Prólogo

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Meus olhos abrem com dificuldade e logo os aperto quando sinto a rajada de claridade vinda das cortinas que balançam como que em câmera lenta. Levo as mãos ao rosto, me sento na cama e ainda não consigo entender porque parece que fui atropelada por um caminhão, sem ao menos conseguir anotar a placa... Flashes de memória vem e vão diante dos meus olhos que ainda insistem em permanecer fechados pois não conseguem vencer a claridade que entra pela janela do quarto... Quarto? Que quarto? Faço mais uma força e tento abrir cuidadosamente meus olhos. Reconheço o quarto onde estou... Pouquíssimo da minha memória sobre a noite de ontem, ainda em flashes, tentam me explicar o porque estou me sentindo dessa forma. Jogo de volta meu corpo contra a cama.

Bom, vamos aos fatos e ao que sei... Olho para as minhas mãos e não vejo minha aliança. Procuro em volta rapidamente e a encontro no aparador. Mas não me lembro de tê-la tirado do dedo. Apesar de aceitar que talvez já seja a hora.

Os fatos... Sim Lizzie, os fatos... Você não está mais casada a pelo menos uma semana... Sinto um aperto no peito... Roger me vem a lembrança.

_ Porque eu não consegui Roger? Porque? Eu sinto tanto... Sinto não ter sido suficiente. Sinto que seu amor não tenha sido o bastante para nós dois... Eu tentei. Juro por minha vida que tentei, e talvez eu nunca fosse conseguir mesmo. E acho que você finalmente percebeu que não bastava só esperar.... Meus pensamentos me trazem uma tristeza que reflete as lágrimas que finalmente escorrem pelos meus olhos.

Lembro-me de ir para o bar do hotel, pedi algumas tequilas, fiquei por um bom tempo observando a aliança em meus dedos, segurando-a sem conseguir tirá-las. Mesmo depois da conversa que Roger e eu tivemos semana passada, quando decidimos que não continuaríamos juntos. Mais tequilas... Nenhuma lágrima rolando pelo meu rosto, mas meu peito me fazendo sentir a dor de perceber do que eu não sou capaz. O bar man tenta me dizer que já é o suficiente, e eu mando ele me servir mais umas doses e brinco de empilhar os copos dos shots  que eu já tomei.  Sinto-me tonta e não quero dar o braço a torcer para o garçom. Ele até poderia estar certo, mas apostei com ele que poderia empilhar mais alguns copos. Uma voz,  ao fundo... Me parece familiar, mas quando tento me levantar, sinto que meu corpo não vai me obedecer, percebo alguém me impedir de colidir com o chão. Meus olhos se fecham, e quando abrem estou no quarto. Meus olhos continuam pesados, e quando abrem, vejo ele se aproximar... Meus olhos embaçados se fecham... Vejo flashes somente, nada é nítido, mas não parecia que estava sendo forçada a nada... Puxo seu braço que tenta me deixar na cama... A voz longe dizendo que estou segura, para eu me deitar que ele precisava ir. Mas eu o seguro... Olhos fechados novamente. Sinto-me viva como a muito não me sentia. Uma sensação, ao menos... Como se um aquecer do coração, uma chama ardente me consumisse nesses flashes de lembrança... Meus olhos intercalam entre abertos e fechados e não consigo mensurar o tempo entre um e outro, nem o que aconteceu nesses intervalos.

_Droga, que noite! Repreendo-me.  Nunca mais bebo na vida. Não sei distinguir bem o que foi sonho ou o que foi realidade. O que eu fiz? Fui para cama com um estranho? Definitivamente Lizzie, é o fundo do poço para você.  Levo as duas mãos ao rosto.

Por alguma razão, o passado me encontrou em meus sonhos agitados dessa noite, e hoje está tão presente em minhas lembranças. Pode ser pela grande ressaca, pelos acontecimentos recentes, pela separação, pelo motivo que tenha culminado nessa separação... pela minha incapacidade de me abrir, de sentir...

Levanto com dificuldade e vou até o aparador e , ao lado da aliança, um bilhete:

" Se não tivesse que usá-la, eu ficaria para o café..."

Definitivamente, a prova que estive com um estranho noite passada. E como não sou de ficar me abrindo por ai,  pela mensagem, não usei esse estranho como psicólogo para despejar todos os acontecimentos da minha vida. E ele provavelmente acha que foi para cama com uma mulher casada. Acharia até engraçado se não tivesse me sentindo tão miserável. Roger é um ser humano tão bom, tão diferenciado que, se eu pudesse,  daria minha vida para não fazê-lo sofrer. Para amá-lo como ele merece. Mas eu simplesmente não consigo. Não consigo abrir meu coração de verdade.  Não mais desde o... Quando eu tentei... quando eu abaixei a guarda um pouquinho... quase perdi o controle dos meus sentimentos. O meu grande paradoxo  é me orgulhar de estar sempre no controle de mim mesma e esse seja o mesmo motivo o qual me impede de sentir.

É tão mais fácil viver na superfície... Tomar decisões racionais e manter o controle sempre. Nada te faz perder a razão, você não tem que se submeter a nada nem à ninguém. Você estabelece seu parâmetro e cria o mundo em que quer viver. As vezes é frio, é raso e é seguro, mas também é cinza... O que demoramos tanto a perceber, é que todo controle que presumimos ter, pode ser uma ilusão. Algo que acreditamos pertencer, mas não é e nunca foi nosso. O destino pode ser tão sarcástico quanto a minha vontade de ter o controle nas minhas mãos. Eu perderia feio nessa grande aposta que é a vida.

Poucas vezes, nesses últimos anos,  eu me deixei levar pelo momento, como aconteceu essa noite. Não posso negar que chega a ser libertador, talvez a bebida tenha feito a sua parte, mas a sensação é boa... Completamente insegura, mas é libertadora.

Adoraria que meu irmão estivesse aqui agora, e pudéssemos viajar nas nossas conversas, como a muito tempo não faço mais, e imaginar toda a minha vida Se...

Dou um pulo na cama porque acabei de ter um insight. Talvez nada disso tenha acontecido ao acaso.  Encontro meu celular e envio uma mensagem para Emmy, e digo a ela que já temos um novo autor a quem vamos publicar um  livro em breve.

Apoio o celular na cabeceira e vejo uma resposta de Emily.

_"Quanto mistério Lizz, fale logo, quem é o escritor?"

Leio sua resposta com o canto dos olhos e dou um leve sorriso de canto. Pego meu computador e começo a escrever.

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