Eclipse

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A palavra eclipse tem origem no grego ékleipsis, que indicava o ato de sair ou não aparecer em algum lugar. Em sentido figurado, a palavra eclipse pode indicar o desaparecimento temporário, ausência ou obscurecimento de alguma coisa❞.

[♡]

Era aniversário dele.

A chuva havia dado uma trégua ao mesmo tempo que Felix esticou a mão para fora do guarda-chuva a fim de sentir algo que não fosse a tristeza crescente em seu peito.

Riu pelo nariz. Aquele tipo de riso conformado, que vem em forma de sopro, as vezes até nos faz perder o ar por um segundo.

Era quase engraçado aquele sarcasmo do Destino. Se reparasse bem, conseguia ouvi-lo rir e depois bebericar uma xícara de chá, pleno.

Fechou o objeto que usava para se proteger das grossas gotas que caíam do céu vendo, pela luz de um poste, que ainda chuviscava mesmo que pouco.

Não precisava daquilo de qualquer forma.

Andou pisando em poças, uma das mãos no bolso do moletom escuro, e agachou-se sobre as pernas quando chegou a seu destino.

Afinal, era aniversário dele.

Observou o terceiro apartamento do prédio. A janela aberta permitia que o australiano soubesse que ele estava ali, provavelmente jogando ou comendo sopa de algas com sua mãe porque ela sempre aparecia, mesmo que o filho dissesse insistentemente que ela não precisava se preocupar.

Na faculdade, ele com certeza teria um bolo no outro dia - porque hoje fora feriado, olhara no calendário pendurado na porta de um estabelecimento durante o trajeto -, sempre querido por todos. Cantariam parabéns e ele sorriria aquele sorriso bonito e meio acanhado, aquele que ele costumava dirigir a Felix quando este dizia que o amava.

E ele respondia amar mais...

Isso quando seu nome não havia virado uma espécie de tabu ou algo como sagrado, já que ninguém mais o pronunciava. Pelo menos não em voz alta, ele sentia na pele.

Apoiou o cotovelo no joelho e o queixo na mão, ainda sem tirar os olhos da janela, mas um burburinho atraiu sua atenção.

Viu um grupo conhecido ao longe, claramente tentando fazer o menor barulho possível enquanto se aproximava do edifício.

Os sete garotos carregavam várias sacolas em mãos e colocavam enfeites típicos de festas de aniversários em si próprios enquanto andavam, rindo um da cara de bobo do outro.

Felix se lembrava deles, eram seus amigos também.

Um deles inflou as bochechas cheinhas fazendo um outro gargalhar e depois tapar a boca com uma expressão desesperada, soltando algo como "oh shi-" ao perceber que a surpresa iria por água abaixo se continuassem daquele jeito.

Ah, aquilo fazia sentido, era aniversário dele.

À sombra da árvore em frente ao prédio, o Lee não poderia ser visto mesmo que quisesse e ele realmente não fazia questão.

Felix se sentia como em um eclipse, porém a condição não era temporária.

Quem dera fosse...

Só queria poder vê-lo. Mesmo que um vulto pela janela, a sombra projetada na parede, ou, quem sabe, poder ouvir sua voz agradecendo a visita dos amigos.

Era seu último desejo antes de sumir para sempre. Não sabia bem para onde iria, mas teria que ir.

Depois que haviam terminado, Felix não conseguiu seguir e fingir que tudo estava bem. As coisas eram diferentes daquele lado, não podia se enganar. Por isso, ele não se orgulharia se descobrissem que ele ia ali e ficava como um perseguidor observando a janela de seu amado.

Imaginava se alguém já não o teria denunciado por aquele comportamento estranho, mas não deixava de agradecer mentalmente aos moradores do prédio toda vez que estes passavam por ele, mesmo que estes não dessem a mínima.

Suspirou.

Não havia motivos para o término, mas também não havia condições de continuarem. Não podiam estar quando eram literalmente inalcançáveis um para o outro.

Sabia que não fora falta de amor por ambos os lados, mas também sabia que não era só de amor que uma relação sobreviveria, de qualquer forma.

Era complicado, mas não queria pensar naquilo, mesmo que seus pensamentos sempre voltassem a isso toda vez que ele parava na frente do conhecido local.

O pensamento era como um alerta de que não deveria, por impulso, tentar bater na porta do garoto e se frustrar quando este não atendesse, como fizera das primeiras vezes.

Aquilo o fez tomar coragem para aparecer menos por ali, mesmo que sempre estivesse rondando. Era como se ele fosse a lua em torno da terra.

Pensava naquilo como o desmame de uma criança. Uma hora passaria. Uma hora curaria, pararia de doer e assim ele encontraria paz.

Ou ele assim esperava.

Até lá, era como um analgésico. E era aniversário dele.

— Feliz aniversário, Binie. — ele murmurou ao levantar e jogar o tronco para trás, a voz saindo cortada devido o espreguiçar de seu corpo.

Seguiu sem rumo específico, novamente, já que sua casa já passara para outro proprietário.

Sabia que passaria o resto da noite pensando no quanto poderia ter tido e, quem sabe, encontraria alguém que cruzaria o olhar com o seu e o notaria para que pudesse desabafar a solidão que sentia.

Era aniversário dele e Felix sabia que uma pessoa real e somente morria quando seu nome era pronunciado pela última vez.

E o seu já tinha sido, bastava esperar.

Birthday [changlix]Onde histórias criam vida. Descubra agora