Capítulo Único

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Flying with whales

Annabeth Chase tinha mil e uma tarefas para fazer todos os dias desde a guerra contra Cronos, na Batalha de Manhattan. As mudanças que seu namorado, Percy, tinha demandado aos deuses fizeram o Acampamento Meio-Sangue entrar em ebulição: novos chalés estavam sendo construídos, novos semideuses chegavam todos os dias pedindo abrigo e até alguns deuses, como Apolo, tinham passado a visitar com mais frequência.

Depois de uma guerra tão sangrenta, era bom ver que as coisas retornavam aos poucos ao normal. Monstros ainda atacavam semideuses, semideuses ainda treinavam para matar monstros e Sra. O’Leary, bem, ela continuava docemente enorme como um tanque e causando confusão entre os chalés – ela adorava passar o dia brincando com os materiais que serviam para construir os novos chalés. O maior dos problemas tinha sido com o chalé de Morfeu: Sra. O’Leary, com suas gigantescas patas de cão infernal, tinha destruído por completo as bases da construção e os semideuses filhos de Morfeu a colocaram para dormir por vários dias.

A vida voltava à normalidade aos poucos. Annabeth passava horas com a cabeça enfiada em livros, planejando e ajudando a reconstruir o Olimpo. Tinha sido uma grande honra ser escolhida pelos deuses para redefinir a aparência do Olimpo depois da guerra contra Cronos quase o destruir completamente, então ela se dedicava ao máximo possível para que tudo saísse perfeito e para que Atena se sentisse orgulhosa da filha.

Tudo isso deixava pouco tempo para namorar, no entanto, ela e Percy estavam sempre juntos naquelas semanas que se passaram. Ele a seguia quando ela visitava o Olimpo e acompanhava de perto enquanto ela trabalhava por horas em cada pequeno espaço. Lutavam juntos – Percy ainda não tinha desistido de vencê-la – e algumas vezes ele a levava para o Estreito de Long Island, onde mergulhavam e ela podia ter alguns minutos de paz e tranquilidade, rodeada por uma bolha de ar e abraçada a Percy.

Aquele tempo de paz, porém, não era suficiente. A dor da perda ainda estava presente ali e Annabeth a sentiu duramente quando ajudou os filhos e filhas de Afrodite a arrumarem todas as coisas que um dia pertenceram a Silena Beauregard. Foi nesse dia que Annabeth encontrou um encarte de propaganda no meio das maquiagem de Silena: aulas de ballet para semideusas.

Era por isso que Annabeth estava ali naquele dia. Por apenas um dracma de ouro, ela tinha alugado apenas para si uma sala no prédio nos arredores do Empire State Building e, escondida de todos, ela ia até lá para dançar ballet. Tinha dispensado ajuda e, sozinha, relembrava os passos que aprenderam quando era mais nova, antes de fugir para o Acampamento Meio-Sangue, e estudava novos passos.

Entrou na sala espaçosa e suspirou feliz. Tirou a calça, ficando apenas com as meias finas de ballet, e depois a camisa laranja do Acampamento, que deixou o espaço para o collant. Prendeu os cachos loiros em um coque apertado e gastou longos minutos para amarrar cuidadosamente as sapatilhas antes de finalmente começar a se alongar.

- Vamos lá, você consegue. – Falou para si mesma quando se sentiu pronta.

Andou até o pequeno aparelho de som que ficava na sala e ligou-o, selecionando Flying with whales para começar. Fechou os olhos e aguardou a música instrumental começar.

Balançou-se com o começo, erguendo en pointe e dando passos ao redor da sala. Seus braços seguiam as sequências que havia aprendido, mas logo não foi mais suficiente manter apenas a técnica: a música era animada, elétrica, fazia o corpo de Annabeth querer acompanhar o ritmo, por isso, logo seus braços ganharam vida própria, rápidos, porém delicados como asas de um cisne.

Sentiu-se mais forte, mais intensa. Seus pés seguiam a melodia, como se cada nota tivesse vida própria e a fizesse se movimentar. Parou de prestar atenção em seu reflexo no espelho e sorriu, seus braços voando como asas de pássaros, seus pés en pointe continuavam mantendo-a erguida, graciosa. Suas pernas doíam e ela não sabia mais se estava fazendo o movimento correto, mas sentia, vivia, respirava a música.
Esticou-se, rodopiando sobre si mesma, as pontas duras da sapatilha batendo no chão em um barulho de tec, tec, tec, tec. Lançou-se para frente, os braços esticados, a cabeça seguindo os movimentos e logo ela dançava por toda a extensão da sala, livre, leve.
A música reduziu a velocidade e ela fez o mesmo, fazendo delicados pliés, as mãos subindo e descendo diante do corpo – vezes no alto, agarrando nuvens, vezes no baixo, tentando chegar ao chão. A intensidade da música voltou e ela se sentiu libertada, longe de tudo e de todos. Tentou o frappé, e, em um momento de pura devoção, gargalhou ao conseguir executar perfeitamente o passo, batendo o pé direito na frente do esquerdo, depois do lado de seu corpo e, por fim, atrás de seu pé esquerdo.

Embalada por seu próprio riso, colocou-se en pointe mais uma vez e flutuou. Fechou os olhos: ela e a melodia eram uma só. O mar estava sob seus pés, as gigantescas baleias erguendo-se metros sobre a água e recaindo nela com uma graça única. Seguiu as baleias, imitando a delicadeza de um animal tão enorme e então tentou a primeira pirueta conforme a intensidade da música chegava próximo ao crescendo: rodopiou, suas pernas esticadas, seu peso equilibrado, e então rodopiou de novo e de novo.

Abria os braços, sentia o ar correr por seus dedos, erguia a perna, majestosa como uma baleia. Ainda com seus olhos fechados, Annabeth correu pela sala, o crescendo cada vez mais próximo, seu coração disparado, a emoção fazendo com que lágrimas se formassem sob suas pálpebras cerradas. Pequenos saltos a elevavam ao ar.

A energia fluía, e então, fez se preparou: abriu os olhos, fez o plié e, quando o crescendo chegou, lançou-se no ar em um lindo jeté. O tempo pareceu parar enquanto abria as pernas e usava os braços para se equilibrar, voando no ar como as baleias que Abel Korzeniowski usara para se inspirar e compor uma melodia tão bela quanto Flying with whales.

Seus pés se chocaram com o chão e, mais pela emoção do que pelo movimento, Annabeth se deixou cair ao chão, sentada. Tinha o corpo coberto de suor, a respiração descompensava, porém, enquanto os últimos segundos da música passavam, riu sozinha.

Deixou seu corpo escorregar até estar deitada no chão frio. Tinha conseguido, depois de tantas semanas de duro treinamento, fizera um jeté perfeito. O teto branco parecia mais bonito, o mundo mais florido: talvez finalmente tivesse coragem para levar Percy ao esconderijo e mostrar alguns passos de ballet para seu Cabeça de Alga.

Se permitiu ficar ali, feliz e respirando pesadamente, por mais alguns minutos antes de se levantar. Estava relaxada para retornar ao Olimpo: trabalho a esperava.

[1141 palavras]
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