Era uma tarde de sábado, se bem me lembro. Estava um pouco frio, o azul do céu não havia nos recepcionado, tampouco aparecera durante o dia. O vento estava quase gélido, o que provocara muito Lucy. Sempre tivera um péssimo relacionamento com o frio. Era instantâneo, ele chegava e seu mau humor vinha junto. Abominava casacos grossos, cobertas de pelo, pantufas felpudas. Dizia que a sufocavam, porém seus pés e mãos apenas esquentavam se os cobrisse com algo muito quente. Senão, ficavam roxos.
Eu sempre abominei o calor. O suor e o cheiro das pessoas me incomoda profundamente. A escassez de roupas também é detestável. Oras, que pouca vergonha sair de casa com roupas que cobrem apenas o necessário e nada mais (a não ser que seja uma roupa de banho)? Um passatempo de verão de que jamais gostei é ir à piscina. Que cheiro horrível de cloro elas têm! Sem contar a grande quantidade de pessoas acumuladas em um cubículo cheio d'água.
Lucy é mais social. Tem muitos amigos, é conhecida por todos pelo carisma, pela simpatia e pela doçura. Já eu? Aquele anti-social nerd que tem cara de mal educado. Ela sempre estava bem arrumada, e se permitissem eu sairia de casa usando meus pijamas velhos. Graças à minha reclusão, fui àquela belíssima casa de campo de tia Georgine em companhia de Lucy Karlson.
- Wembley, por que o frio existe? Sejamos sinceros, não podemos ficar do lado de fora de nossas casas pois pegaremos uma gripe forte se formos contra a circunstância. - ela perguntara em tom questionador e sonhador, usando meu sobrenome como de costume.
- Pois tenho uma pergunta semelhante: por que o calor existe? Sejamos sinceros, não podemos ficar do lado de dentro de nossas casas pois ficaremos com mais calor, se é que é possível, se formos contra a circunstância. - retruquei. Eu queria provocá-la e, ao mesmo tempo, buscava por uma resposta concreta e absoluta sobre o assunto.
- É tão difícil se esquentar no frio... - ela dissera suspirando.
- E é tão difícil se refrescar no calor... - contrariei-a, recebendo uma careta de completa irritação.
- Veja só agora! Poderíamos estar correndo na grama, deitando nela e relaxando enquanto a brisa passa por nós. Mas não, estamos sentados no sofá, nos encolhendo de frio. - dissera, proferindo a última palavra em um tom... Frio.
- Ou poderíamos estar juntos sentados ou deitados na cama embolados em cobertas e com um aquecedor ligado e colocado perto da cômoda, mas não. Estamos aqui, discutindo sobre o que é melhor, frio ou calor. - eu disse em um tom desafiador.
- Nunca se perguntou sobre qual oposto é melhor? Noite e dia? Cores frias e cores quentes? Pessoas altas ou pessoas baixas? Frio ou calor? Português ou Matemática? 0 ou 100? - ela perguntou.
- Acho que prefiro pensar em o que irá me fazer feliz ou satisfeito. Não é o fato de ser melhor ou pior que deveria ser levado em conta aqui. Eu prefiro a noite, as cores quentes, pessoas baixas, o frio, a Matemática e... Eu prefiro o 1. - respondi, e Lucy me olhava intrigada.
- Por que o número 1?
- Porque unindo alguns opostos ambos estornam um só. - eu disse me aproximando dela e a abraçando. - Como um casal.
- Scott... - balbuciou, enquanto suspirava ao sentir o toque de minhas mãos em sua cintura.
- O seu corpo está frio. - sussurrei em seu ouvido, causando-lhe arrepios.
- O seu está quentinho. - ela disse, e pude ver um sorriso aparecer em seus lábios rosados. Apenas dei um beijo no topo de sua cabeça e me aconcheguei com ela em meus braços, vendo as chamas da lareira à nossa frente crepitarem.
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Coffee Break & outros contos
Lãng mạnQuem disse que contos são histórias apenas encontradas em livros velhos? Existem contos contemporâneos. Todo conto tem aquela linguagem que ninguém entende de tão formal? Não, existem contos com uma linguagem mais simples. Histórias atuais não tem c...