Prólogo

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Aquele quarto sempre beirou o monótono. A apatia só não se dava por completo por causa de uma das paredes que vivia abarrotada de fotos da época em que eu acreditava que era feliz só porque alguém me deixava ficar por perto. Ainda existiam alguns poemas espalhados pelo quarto, aqueles que eu gostava de ler e reler, relembrando do medo que sentia de barulhos suspeitos enquanto os escrevia no meio da noite; a adrenalina quase sem razão fazia com que esses fossem os melhores.

Há algumas semanas, depois de me levantar do colchão e sair de meu palácio mental, o qual já estava completamente destruído e quase inabitável, fui até o mural e percebi que nada daquilo fazia o menor sentido, então arranquei e vi voar e pousar no chão, uma a uma, todas aqueles folhas recém rasgadas. Alguns olhos curiosos chamaram aquilo de acesso de raiva, mas, apesar dos movimentos bruscos, punhos cerrados e lágrimas quentes, só o que havia dentro de mim era confusão, desordem, pétalas, botões fechados e, por mais que fosse contraditório, amor.

Nesse mesmo dia, depois de jogar fora todos os restos de lembranças que já não faziam mais parte da minha vida há muito tempo, decidi-me por deixar o produto do meu amor se espalhar pelo cômodo, transformando todo o ambiente e ares, como eu mesmo já me encontrava tomado.

Naquele momento, depois de dias de acúmulo irregrado, uma cama branca era envolta por índigo e contáveis manchas escarlate; flores azuis e sangue. O lugar todo cheirava a natureza, cheirava tão forte que sequer se assemelhava a algo natural.

Sobre a cama jazia um corpo, meu corpo. Estava pálido, tremelicando, incapaz de expressar a dor por gestos ou sons. Por dentro reinava o caos, nos pulmões, eu digo, porque emocionalmente falando era calmo; tive muito tempo para aceitar minha situação. A boca entreaberta procurava afoita por ar, enquanto aquilo crescia, fechando todos os espaços pelos quais ele podia passar. E os cabelos azuis, como o motivo da minha dor dizia gostar desde que tudo começou.

Se desde o princípio eu não fosse tão leigo nessa história de amor, se eu entendesse por completo que, mesmo que você pense que é só uma fase, mesmo que você queira que seja só uma fase, ele simplesmente cresce e se firma mais a cada dia, eu até diria que o deixei assim pra harmonizar com todos esses tons ciânicos a minha volta, pra poetizar até no meu leito de morte.

Porque, passado o tempo de negação e descrença, eu sempre soube o que tinha. Era irônico, sarcástico, terrível. Min Yoongi estava literalmente morrendo por amar e não ser correspondido.

Ouvi falar pela primeira vez sobre quando ainda era pequeno. Essa é uma daquelas lembranças da infância que vêm de tempos em tempos para nos fazer pensar sobre os pilares que nos fizeram sermos quem somos.

Era um fim de tarde decorado com um tom róseo por todo o céu. Lembro-me de ir e vir entre a cozinha e a sala, ansioso, sempre fitando o portão pela enorme janela do corredor, acabando por observar o horizonte além e me render à beleza do pôr do sol.

O motivo da minha impaciência era a espera de minha mãe. Não que eu fosse o tipo de pessoa, mesmo criança, muito apegada à família, pelo menos não a ninguém que não fosse tão apaixonante como minha mãe. Ela era formada em arqueologia e trabalhava em um museu oriental, analisando todos os artefatos antes que entrassem em exposição. Era especialmente obcecada por livros, e tratava de, sempre que possível, trazer alguns exemplares para me fazer igualmente interessado.

No entardecer em questão, eu estava em demasia entediado, e desejava, com pensamentos gritantes, que ela chegasse logo e trouxesse alívio a meu sofrimento.

Quando finalmente sua figura apareceu, como era seu costume engraçado, lutando para abrir o cadeado que ligava as correntes do portão, não tardei em correr porta afora e me pegar encarando, com olhos arregalados, mas eufóricos, a caixa que ela trazia em mãos.

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⏰ Last updated: Jul 29, 2019 ⏰

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Hanahaki CiânicoWhere stories live. Discover now