Um paradoxo de papel

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- Um pedaço de papel?

- Sim, juiz. Um pedaço de papel.

- Por que essas pessoas se matariam por um pedaço de papel?

- Eu não sei, todas as vítimas sem exceções deixaram um adeus. E todas com a mesma frase "Não leiam o papel"

- Policial, onde está esse papel agora?

O Juiz fitou o oficial, esperava uma resposta positiva, que disse algo sobre o papel. Mas logo se decepcionaria com a resposta.

- Não sabemos! Esse é o problema. É como se o autor do papel soubesse que àquelas pessoas se matariam. Parece que ele conta com isso, então vai até o local e recolhe o papel. Bom, isso é a nossa teoria.

- Não é possível, mas que droga está escrito naquele papel?! – O juiz estava impaciente. – Me fale da primeira vítima.

- Camila Caramez, 20 anos. Universitária. Cursava Engenharia. Conversamos com alguns dos colegas dela e todos pareciam ter uma visão bem positiva dela. "linda" "carismática" "amiga" "otimista" "alegre". Sem nenhum inimigo aparente.

- Sempre há alguém!

- Bom, começaram a sentir falta dela na faculdade. Foram até seu apartamento, e quando chegaram lá viram aquela cena. Camila estava com uma corda no pescoço. Na parede as palavras, um aviso.

O Caso estava levando o policial a loucura, lutou pelo caso, queria o caso. E agora perdido no paradoxo do papel. Mortes causadas por um pedaço de papel que ninguém sabe onde está e nem quem escreveu. Lacunas que não podem ser preenchidas por meras teorias.

- E quanto a segunda vítima, Policial?

- Juliano Patrício, 36 anos. Professor de história. Foi encontrado numa cabana próxima à floresta. Lugar para onde ia para se "esquecer" dos problemas, isso segundo os familiares.

- Que tipos de problemas?

- Há dois anos, se envolveu com uma aluna. Teve problemas com os pais da jovem. E desde então ela o chantageia. Fora isso, não descobrimos mais nada. Sua carta de adeus, escrita em um marcador de livro e jogada ao chão do banheiro.

- Deixa eu adivinhar, não encontraram o papel. Como ele veio a óbito?

- Engasgado. Tomou alguns remédios, estava tão fraco que se engasgou no próprio vômito.

- Tem alguma teoria?

- Não, apenas que o escritor do papel sabia da cabana.

- Olha filho, você pediu o caso, implorou. E eu te dei isso!

- Eu sei pai...

- Então trate de resolvê-lo!

- Eu estou tentando.

- Não tente, Resolva!

Ambos levantaram e saíram do escritório. Seguiram caminhos distintos. O policial estava disposto a encontrar o papel, não acreditava que um pedaço de papel pudesse causar tantos problemas assim, talvez, fosse esse o problema A falta de fé, de que uma coisa tão pequena causara um reboliço tremendo. O que teria naquele papel que fariam essas pessoas se matar? Estava perdendo sua credibilidade no departamento, este seria seu segundo caso que não seria resolvido. Andando pela calçada, avistou no chão um pedaço de papel, não poderia ser aquele, pensou ele. Quais seriam as chances? A não ser que ele fosse a próxima vítima, mas como o autor saberia que ele encontraria? Não queria pega-lo, trepidou. Era preciso, tinha que pega-lo. Um suspiro, um conforto. Era apenas uma lista de compras, por outro lado ficou decepcionado, seu caso não seria resolvido.

Horas mais tarde, o juiz em casa degustava um vinho que comprara no caminho de volta. Sua mulher, Luciana, o acompanhara nessa viagem saborosa.

- Como vai o caso do André?

- Péssimo, conversamos hoje. Ele está perdido, sem saída.

- Que pena. Me diz uma coisa, em 2003 não surgiu na mídia um caso de homem que conversava com suas vítimas e os convencia a se matar? Será que tem alguma relação com esse?

- Eu não tinha pensado nisso! Você é um gênio, amor. Acho que devo ter alguma coisa sobre isso.

O homem se levantou, beijou a testa de sua amada e foi até a área de trabalho. Caminhou até sua escrivaninha. Seu coração acelerou, sua garganta estava seca.

- Amor! – as palavras quase que não saíram de sua boca – Recebemos visita hoje?

- Não nenhuma, o que houve?

- Não, nada.

Viu logo ali, um pedaço de papel. Não era seu, não tinha o costume de deixar as coisas assim. Sua mulher não estrava naquele local, mantinha sempre trancado. Tomou o papel em mãos e sentou em sua poltrona, curioso, ousou em ler. As palavras ali escritas trouxeram uma grande angústia, uma verdade ou uma mentira? Fitou a gaveta da escrivaninha, onde guardava seu revolver. Ali traçou seu destino e ali mesmo o idealizou.

Um paradoxo de papel.Onde histórias criam vida. Descubra agora