2 / O FILHO MAIS MOÇO DE JORGE

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Naquele dia, estava para chegar o filho mais moço dos Laerte.

— Deixa tudo impecável, Joana — a patroa ficava repetindo toda hora —, que logo mais o meu mocinho tá por aqui!

O dito mocinho era, na verdade, um marmanjo de dezoito anos nas costas. Joaquim d'Alcântara Laerte. Estudava medicina na capital fluminense. Pele pálida e olhos claros, corpo magricela de acadêmico, cabelos de um dourado metálico, mas mais puxado para o castanho, e uma nota de sangue nos lábios carnudos. Gentil também, só que mimado em excesso, logo se via. De aparência, era o comum pimpolho de cidade grande. De caráter, não se sabia bem o que era desde que tinha saído da estância, há uns três anos.

Assim que pisou na fazenda, correu logo para dentro do abraço da mãe. Depois, foi abraçar também o pai, responder com toda a paciência do mundo a sua saraivada de perguntas sobre a vida no Rio, a faculdade, as boas notas, as namoradas... Abraçou também a querida Nina que, apesar de não ser sua irmã de sangue, era como se fosse, e falou com a velha Joana, de quem sempre teve boas lembranças. Só então é que foi cumprimentar o capataz e os peões.

Aproximou-se pouco à vontade, intimidado mesmo, com os rapazes. Mas não tinha porque demonstrar desconforto. O garoto educado da cidade grande era ele, afinal. Então sorriu e estendeu a mão, assumindo uma outra postura. Não ia deixar o seu nervosismo traí-lo, não na frente do seu pai. Jean, condescendente, retribuiu o aperto com amizade e sutileza. Joabe também seguiu o gesto e um aceno de cabeça e uma piscada. Já André, sem nenhuma cerimônia, lhe apertou os ossos com firmeza, arrancando um gemido agudo do rapazinho.

Bem mais tarde, nesse mesmo dia, depois de ter passado algum tempo com os pais, o nosso tímido e entediado protagonista resolveu dar um passeio. Sair, encher o peito de ar puro, explorar os arredores. Parecia fazer tanto tempo que estivera ali que quis saber se as coisas tinham mesmo mudado ou ficado na mesma.

Para Joaquim, bastava sair, rever os lugares da sua infância sem nenhum roteiro certo na mente.. Foi dando uma olhada por ali em volta, caçando alguma aventura, o vento mexendo com as copas das árvores, fazendo as folhas farfalharem numa melodia que era tão boa quanto um carinho.

Pegou descendo pelo rumo do ribeirão. Chegando perto, foi também o vento que lhe trouxe cá no pé do ouvido uns sons de conversa. Com certeza eram vozes. E vozes de homem. Vinham justamente do ribeirão. Então Joaquim foi chegando devagar, espreitando com cautela, abaixado no capinzal da margem. Para a sua surpresa, eram aqueles peões, o Joabe e o André. Despreocupados lá na água, entretidos conversando um com o outro enquanto se banhavam.

Joaquim agachou no matagal palpitando de susto. Santo Deus! E se o tivessem visto ou ouvido? Que embaraçoso seria ser pego espiando homem pelado no banho! Mas logo que percebeu a continuidade da conversa entre os dois lá na água, Joaquim suspirou aliviado.

Abriu a moita de capim com as mãos muito devagar, já sem tanto medo, e ficou ali a espiar aquela dupla. Claro, ignorava o que conversavam, dada a distância em que estava deles. Mas não precisava ouvi-los. Vê-los bastava. Admirar em silêncio a sua anatomia masculina. Seus músculos. Bumbuns. Braços, pernas. Seus cacetes pendurados.

Lá na universidade, no Rio, também via tudo isso. Tinha o costume de espiar os colegas no banho — o Marcondes, o Elísio, o Gustavo. Mas nenhum era comparável. Lá, o que via era corpo de moleque. Uns pelinhos ralinhos, umas costelas aparentes, umas espinhas oleosas. Ali, no ribeirão, via corpo de homem. Homem já formado, com barbas e pentelhos e músculos e qualquer coisa de mais que a ele parecia muito melhor do que o que via na universidade.

Depois, quando voltou desse curioso passeio, Joaquim foi contar à moça Nina tudo o que tinha visto. Contou o quão lindos e perfeitos eram aqueles dois, o quão era solitário na universidade e deixou transparecer ainda um súbito interesse por um da dupla do ribeirão. Nina, cheia de fogo no rabo, quis logo foi saber quem era, mas um desconfortável Joaquim cercou o nome do seu predileto de mistérios. A única coisa que ele deixou escapar é que ele era bonito e tinha um pintão.

No Colo dos CaubóisOnde histórias criam vida. Descubra agora