasse com a mesa.
Fui até o armário perto da porta e peguei três toalhas de mesa, junto de guardanapos. Voltei para o outro cômodo e as dispus em cima da mesa. Segui para a bancada perto do fogão na cozinha e apanhei mais três copos, os organizando logo em seguida na mesa.
Meu pai se levantava apenas para pegar os talheres, ajeitando-o.
Em alguns minutos a minha mãe saía da cozinha, trazendo consigo alguns recipientes com comida. Assim que ela os dispunha na mesa, a mesma se sentava.
— Bom apetite. — Minha mãe dizia.
E assim começávamos a comer. Estava um silêncio prazeroso nos primeiros minutos, algo raro de acontecer. Meu pai sempre achava uma maneira de me colocar para baixo por conta de notas ou algo parecido, porém aparentemente ele não achou nada no qual me desmerecer hoje, ainda.
— Como foi o seu dia, Marie? — Meu pai perguntava, enquanto já lançava outra garfada na comida.
— Foi bom, querido. Fui no centro comprar algumas coisas para fazer cookies e os levar na igreja Domingo. — Ela parava por um momento para comer. — Conheci algumas de nossas vizinhas também, uma delas tem uma filha da idade do Daniel, a Aria, uma doçura de garota.
Já sabia onde aquela conversa iria acabar.
— Aria? Nome bonito. — Meu pai afirmava. — Não quer conhecê-la, Daniel?
Por mais que eu queira ser o mais grosso possível com ele, não iria conseguir desmerecer a minha mãe.
— Uhum. — Concordei, sem tirar os olhos do prato.
— Já está na hora de namorar, não acha, Daniel? — Meu pai provocava. — Nessa idade eu e a sua mãe já estávamos saindo.
Não sei a razão desse desejo do meu pai de me provocar, ele sempre achava um motivo. Sempre.
— Estou bem assim. — Respondi seco.
— Amor próprio é mais do que suficiente. O Dan não precisa de ninguém para estar feliz — Afirmou a minha mãe. — E eram outros tempos, Joseph.
— Se você diz. — A única maneira de fazer meu pai se silenciar era caso a minha mãe entrasse na conversa, sinto que só ela consegue obter respeito vindo dele.
A paz se compunha novamente, fazendo com que eu voltasse a comer em paz.
Pelo menos por alguns minutos.
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Do Outro Lado
Romance"Do Outro Lado" conta a história de um garoto irlandês chamado Daniel que acaba de se mudar para os Estados Unidos por conta de seus pais. Praticamente forçado a começar uma nova vida em um lugar desconhecido, Daniel se vê sem opções além a de segui...