Capítulo único - A proposta

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- Vamos criar uma sociedade.

Mariana olhou para a irmã com uma expressão de descrença. Sua proposta era no mínimo curiosa demais. Entretanto, Carolina parecia muito segura de sua ideia, as mãos na cintura, o olhar determinado e o ar de expectativa pairando sobre si.

- Como exatamente isso funcionaria? – Anna quis saber. Achava graça do ar infantil da prima mais nova e não podia deixar de admitir que a ideia lhe despertara um sentimento interessante.

- Bom, em primeiro lugar, nossa Sociedade trataria de coisas que gostamos. Mas sairíamos do nível... amador da coisa e criaríamos um compromisso sério. – Carolina continuou, gesticulando enquanto falava. Aproveitara a disposição em círculo das poltronas na cafeteria para aumentar o drama da cena, caminhando vagarosamente entre as cadeiras. – O que proponho é nos comprometermos a algo mais.

- E o que seria esse algo mais?

- Ai depende do que a Sociedade decidir. É como uma empresa: você decide que vai cria-la e ai começa a planejar tudo.

- É, mas para decidir que vai cria-la, você tem que ter coisas antes, como dinheiro, terras, mão de obra... – Mariana pontuou, acompanhando a irmã com o olhar.

- Já temos isso! Nós somos as mão de obra. Nossas terras são tudo aquilo que decidirmos alcançar. E nosso capital... bem, a princípio seria o capital tempo, porque precisamos separar uma parte de nossos dias para nos dedicar a Sociedade.

- E trataríamos de que exatamente? – Anna perguntou, inclinando o corpo para frente em um sinal involuntário de interesse. Carolina percebeu isso, e se animou ainda mais.

- Tinha pensado de trabalharmos com Artes variadas.

- Porque Artes?

- Porque é algo que gostamos e que somos boas lidando com elas, no geral. A primeira e que acho que é meio óbvia por vocês duas estudarem isso e você já ter publicações seria Literatura.

- Quer publicar livros? – Mariana voltou a falar.

- Não exatamente. Eu e Anna já cumpríamos desafios de escrita semanalmente, e ela já tinha proposto... complicarmos ainda mais a coisa escrevendo contos mensais, não é mesmo?

- Correto. – Anna disse, depois de bebericar seu suco.

- Poderíamos adotar essa ideia: escrever um conto por mês baseado em...

- Música, talvez? – Mariana disse, tomando a atenção das outras. Carolina sentiu o entusiasmo inflando dentro de si ainda mais, e explodiu em sorrisos.

- Isso! É uma ótima ideia! E podíamos fazer mais: um livro por mês!

- Você vai ler um livro em um mês?

- Ora, tenha um pouco de fé em mim! Se eu estou incrivelmente cumprindo os desafios de escrita, talvez consiga cumprir desafios de leitura também.

Mariana deu de ombros, enquanto Carolina voltava a andar e falar. Quem via aquelas três reunidas, num canto da cafeteria, poderia achar que elas estavam planejando algo perigoso ou revolucionário. E, de fato, não era?

- Além de Literatura, poderíamos partir para desenhos e pintura também. Todas nos arriscamos nisso, e poderíamos pensar em algo para estruturar melhor essa parte. E também poderíamos trabalhar com Música!

- Isso está se complicando demais... – Anna disse, temendo a proporção que a coisa estava tomando. Uma coisa era escrever contos curtos mensalmente, outra coisa completamente diferente era criar compromissos tão complexos quanto os que a prima estava propondo.

- Eu sei, eu sei, mas... Por Deus, nós temos talentos para algumas coisas, e simplesmente estamos deixando-as passar. Somos uma vergonha para qualquer artista!

- Anna já publicou livros. – Mariana ponderou.

- E nós? O que diabos fizemos com tais talentos?

- Tecnicamente... nada.

- Tire o tecnicamente. Foi um belo de um nada. – ela fez uma pausa, recuperando o fôlego. – Tenho certeza que nossos talentos nos foram dados para que possamos fazer algo grandioso, permito-me dizer. Como vi em um filme, "mudaremos o mundo pelo poder da arte".

Anna mordiscou o lábio inferior, pensativa. Mariana também tirou um tempo para pensar, acomodando-se melhor na poltrona. A terceira, por sua vez, voltou a se sentar, satisfeita com a apresentação de sua proposta. Ela plantara a ideia, e agora esperava que ela desse frutos.

- E qual seria nosso nome?

Carolina voltou-se para a irmã, que lançara a pergunta.

- Não tinha chegado tão longe. Não sabia nem se vocês aceitariam a proposta inicial.

- Bom, é uma ideia tentadora. Seria bom para estudarmos arte e, ainda assim, fazer coisas divertidas.

- Isso e, tecnicamente, nossa Sociedade já existe. Já debatemos sobre livros, filmes e afins. A diferença é que agora daríamos um nome a coisa, firmaríamos um compromisso e cumpriríamos atividades pré-programadas.

- Poderíamos recrutar mais pessoas também. – Anna propôs.

- Exato! Todos juntos transformando um simples hobby em algo a mais, algo que... tenha algum significado ou sentido a mais. Não seria maravilhoso?

- Soa como algo complicado para mim. – Mariana disse, passando a mão na testa. – Mas ainda é uma proposta cheia de atrativos.

- Não precisamos complicar tanto as coisas porque, tecnicamente, estaremos fazendo o que gostamos. Você só terá que cumprir prazos e exercícios mas, sendo de algo que te agrada, acho que o retorno será sempre positivo.

Um silêncio breve se instaurou ali novamente. O coração de Carolina tamborilava em seus ouvidos, diante da expectativa. Foi sua vez de inclinar o corpo para frente, pender a cabeça para o lado e olhar as duas jovens a sua frente cheia de esperanças.

- E então? Estão dentro?

A propostaWhere stories live. Discover now